QUANDO EU ESTAVA NO MEIO DA negociação da cadeia Planet Hollywood, Paul fez o papel de meu rabino extraoficial. Apesar de todas as pessoas envolvidas no processo estarem usando o advogado da empresa, ele me aconselhou a levar o meu. Também insistiu que tivéssemos calma e fechássemos o acordo do jeito certo. Passamos quase dois anos negociando minha participação na sociedade. Enquanto a principal preocupação dos outros sócios era incluir em seus contratos cláusulas de gratuidade e lucros adicionais, acabei fechando um acordo mais lucrativo e com mais salvaguardas para o caso de o empreendimento dar errado. Depois disso, Paul e o banco de investimentos para o qual ele trabalhava, o Wertheim Schroder & Co., ajudaram-me com outros contratos. Oficialmente, Paul atuava na área de jogos e hotéis no Wertheim – já vendera campos de golfe, clubes de tênis e resorts de esqui. No entanto, eu o vira em ação um número suficiente de vezes para saber que sua capacidade ia muito além disso. Não importava o que o acordo envolvesse – um estúdio de produção, um vinhedo em Napa, um empreendimento para a construção de um shopping –, Paul sempre conseguia chegar ao cerne da questão. Era o cara de raciocínio mais rápido que eu já conhecera.
Paul e eu já trabalhávamos juntos informalmente havia alguns anos quando Ronda chegou ao seu limite. Meu bom senso já vinha me dizendo que eu precisava diversificar meus negócios para além do setor imobiliário, o único que conhecia a fundo. A economia estava aquecida, novas empresas e indústrias surgiam e o mercado de ações se expandia loucamente. Comprar e vender ações, por si só, não me interessava, assim como passar meu tempo pesquisando sobre empresas. Eu sabia, porém, que o mercado de modo geral tinha se valorizado em termos reais mais de seis vezes desde que Jimmy Carter fora eleito. Queria aproveitar esse crescimento. Paul organizou para mim a compra de uma participação em um fundo privado chamado Dimensional Fund Advisers (DFA), com escritório ali mesmo em Santa Monica. Conheci o fundador da empresa, David Booth, aluno de meu herói Milton Friedman, e Paul tecia elogios rasgados ao empreendimento.
“Já vi centenas de empresas na vida, mas nunca um grupo de pessoas como esse”, afirmou ele. “São todos extremamente éticos, com uma capacidade intelectual brilhante e tino para negócios.” Embora ainda fosse pequena e pouco conhecida, a DFA estava se preparando para dominar a fatia do setor de fundos mútuos indexados que a gigante da indústria, a Vanguard, não contemplava. Agarrei a oportunidade e a empresa rapidamente se tornou um de meus bens mais valiosos.
Eu já vinha pressionando Paul para se tornar autônomo, e em 1997 ele abriu no meu prédio um escritório de investidor independente com um único cliente iniciaclass="underline" eu. A essa altura, nós já nos dávamos tão bem que só precisei lhe dar umas poucas instruções. A primeira foi meu velho lema: “Pegue um dólar e transforme em dois.” Queria investimentos grandes que fossem interessantes, criativos e diferentes. Apostas conservadoras – do tipo que renderia, digamos, 4% ao ano – não me interessavam. Empresas offshore e outras estripulias também não chamavam minha atenção. Eu tinha orgulho de pagar impostos sobre o dinheiro que ganhava. Na verdade, quanto mais impostos pagasse, melhor, pois isso apenas mostrava que eu estava ganhando mais dinheiro. Também não queria saber dos investimentos que em geral atraíam os administradores das grandes fortunas de Hollywood, como por exemplo hotéis ou boates de luxo. Podia assumir grandes riscos em troca de grandes retornos e queria saber o máximo possível sobre o que estava acontecendo. Minha disponibilidade para ouvir novas ideias, meu envolvimento e a quantidade de dinheiro que entrava atraíram Paul. Ele sabia que haveria muito a fazer.
