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Depois dessa primeira semana, os caras da seguradora e do estúdio não voltaram mais ao set. Enquanto isso, espalhou-se entre dublês, maquiadores e figurinistas um boato de que eu estava me sentindo ótimo, que minha saúde ia de vento em popa e coisas do tipo. A partir daí, as propostas recomeçaram a aparecer e não precisei mais convencer as pessoas de que ainda estava vivo.

CAPÍTULO 23

Proposta política

AS PESSOAS ADORAVAM FAZER PIADA COM a possibilidade de eu entrar para a política. Durante um jantar com o seu secretariado em Sacramento, em 1994, o governador Pete Wilson me cumprimentou do pódio dizendo: “Arnold, eu gostaria de ver você concorrendo a governador. Um cara que atuou em Um tira no jardim de infância já possui a experiência necessária para lidar com o legislativo estadual.” Todo mundo riu. Mas a ideia de um astro de Hollywood se candidatar a governador não era tão absurda assim. Ronald Reagan já tinha aberto esse precedente.

No ano anterior, no filme de ficção científica O demolidor, o personagem de Sylvester Stallone ia parar, de repente, no ano de 2032. Quando ouviu alguém se referir à Biblioteca Presidencial Arnold Schwarzenegger, ele achou estranho. Candidatar-me a presidente estava fora de questão, já que eu não era um americano nato, como exige a Constituição. Mesmo assim, eu volta e meia tinha fantasias: e se minha mãe tivesse ficado animadinha no final da guerra e meu pai na verdade não fosse Gustav Schwarzenegger, mas sim um agente do governo americano? Isso explicaria minha forte sensação, desde sempre, de que os Estados Unidos eram meu verdadeiro lar. E se o hospital no qual ela dera à luz a mim estivesse situado na zona de ocupação americana? Isso não equivaleria a nascer em solo americano?

Eu considerava meu temperamento mais adequado ao cargo de governador que ao de senador ou deputado federal, já que, como governador – o principal cargo executivo –, eu seria o capitão do navio, e não um dos 100 senadores ou 435 deputados responsáveis por tomar decisões. É claro que nenhum governador toma resoluções sozinho, mas ele pode tentar implementar a própria visão na administração do estado, e pelo menos ter a sensação de que a palavra final é dele. É bem parecido com ser protagonista de um filme. Você leva a culpa por tudo, mas também leva todo o crédito. Riscos altos, grandes recompensas.

A lealdade e o orgulho que eu sentia da Califórnia eram enormes. Meu estado de adoção é maior do que muitos países. Tem 38 milhões de habitantes, quatro vezes mais que a Áustria. Tem 1.300 quilômetros de comprimento e 400 de largura. É fácil percorrer de bicicleta alguns dos estados menores dos Estados Unidos, mas, se você quiser atravessar a Califórnia, talvez seja melhor fazer isso montado em uma Harley e arrumar uma maneira mais moderada de se exercitar. A Califórnia tem montanhas espetaculares, 1.350 quilômetros de litoral, florestas de sequoias, desertos, terras cultivadas e vinhedos. A população fala mais de 100 idiomas diferentes. Além disso, o estado movimenta uma economia de 1,9 trilhão de dólares – maior que a do México, da Índia, do Canadá ou da Rússia. Quando o G20 reúne as 20 maiores economias do mundo para tomar decisões, um representante da Califórnia deveria estar sentado à mesa.

Ao longo dos anos desde minha chegada a Los Angeles, o estado havia passado por fases de crescimento rápido e por outras em que o progresso foi mais lento. De modo geral, porém, havia prosperado, e eu me considerava um feliz beneficiário dessa riqueza. Do ponto de vista político, assim como muitos imigrantes de sucesso, eu era conservador: desejava que os Estados Unidos continuassem a ser o bastião da livre iniciativa e queria fazer tudo o que pudesse para proteger o país de seguir a Europa no caminho da burocracia e da estagnação. Quando eu morava lá, o continente era assim.

A década de 1990 tinha sido próspera e a Califórnia agora tinha seu primeiro governador democrata desde meados dos anos 1980: Gray Davis. Ao assumir o governo, em 1999, ele começara seu mandato com força, expandindo o ensino público e melhorando as relações com o México. Era um cara magrelo, reservado e sem muito talento para falar em público, mas seus programas eram populares e ele tinha um grande excedente orçamentário com o qual trabalhar, oriundo em grande parte do boom do Vale do Silício nas décadas de 1980 e 1990. Seu índice de aprovação entre os eleitores era alto, por volta de 60%.

Os problemas começaram com o estouro da bolha da internet. Em março de 2000, pouco antes de eu terminar de rodar O sexto dia, ficção científica sobre a clonagem de humanos, a bolha das empresas on-line estourou e a bolsa de valores iniciou seu pior declínio em 20 anos. Uma baixa significativa no Vale do Silício era má notícia para o estado, pois a arrecadação de impostos iria cair e muitas decisões difíceis teriam que ser tomadas em relação a serviços públicos e empregos. A Califórnia tem uma arrecadação bastante expressiva com o Vale do Silício. Se essas empresas caem 20%, isso acaba gerando um impacto de 40% nos cofres públicos. Foi por esse motivo que recomendei que o excedente de arrecadação dos anos de crescimento fosse usado para investir em infraestrutura, saldar dívidas ou constituir um fundo emergencial que ajudasse a atravessar os anos economicamente difíceis. Comprometer capital em programas que exijam um nível de gastos equivalente ao de um período de crescimento é um erro grave.

Além do estouro da bolha, houve também a crise de energia de 2000 e 2001: primeiro o preço da energia elétrica em San Diego triplicou, depois houve escassez de energia e apagões em torno de São Francisco que ameaçaram afundar todo o estado. O governo parecia paralisado: os reguladores estaduais e federais ficaram jogando a culpa uns nos outros em vez de agir, enquanto os intermediários – encabeçados pela atualmente mal-afamada empresa de energia Enron, de Houston – passaram a racionar o fornecimento no intuito de gerar uma explosão nos preços. Em dezembro de 2000, Gray Davis fez um gesto simbólico ao desligar as luzes da árvore de Natal da capital logo depois de acendê-las, para lembrar à população a importância de poupar energia e se preparar para o racionamento no ano seguinte. Detestei a imagem da Califórnia que esse gesto transmitiu: parecíamos um país em desenvolvimento, não o estado de ouro dos Estados Unidos. Fiquei com raiva. Era essa nossa reação à crise de energia? Apagar as luzes da árvore de Natal? Que burrice! Eu entendia que tinha sido um gesto simbólico, mas não estava interessado em símbolos. Para mim o importante era a ação.

Grande parte disso não foi culpa de Gray Davis – a economia estava atravessando uma fase ruim e pronto. No entanto, na metade de seu mandato a população começou a achar que ele estaria vulnerável quando se candidatasse à reeleição, em 2002, e seu índice de aprovação logo começou a cair. Eu me sentia tão frustrado quanto o restante das pessoas. Quanto mais lia sobre a Califórnia, mais tinha a impressão de que só havia más notícias. Peguei-me pensando: “Não podemos continuar assim. Precisamos de uma mudança.”

Tudo isso influenciou meu antigo debate mental sobre qual deveria ser meu próximo desafio. Será que eu deveria virar produtor de cinema? Ou será que deveria produzir, dirigir e atuar, como Clint Eastwood? Será que deveria virar artista plástico, agora que voltara a travar contato com meu amor pela pintura? Eu não estava com pressa para resolver essas questões – sabia que, no devido tempo, elas acabariam tomando forma em minha mente. Mesmo assim, continuei obedecendo à minha antiga disciplina de estabelecer objetivos concretos a cada virada de ano. Na maioria das vezes, o filme no qual eu estava trabalhando encabeçava a lista. Nesse ano, porém, embora eu estivesse comprometido com alguns projetos – entre os quais O exterminador do futuro 3 –, não havia nada realmente agendado. Assim, em 1o de janeiro de 2001, escrevi no topo da minha lista: “Explorar a possibilidade de concorrer ao governo do estado em 2002”.