Sempre que vejo alguém com grande talento para se apresentar ao vivo, começo a sonhar. Não seria bacana ser um astro do rock como Bruce Springsteen? Não seria legal fazer um discurso e ser aplaudido por 100 mil pessoas como Ronald Reagan? Não seria o máximo fazer um esquete hilário de stand-up de meia hora como Eddie Murphy? Talvez por influência do meu signo, Leão, eu tenha dentro de mim um eterno showman que quer sempre estar no centro dos acontecimentos.
Em relação a Milton Berle, portanto, meu pensamento era: “Talvez eu nunca chegue ao mesmo nível dele, mas se puder aprender só um pouquinho do que ele sabe...” Quantas vezes na vida você precisa fazer um brinde? Quantas vezes precisa discursar em prol de alguma causa nobre, como a boa forma física? Ou participar de uma coletiva de imprensa em algum festival de cinema?
No caso dos filmes de ação, o problema é complexo. Metade dos críticos automaticamente diz: “Detesto filmes de ação. Gosto de histórias de amor, de filmes que possa levar a família para ver. Esse cara não para de matar gente, aí as crianças vão assistir e depois sair pela rua matando gente também.” Começar com algo irresistível e engraçado é um bom jeito de se destacar. Você se torna mais agradável e as pessoas recebem muito melhor as informações a seu respeito.
Sempre que eu assistia a alguma comédia, fosse ela O clube dos cafajestes, Os caça-fantasmas ou Banzé no Oeste, pensava: “Eu poderia ter feito isso!” Só que ninguém iria me contratar para esse tipo de papel, e não fazia sentido bater o pé e insistir: “Meu próximo filme tem que ser uma comédia.” Ainda não havia explorado todo o meu potencial com os filmes de ação. Se quisesse começar a fazer humor em um futuro próximo, precisaria de alguém para me promover.
ESSE PROBLEMA SE RESOLVEU SOZINHO no final de 1986, em um chalé de uma estação de esqui em Snowmass Village, perto de Aspen, Colorado. Certa noite, Maria e eu estávamos em frente à lareira na companhia de Ivan Reitman, Robin Williams e suas respectivas esposas. Robin e eu nos divertíamos contando histórias engraçadas sobre esqui e sobre quem estava dormindo com quem em Aspen. Já Ivan era um mestre: produzira O clube dos cafajestes e fora produtor e diretor de Os caça-fantasmas e Perigosamente juntos. Eu estava louco para trabalhar com ele, de modo que lancei mão de todo o meu arsenal cômico aprendido com Milton Berle. Deu certo. Ao final dessa noite, Ivan me encarou com uma expressão pensativa.
“Sabe de uma coisa?”, falou. “Você tem uma espécie de inocência que nunca vi ser retratada na tela do cinema, e um senso de humor peculiar. Acho que Hollywood está querendo manter você no papel de herói de ação para sempre, mas poderia ser bem interessante vê-lo interpretar um cara fortão com essa inocência.”
Quando voltamos de Aspen, liguei para Ivan e sugeri que fizéssemos algo juntos. Ele topou. Pediu a alguns roteiristas que desenvolvessem cinco ideias para mim e me entregou: cinco memorandos de duas páginas cada um esboçando um personagem e uma ideia. Eliminamos quatro deles bem depressa, mas o quinto parecia ótimo: era sobre dois gêmeos totalmente diferentes, nascidos de um experimento científico destinado a criar o ser humano perfeito. Julius Benedict, meu personagem, fica com todos os genes bons e é praticamente perfeito, apesar de ingênuo. Ele sai à procura do irmão, Vincent, um pequeno contraventor, e os resultados são engraçadíssimos. Concordamos que, por causa da minha origem alemã, o título O experimento não era adequado e rebatizamos o projeto de Irmãos gêmeos. A partir daí, todo mundo se apaixonou pela ideia.