A ideia de comprar um Boeing 747 foi se formando aos poucos. Tínhamos um conhecido em São Francisco, chamado David Crane, cuja empresa de investimentos começara a atuar na área de leasing de aeronaves. Esse negócio existe porque as companhias aéreas nem sempre querem ser donas de seus aviões. Ter um avião imobiliza muito capital e pode ser um grande transtorno quando o seu verdadeiro negócio é o transporte de passageiros e cargas. Portanto, as empresas aéreas muitas vezes fazem leasing de aviões de terceiros. Em um contrato desse tipo, a empresa aérea é responsável pela operação e manutenção da aeronave por, digamos, oito anos, e em seguida a devolve ao dono, que fica livre para vendê-la ou cedê-la novamente em outro leasing.
A companhia de David trabalhava com a Singapore Airlines, que eu sabia ter a melhor reputação no setor aéreo. Ela planejava expandir agressivamente sua malha e, para liberar capital, estava vendendo aeronaves e passando a usá-las em leasing por meio de contratos baseados nas garantias do governo de Cingapura. Li um pouco sobre companhias aéreas e leasing e deixei essas informações amadurecerem na minha mente. Um belo dia, quando acordei, a visão surgiu, cristalina: “Preciso comprar um daqueles 747!”
Até onde eu podia avaliar, era uma ótima oportunidade. Também senti, de certa forma, o mesmo impulso que tive ao ver meu primeiro Humvee. O 747 era o mais robusto dos aviões comerciais, e o preço combinava com seu tamanho. Um 747 novo custava entre 130 e 150 milhões de dólares, dependendo do modelo e de opcionais como cabine e área de assentos, capacidade de carga, instrumentação e outras coisas do tipo. Naturalmente, você não precisava pagar o valor inteiro, já que comprar uma aeronave para ceder em leasing é como adquirir um prédio comercial para alugar. Você investe, digamos, 10 milhões e faz empréstimos em bancos para financiar o restante.
Entramos em contato com David Crane. Ele se mostrou cético. Acordos de leasing de aeronaves eram território de instituições financeiras imensas, como a GE Capital. Investidores particulares jamais tinham feito aquilo.
– Duvido que seja possível, mas vou verificar – disse ele, e prometeu mencionar o assunto com seus clientes de Cingapura.
Uma semana mais tarde, ele me procurou.
– Impossível. Não dá. Eles não querem pessoas físicas, só jurídicas.
– Bom, posso entender por quê – retruquei. – Eles provavelmente imaginam que eu sou algum aventureiro de Hollywood que enriqueceu da noite para o dia e de repente acha que pode comprar um 747. Devem pensar que, quando o contrato for assinado, meu filme vai ser um fracasso ou algo do tipo e eu vou dar para trás. Não estão querendo lidar com os viciados e esquisitões típicos de Hollywood. Entendo. Mas será que eles topam fazer uma reunião? Costumam vir a Los Angeles a trabalho?
– Vou verificar.
No dia seguinte, soubemos que seus clientes tinham uma viagem à Costa Oeste marcada para dali a duas semanas e estavam dispostos a passar no meu escritório. “Ah”, pensei. “Como tantas vezes acontece, algo que era impossível está aos poucos se tornando possível.” Quando os executivos da Singapore Airlines chegaram, tínhamos feito nosso dever de casa e foi fácil vender-lhes nossa ideia. Passei o início da reunião revendo as cláusulas do acordo, sobretudo para lhes mostrar que entendia como tudo funcionava. Deu para vê-los relaxarem imediatamente. Meia hora mais tarde, já estávamos tirando fotos juntos e o acordo, em princípio, estava fechado. Dei-lhes de lembrança jaquetas de O exterminador do futuro 2, além de bonés do Predador e camisetas de fisiculturismo. Sabia que, lá no fundo, eles eram meus fãs.
Foi então que veio a parte difícil – para Paul. Às vezes, quando você avalia um acordo sem ter todo o conhecimento sobre o assunto ou sem saber exatamente tudo o que está envolvido, sua capacidade de enxergar o perigo se reduz e sua disposição para se arriscar aumenta. Eu via apenas o que estava à minha frente, e tudo parecia bom. É claro que eu também sentia o cheiro do risco. Só que, quanto mais arriscadas as coisas são, maior é a possibilidade de lucro.