Apesar das dúvidas, eu achava que poderia vencer. Teria que voltar a meu peso de competição, mas já fizera algo parecido antes, depois da cirurgia no joelho, em 1972. Na época, minha coxa esquerda atrofiou de 71 para 57 centímetros, mas consegui fazer com que aumentasse mais do que nunca a tempo do Mister Olympia daquele ano. Minha teoria era que as células musculares, assim como as de gordura, têm memória, ou seja, podem voltar rapidamente ao que eram antes. Mas é claro que também havia incertezas. Eu iria querer apresentar um desempenho ainda melhor do que o do Madison Square Garden, então será que deveria recuperar meus 113 quilos ou aparecer mais magro? Fosse qual fosse a resposta, achei que seria possível.
A ideia de ter as câmeras de Butler me filmando o tempo todo enquanto eu treinava era sedutora. Todo mundo quer estar mais bonito diante de uma câmera, então isso acaba sendo uma grande motivação. Pensei que talvez, depois de algum tempo, a equipe de filmagem pudesse se tornar parte do cenário e eu não reparasse mais na sua presença, o que seria ótimo para minha carreira de ator.
Durante pelo menos uma semana, todos os dias eu passava algum tempo sentado no hotel pesando os prós e os contras, depois saía para filmar mais uma cena de O guarda-costas. Quando terminava, voltava e pensava um pouco mais, aí saía para conversar com outras pessoas. Charles Gaines decidira não trabalhar no documentário com George e se dedicar a outros projetos de roteiro. Ele considerava minha volta às competições um erro. “Você agora já embarcou na sua carreira de ator”, opinou. “Precisa mostrar às pessoas que está levando isso a sério. Depois deste filme, elas vão querer vê-lo continuar as aulas de interpretação com atores e diretores talentosos. Se você começar a competir outra vez, vai parecer que está com um pé dentro e outro fora, para poder voltar ao fisiculturismo caso a carreira de ator não dê certo. É essa a impressão que você quer passar?”
Ao longo de toda a vida, meus objetivos tinham sido simples e lineares, como por exemplo hipertrofiar um músculo com centenas de milhares de repetições. Aquela situação, porém, não era nada simples. Eu havia me comprometido totalmente a me tornar um ator esbelto e atlético, então como desfazer isso e voltar a me concentrar em ganhar o Mister Olympia outra vez? Eu sabia como minha mente funcionava, e sabia que, para realizar qualquer coisa, tinha que acreditar nela por completo. O objetivo precisava ser algo que fizesse total sentido, pelo qual eu pudesse ansiar diariamente, não apenas algo que fizesse por dinheiro ou por algum outro motivo arbitrário, porque nesse caso não daria certo.
No fim das contas, percebi que precisava pensar no problema de forma diferente. Não dava para tomar a decisão de um ponto de vista puramente egoísta. Minha sensação era que, embora eu já houvesse embarcado na carreira de ator, devia muito ao fisiculturismo para rejeitá-lo. Portanto, tinha que fazer o documentário e competir mais uma vez no Mister Olympia – não por mim, mas para ajudar a promover o esporte. Eu poderia avançar na carreira de ator ao mesmo tempo, e, se pessoas como Charles ficassem confusas com a minha atitude, era só explicar e pronto.
UM MÊS DEPOIS QUE VOLTEI DO ALABAMA, meus amigos deram uma festa de aniversário na casa de Jack Nicholson para comemorar meus 28 anos. Quem organizou a recepção foi Helena Kallianiotes, que cuidava da casa de Jack e fizera uma pequena participação em O guarda-costas. Ela era bailarina e entendia o treinamento pesado e a dedicação exigidos pelo fisiculturismo. Em Birmingham, tornara-se uma boa amiga, ajudando-me com os ensaios e me levando para conhecer restaurantes que serviam ostras. Depois, quando escrevi Arnold’s Bodyshaping for Women (O método Arnold para modelar o corpo feminino), Helena foi a primeira pessoa que consultei para entender melhor o que as mulheres pensavam da malhação.