Pensei em chamar Danny DeVito para interpretar Vincent porque eu havia esbarrado por acaso com seu agente e achava que seria muito engraçado se os gêmeos fossem bem diferentes fisicamente. Todos gostaram. Quando falaram com Danny, ele também adorou a ideia, embora desde o início tenha manifestado algumas reservas. “Sim, a piada visual é ótima: Arnold e eu como irmãos gêmeos”, disse ele. “Mas como vamos sustentar isso?” Danny gostava de planejar tudo. E assim nasceu o projeto.
Ivan, Danny e eu formávamos uma equipe interessante. A mãe de Ivan era sobrevivente do campo de concentração de Auschwitz e seu pai lutara na resistência; os dois haviam emigrado da Tchecoslováquia depois da guerra. Como muitos filhos de sobreviventes do Holocausto, Ivan era extremamente determinado e aliava essa qualidade a um incrível talento para dirigir e produzir comédias. Danny, por sua vez, revelou-se um colega de trabalho hilariante. Apesar de seu imenso sucesso na TV e no cinema, ele está longe de ser uma das personalidades excêntricas de Hollywood. Dirige carros normais, tem uma família ótima e leva uma vida igual à de todo mundo. Além disso, é extremamente bem organizado financeiramente.
Como nós três éramos realistas e ponderados em relação aos negócios, pudemos contribuir com um pequeno capítulo para a história de Hollywood. Sabíamos que vender Irmãos gêmeos da maneira convencional seria difícil. Em teoria, os estúdios iriam adorar a ideia: bastava imaginar um cartaz comigo e Danny DeVito lado a lado. Na realidade, porém, o que estávamos propondo era um filme fora do comum com três profissionais caros. Se cada um de nós recebesse o cachê habitual, o orçamento ficaria tão alto que, na nossa opinião, nenhum estúdio iria querer bancar a produção. Ao mesmo tempo, nenhum de nós queria diminuir o valor cobrado, pois trabalhar por menos pode prejudicar seu poder de negociação em contratos futuros.
Assim, quando fomos vender nossa ideia a Tom Pollock, diretor da Universal, nossa proposta foi fazer Irmãos gêmeos sem cachê. De graça.
– Garanto que, graças a Ivan e Danny, o filme vai ser um sucesso – falei. – Mas entendo que você me veja como um cara de ação. Eu nunca fiz comédia e sou um elemento desconhecido. Por que assumir o risco? Então não precisa nos pagar nada até termos provado nosso valor.
Em troca, queríamos uma participação no filme: uma porcentagem do lucro com bilheterias, venda e aluguel de VHS, exibições em aviões e assim por diante. Em Hollywood, isso é conhecido como back end.
Tom estava tão convencido de que o filme seria um sucesso que falou:
– Prefiro pagar o cachê.
A essa altura, porém, Ivan, Danny e eu já estávamos muito apegados à nossa ideia.
– Não queremos receber cachê – falamos. – Nenhum de nós precisa de dinheiro. Vamos dividir os riscos.
O acordo que acabou sendo fechado garantia a nós três 37,5% de todo o lucro do filme. E essa porcentagem era líquida – não estava sujeita aos descontos ou aos truques dissimulados que fazem a fama da contabilidade cinematográfica. Dividimos esses 37,5% proporcionalmente, com base no que cada um de nós tinha ganhado em seu último filme. Como o meu cachê por O sobrevivente fora muito alto, acabei ficando com a parte mais gorda, quase 20%. Assim, a conta era simples: se Irmãos gêmeos fosse um sucesso razoável e arrecadasse, digamos, 50 milhões de dólares, eu embolsaria praticamente 10 milhões.
Tom Pollock sabia muito bem quanto esse contrato poderia ser generoso para nós. No entanto, não queria que procurássemos outro estúdio e recebêssemos uma proposta melhor. Além do mais, se nós ganhássemos dinheiro, a Universal também lucraria bastante. Ele encarou a situação toda com muito bom humor. Depois que fechamos o acordo em sua sala, levantou-se e, com um gesto exagerado, virou do avesso os bolsos da calça: