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– Pronto, agora só me falta ficar de quatro – falou. – Vamos lá. Podem levar tudo o que eu tenho e me enrabar! – Essa se tornou uma daquelas frases lendárias dos executivos de Hollywood. Caímos todos na risada. Então ele concluiu: – Acho um bom acordo. Vamos assinar.

Eu nunca tinha pensado que fazer cinema pudesse ser tão divertido quando não se está coberto de lama gelada na selva ou levando uma surra de cobras mecânicas. Irmãos gêmeos foi filmado em Los Angeles, no Novo México e no Oregon durante os primeiros meses de 1988. Pude fazer coisas diante das câmeras que jamais fizera antes. Dancei valsa. Cantei. Encarnei um virgem de 35 anos seduzido por uma linda moça (interpretada por Kelly Preston, esposa de John Travolta, com quem foi ótimo trabalhar). Entrei em contato com o que Ivan chamava de meu “lado inocente”.

Danny DeVito era o Milton Berle da interpretação cômica. Ele nunca tentava inserir frases engraçadas no texto, nunca dependia de uma piada para criar humor – essas coisas não funcionam diante das câmeras. Em vez disso, ele criava situações engraçadas a partir das circunstâncias. Seu modo de usar a voz e os olhos e a forma como ele movia o corpo eram muito inteligentes. Danny sabia exatamente o que funcionava no seu caso, o que as pessoas adoravam nele e o que iria convencer. Sabia muito bem até que ponto podia levar o diálogo, e todos nós vivíamos trocando ideias com os roteiristas o tempo todo a respeito de cenas e falas, em um processo constante de aprimoramento. Além disso, Danny era um ótimo parceiro de set! Fumava charutos. Preparava massa para todo mundo uma vez por semana, às vezes até duas vezes. Fazia um café expresso delicioso e estava sempre pronto para nos oferecer um licor italiano e nos preparar drinques deliciosos depois do almoço ou do jantar.

Desde o início, a química entre nós dois funcionou muito bem. No papel do dissimulado Vincent, ele vivia tentando me enrolar. Já havia enganado muita gente e agora estava tentando passar a perna em mim. Como Julius, eu era um alvo fácil, mas ao mesmo tempo tinha inteligência suficiente para entender a situação e fazer algo a respeito. Bastava interpretar meu personagem exatamente da forma como ele fora escrito: ingênuo, forte, inteligente, culto, sensível, poliglota.

Em comparação com ser um herói de ação, ser um astro da comédia era bem mais fácil. Os ensaios se concentraram em modificar o ritmo do meu comportamento. Tive que me livrar dos olhares severos, das frases duras, do linguajar autoritário e robótico. O tom monocórdico e lento do Exterminador não servia mais. Tive que jogar fora tudo o que aprendera nos filmes de ação para transmitir liderança e comando. Agora era preciso abrandar tudo isso. Precisava pronunciar as palavras com mais suavidade, fazê-las se encaixarem umas nas outras e combiná-las com expressões mais suaves e movimentos de cabeça mais sutis. Logo no início do filme, há uma cena em que um malvado de motocicleta surge por trás de Julius e tenta lhe arrancar a mala da mão. Só que Julius não solta a mala e o cara acaba caindo da moto. Tive que fazer essa cena sem demonstrar nenhuma raiva ou esforço – para Julius, não largar a mala é uma ação lógica, e ele nasceu com uma força tão descomunal que isso não requer o menor esforço de sua parte. Não é minha intenção fazer o cara ter um acidente. Na verdade, eu fico preocupado que ele tenha se machucado e tento ajudá-lo!

A comédia deu certo. Sabíamos que tínhamos um sucesso nas mãos. A ideia de gêmeos totalmente opostos funcionou à perfeição, e as pessoas no set não paravam de dar risadas. Todas as noites, na hora de assistir ao copião, o elenco e a equipe que tinham nos visto fazer quatro, cinco ou até seis tomadas de uma mesma cena tornavam a rir ao vê-la na tela. Filmamos primeiro em Los Angeles, depois nos transferimos para o deserto perto de Santa Fé, no Novo México.

