Выбрать главу

Eu não tinha noção do que se passava em sua mente nem ele me esclareceu, mas ficou sentado, perdido em pensamentos, até que paramos na pequena estação de Hampshire. Nós nos apossamos de uma carroça desmantelada, e em 15 minutos estávamos na casa do nosso amigo de confiança, o sargento.

– Uma pista, sr. Holmes? Qual é a pista?

– Tudo depende do comportamento do revólver do dr. Watson – disse meu amigo. – Aqui está. Agora, senhor oficial, pode me dar 10 metros de barbante?

A loja da aldeia forneceu-nos um rolo de barbante resistente.

– Acho que é disto que precisamos – disse Holmes. – Agora, vamos partir, como espero, para a última etapa da nossa jornada.

O sol se punha e ia transformando o brejo ondulado de Hampshire num maravilhoso panorama outonal. O sargento, com olhares críticos e incrédulos, que demonstravam suas dúvidas quanto à sanidade mental do meu amigo, arrastava-se ao nosso lado. À medida que nos aproximávamos do cenário do crime, pude observar que meu amigo, debaixo de sua frieza habitual, estava profundamente agitado.

– Sim – ele disse, respondendo a uma observação minha –, você já me viu errar o alvo antes, Watson. Tenho instinto para coisas assim, mas algumas vezes não dá certo. Esta idéia parecia-me uma certeza, quando, na cela em Winchester, passou pela minha mente, mas a desvantagem de uma mente ágil é que sempre se podem conceber explicações alternativas que tornariam falsa a nossa pista. Bem, Watson, nossa única chance é experimentar.

Enquanto caminhávamos, ele havia amarrado firmemente uma ponta do barbante no cabo do revólver. Tínhamos chegado ao local da tragédia. Com muita atenção ele marcou, sob a orientação do policial, o lugar exato em que o corpo havia ficado estendido. Em seguida procurou no meio do pântano e das samambaias, até encontrar uma pedra bem grande. Ele a amarrou à outra extremidade da corda e dependurou-a sobre o parapeito da ponte, de modo que ela ficou oscilando acima da água. Então ele ficou de pé no local do crime fatal, a certa distância da borda da ponte, com o meu revólver na mão, a corda esticada entre a arma e a pesada pedra do lado mais afastado.

– Agora vejamos! – ele gritou.

Ao gritar, levantou a pistola até a cabeça e em seguida soltou-a. Em um instante a pistola foi lançada rapidamente para longe pelo peso da pedra, e havia se chocado contra o parapeito com um estampido agudo, desaparecendo sobre a amurada, dentro d’água. Ela mal havia desaparecido e Holmes já estava ajoelhado ao lado da borda de pedra, e um grito de alegria mostrou que ele havia conseguido o que queria.

– Já houve alguma vez uma demonstração tão precisa? – ele perguntou. – Veja, Watson, seu revólver solucionou o problema! Enquanto falava, mostrou uma segunda lasca de pedra, do mesmo tamanho e formato da primeira, que havia aparecido sobre a borda inferior da balaustrada de pedra.

– Ficaremos esta noite na hospedaria – ele continuou, enquanto se levantava e encarava o perplexo sargento. – Naturalmente, o senhor vai conseguir um anzol e recuperar facilmente o revólver do meu amigo. O senhor também encontrará perto dele o revólver, a corda e o peso com os quais esta mulher vingativa tentou disfarçar seu próprio crime e lançar sobre uma vítima inocente o ônus de um assassinato. O senhor poderá informar ao sr. Gibson que irei vê-lo de manhã, quando poderão ser tomadas providências para a defesa da srta. Dunbar.

Naquela noite, enquanto estávamos sentados fumando nossos cachimbos na hospedaria da aldeia, Holmes fez uma rápida revisão do que havia acontecido.

– Receio, Watson – ele disse –, que você, ao acrescentar o caso do mistério da Ponte Thor aos seus registros, não irá melhorar a reputação que eu possa ter adquirido. Minha mente tem estado inativa, ausente, naquela mistura de imaginação e realidade que é a base da minha arte. Confesso que a lasca na pedra da borda foi uma pista suficiente para sugerir uma solução real, e eu me censuro por não ter chegado a esta conclusão mais cedo.