A festa foi um grande sucesso. Muita gente de Hollywood compareceu, assim como meus amigos de Venice Beach – uma mistura fantástica de atores, fisiculturistas, halterofilistas, caratecas e escritores, além de visitantes de Nova York. Havia cerca de 200 convidados. Para mim foi o paraíso, porque pude me apresentar para várias pessoas novas.
Agora que estava de volta, pude conhecer melhor Nicholson, Beatty e o restante do pessoal de Mulholland Drive. Eles estavam em evidência na época, com filmes como Chinatown, A trama e Shampoo. Saíam em capas de revistas e frequentavam as boates da moda. Estavam todos sempre juntos e, no inverno, iam esquiar em Gstaad, na Suíça. Eu não era íntimo o suficiente para sair com eles o tempo todo, mas pude ver como estrelas daquele quilate viviam e se comportavam, do que gostavam e que lugares frequentavam. Isso me serviu de inspiração para alcançar o mesmo nível dali a alguns anos.
Jack Nicholson era muito descontraído e discreto. Vivia de camisa havaiana, short ou calça comprida, óculos escuros e cabelos desgrenhados. Tinha um Mercedes do modelo mais caro, um Pullman 600 marrom com bancos de couro e um painel de madeira extraordinário. Na verdade, quem usava o carro não era Jack, e sim Helena. Ele dirigia um fusca, e essa era a sua peculiaridade: “Eu sou tão rico que vou tentar me fazer passar por uma pessoa comum. Não estou nem aí para dinheiro.” Ele chegava de fusca ao estacionamento do estúdio para uma entrevista com a imprensa ou para conversar sobre algum filme. O segurança do portão dizia “Ah, olá, Sr. Nicholson. Sua vaga é bem ali”, e Jack entrava com o carrinho engasgando, como se mal conseguisse andar. Isso não era fingimento. Ele se sentia mais à vontade no fusca que no Mercedes. Já eu teria adorado o Mercedes.
Um amigo fotógrafo de Nova York foi me visitar e me levou para conhecer a casa de Warren Beatty na praia. Warren queria que ele visse as plantas da casa nova que ele estava construindo em Mulholland Drive. O ator era famoso por não conseguir se decidir nunca e passar horas e horas debatendo cada opção. Ele estava em uma fase ótima: estrelara recentemente o filme A trama, dirigido por Alan Pakula, era corroteirista e protagonista de Shampoo e estava dirigindo um longa sobre a Revolução Russa que acabou se transformando em Reds. No entanto, ao ouvi-lo falar, era difícil acreditar que tivesse conseguido realizar qualquer coisa. Pensei que não seria assim que eu me comportaria se estivesse no mesmo nível que ele, mas também estava aprendendo que atores natos são sempre um pouco excêntricos e estranhos. É fácil identificar o tipo. Quando você convive com executivos, eles se comportam como executivos. Políticos se comportam como políticos. Já aqueles caras trabalhavam com entretenimento e agiam como profissionais do entretenimento. Eram atores de Hollywood. A situação era diferente.
O único que não se encaixava nesse perfil era Clint Eastwood. O pessoal de Mulholland Drive gostava de ir jantar no restaurante de Dan Tana, no Santa Monica Boulevard. Sentavam-se todos juntos, enquanto Clint comia sozinho em uma mesa no outro lado do salão. Um dia, fui até lá me apresentar e ele me convidou para sentar por um instante para bater papo. Era fã de fisiculturismo e malhava com regularidade. Estava com um paletó de tweed espinha de peixe muito parecido com o que usara no filme Perseguidor implacável, de 1971. Mais tarde eu soube que não era só parecido: era o mesmo paletó. Clint era um cara muito simples. Depois que nos tornamos amigos, ele me contou que sempre guardava os figurinos das produções de que participava e passava anos usando as mesmas roupas, sem nunca comprar nada novo. (Hoje em dia, claro, ele gosta de se produzir com roupas bonitas. Talvez ainda as ganhe.) Muitos astros ficavam constrangidos ao ver uma celebridade jantando sozinha. Na verdade, porém, Clint ficava totalmente à vontade fazendo isso.