Aonde quer que fôssemos, apareciam pessoas para nos visitar, pois todos ouviam dizer que aquele era um set feliz. Clint Eastwood passou lá no dia em que filmamos a cena em que eu canto. Julius está dentro de um avião, escutando rock em fones de ouvido pela primeira vez na vida. Ele começa a cantar um hit dos The Coasters da década de 1950, “Yakety Yak”, sem perceber que todos os outros passageiros estão ouvindo. Foi a primeira vez que cantei no cinema, e, para se ter uma ideia de como foi, basta dizer que não sou nenhum Frank Sinatra. Depois da cena, Clint comentou com ironia: “Não sabia que você tinha tanto talento.” Na vida real, a única hora que abro a boca para cantar é no final de uma festa, se quiser enxotar os convidados.

UMA DAS PIADAS CONSTANTES NO SET ERA: “Nunca fale sobre política com Arnold.” Não que isso me chateasse, mas, se alguém me perguntasse alguma coisa, eu fazia uma verdadeira preleção para tentar vender a candidatura do vice-presidente George H. W. Bush. Era época das primárias presidenciais, e Bush concorria à vaga de candidato republicano à sucessão de Ronald Reagan contra o senador Bob Dole, do Kansas, e o pastor evangélico Pat Robertson. Os outros integrantes do elenco de Irmãos gêmeos eram todos democratas, e a brincadeira era que, se eu começasse a falar, eles ficariam chateados comigo, o que prejudicaria o astral do set.

De fato, aconteceu algo durante as filmagens que estragou meu astral, embora não tenha tido nada a ver com o filme nem com a política dos Estados Unidos. Em fevereiro, o tabloide londrino News of the World publicou uma matéria de capa a meu respeito intitulada “Segredo nazista do astro de Hollywood”.

A história atacava a mim, mas o foco era meu pai. O jornal alegava que ele tinha sido nazista e membro da SS e que perseguira e mandara para campos de concentração homossexuais e judeus. A matéria me chamava de “admirador secreto” de Hitler e afirmava que eu era integrante do movimento neonazista e tinha “fervorosas opiniões nazistas e antissemitas”.

Em geral eu simplesmente ignorava as críticas, mas nunca fora acusado de algo tão sério. Sabia que teria que reagir. Depois de conversar com meus advogados e relações-públicas, minha primeira providência foi ligar para Rupert Murdoch, dono do tabloide, que eu já conhecia de Aspen. Expliquei que a história era mentira e ele me ouviu.

– Gostaria que você não publicasse essa matéria nos Estados Unidos – falei. – E gostaria também que o jornal publicasse um pedido de desculpas e dissesse que a matéria foi um erro, que vocês receberam informações equivocadas. Aí podemos esquecer essa história. Erros acontecem.

– Bom – respondeu Murdoch –, o meu pessoal lá de Londres disse que fez uma investigação muito minuciosa. Se a história for verdade, não acho que ninguém precise se desculpar. De toda forma, posso prometer não publicar a matéria nos Estados Unidos.

– Não estou culpando você por cada matéria publicada em todos os seus jornais e outros veículos – enfatizei. – Mas quero chamar sua atenção para o fato de que essa reportagem é uma injustiça. Por favor, apure os fatos.

Rupert cumpriu o prometido: não publicou a matéria em veículos americanos nem a transmitiu em seu novo canal de televisão, a Fox TV. Nada mais aconteceu, porém. Enquanto meus advogados enviavam uma carta formal exigindo uma retratação do tabloide e se preparavam para processá-lo, outros jornalistas começaram a tentar me entrevistar.

Fiquei em uma posição muito desconfortável. Sabia que as informações da matéria sobre mim eram falsas, mas e as acusações contra meu pai? Achava que estavam erradas, mas como podia ter certeza? Nós falávamos tão pouco sobre a Segunda Guerra Mundial em casa... Eu realmente não tinha a menor ideia.

Sendo assim, resolvi ligar para Marvin Hier, meu amigo rabino do Simon Wiesenthal Center.

– Preciso da sua ajuda – falei. – Sei que você tem um sistema para rastrear crimes de guerra. Será que poderia verificar o histórico do meu pai durante o conflito? Quero saber se ele algum dia foi nazista. Em segundo lugar, se integrou a SS. Qual era sua responsabilidade durante a guerra? Ele cometeu algum crime de guerra, ativo ou passivo? Fez alguma dessas coisas que estão dizendo?