– É preciso admitir que a mente desta mulher infeliz era hábil e sutil, de modo que não foi muito fácil decifrar sua trama. Não creio que em nossas aventuras já tivéssemos encontrado um exemplo mais estranho do que um amor pervertido pode provocar. Se a srta. Dunbar foi sua rival num sentido físico ou num sentido puramente mental, parece ter sido aos seus olhos igualmente imperdoável. Sem dúvida, ela culpava esta moça inocente pela maneira áspera e pelas palavras grosseiras com que seu marido tentava repelir a afeição dela, demasiadamente expansiva. Sua primeira resolução foi pôr fim à própria vida. A segunda, foi fazer isto de modo a envolver sua vítima numa fatalidade que era muito pior do que qualquer morte repentina.

– Podemos seguir com muita nitidez suas várias providências, e estas demonstram uma notável sutileza de pensamento. Foi arrancado muito habilmente da srta. Dunbar um bilhete que faria parecer que ela havia escolhido o local do crime. Em sua ansiedade para que o bilhete fosse descoberto, ela exagerou um pouco, segurando-o em sua mão até o fim. Só este detalhe seria suficiente para despertar suspeitas mais cedo do que o fez.

– Depois ela pegou um dos revólveres do marido – como você viu, havia um arsenal em casa – e o guardou para o seu próprio uso. Naquela manhã, ela escondeu outro revólver semelhante no armário de roupas da srta. Dunbar, depois de descarregar uma bala, o que ela poderia fazer facilmente na floresta sem chamar atenção. Então ela foi até a ponte, onde havia engendrado esta maneira engenhosa de livrar-se da arma. Quando a srta. Dunbar apareceu, ela usou seus últimos momentos para despejar seu ódio, e depois, quando ela estava longe do ruído da arma, levou a cabo sua terrível intenção. Cada elo está agora em seu lugar, e a cadeia está completa. Os jornais podem perguntar por que o pequeno lago não foi dragado no início, mas é fácil ser sábio depois do fato, e, de qualquer modo, a extensão de um lago repleto de juncos não é tarefa fácil, a menos que você saiba exatamente o que está procurando e onde. Bem, Watson, ajudamos uma mulher extraordinária e também um homem formidável. Que eles possam, no futuro, unir suas forças, o que não parece improvável, e que o mundo financeiro possa descobrir que o sr. Neil Gibson aprendeu alguma coisa naquela sala de aula da tristeza onde nossas lições terrenas são ensinadas.

a aventura do homem que andava de quatro

Sherlock Holmes sempre achou que eu deveria publicar os fatos estranhos relacionados com o professor Presbury, ao menos para dissipar, definitivamente, os rumores torpes que uns vinte anos antes agitaram a universidade e repercutiram nas sociedades eruditas de Londres. Mas havia certos obstáculos no caminho, e a verdadeira história deste caso curioso permaneceu sepultada na caixa de metal que contém tantos registros das aventuras do meu amigo. Agora, finalmente, obtivemos permissão para divulgar os fatos de um dos últimos casos apurados por Holmes antes de deixar sua profissão. Mesmo agora, ao se expor o assunto diante do público, é preciso manter uma certa reticência e discrição.

Foi numa tarde de domingo, no início de setembro de 1903, que recebi de Holmes uma mensagem lacônica: “Venha imediatamente, se for conveniente – se for inconveniente, venha assim mesmo. – S. H.” As relações entre nós, naqueles últimos tempos, eram peculiares. Ele era um homem metódico, de hábitos limitados e concentrados, e eu havia me tornado um deles. Como uma instituição, eu era como o violino, o tabaco ordinário, o velho cachimbo preto, os livros de referências e outras coisas talvez menos justificáveis. Quando se tratava de um caso de trabalho ativo, e havia necessidade de um companheiro em cujo sangue-frio ele podia depositar um pouco de confiança, a minha participação era óbvia. Mas fora isso, eu tinha serventia. Era um estimulante para a sua mente. Reconfortava-o. Ele gostava de pensar alto na minha presença. Dificilmente se poderia dizer que suas observações eram dirigidas a mim – muitas delas poderiam ter sido dirigidas aos seus botões –, mas,  mesmo assim, tendo virado um hábito, de certa forma era útil que eu pudesse registrar e fazer observações entre um e outro comentário. Se eu o irritava devido a uma certa lentidão metódica do meu raciocínio, aquela irritação servia para fazer com que suas intuições e impressões em combustão se acendessem mais viva e rapidamente. Em nossa aliança, esse era o meu humilde papel.