Выбрать главу

Imaginar coisas atrevidas para dizer era fácil, porque eu vivia pensando nelas para me entreter. Além do mais, George me instigava. Durante uma entrevista, fiz o fisiculturismo soar sexy ao comparar o treinamento com muitas repetições de cada exercício – que serve para inflar os músculos com sangue oxigenado – a um orgasmo. Disse que não fui ao velório de meu pai porque isso teria interferido nos meus treinos. Filosofei que apenas poucos homens nascem para liderar, enquanto o resto da humanidade nasce para segui-los, e daí passei a um discurso sobre os grandes conquistadores e ditadores da história. George teve o bom senso de cortar essas cenas do filme, sobretudo meu comentário sobre como admirava o talento para a oratória de Hitler, mas não a forma como ele o utilizara. Eu ainda não sabia a diferença entre ser atrevido e ser ofensivo.

Era estressante ter câmeras apontadas para mim o tempo todo, não apenas quando estava trabalhando, mas também quando estava em casa, visitando amigos, tendo aulas de administração ou de interpretação, avaliando imóveis, lendo roteiros etc. Mais uma vez fiquei grato pela existência da meditação transcendental, especialmente porque os centros não permitiam a entrada de câmeras.

Aterrorizar Lou e seu pai fazia parte da carga dramática do filme. Naquele outono, comecei a armação fingindo que estava com medo.

– Espero que vocês façam alguma merda nos treinos – falei para o pai de Lou. – Senão seu filho vai ser um perigo para mim na competição.

– Ah, mas nós não vamos fazer besteira nenhuma.

O próprio Lou era fácil de abalar, assim como Sergio Oliva, Dennis Tinerino ou qualquer fisiculturista tão introspectivo quanto eles, que não prestavam atenção no mundo à sua volta. Você podia perguntar casualmente a Lou:

– Como anda seu abdômen?

E ele respondia:

– Bem, por quê? Na verdade, estou me sentindo bastante sarado.

– Bom, é que... Não, deixe para lá, não se preocupe, seu abdômen está ótimo.

Assim que você dizia isso, ele começava a examinar o próprio abdômen e em seguida ia posar na frente do espelho, cada vez mais dominado pela insegurança.

Em O homem dos músculos de aço dá para ver como não parei de provocar Lou e o pai até o momento da disputa. Como quando digo a Lou: “Eu sei que a competição vai ser só amanhã, mas já liguei para minha mãe e disse que ganhei.” Ou então, na manhã do evento, quando ele e os pais me convidam para tomar café da manhã com eles em seu hotel e eu respondo: “Não acredito. Vocês passam a semana inteira me ignorando e agora querem tomar café comigo no dia da competição? Estão tentando manipular minha mente!” Finjo estar com tanto medo que faço os ovos mexidos tremerem em cima do meu garfo. Tudo isso era, em grande parte, uma encenação para que o público que fosse assistir ao filme saísse do cinema dizendo: “Dá para acreditar naquele cara? Ele convenceu o adversário a perder.” Mas também acabou surtindo efeito em Lou, que ficou em terceiro lugar, enquanto eu estabeleci um recorde vencendo o Mister Olympia pela sexta vez seguida.

CAPÍTULO 11

O homem dos músculos de aço

GEORGE JÁ TINHA RODADO METADE DO filme quando seu dinheiro acabou. Em vez de desistir do projeto, ele teve a ideia de organizar uma demonstração de poses em um museu de arte de Nova York para tentar atrair patrocinadores ricos. Não sabíamos muito bem se era uma ideia idiota ou realmente brilhante. O Museu Whitney de Arte Americana, conhecido por exibir obras pouco convencionais, aceitou a proposta.

O evento foi divulgado com o título “Músculos articulados: O corpo masculino na arte” e, para promovê-lo, o museu abriu as portas em uma sexta-feira à noite em fevereiro de 1976. A ideia era mostrar poses de modelos vivos – Frank Zane, Ed Corney e eu – ao lado de slides de estátuas gregas e grandes obras de Michelangelo, Da Vinci e Rodin. Uma banca de professores universitários e artistas fez comentários durante e depois da apresentação. Era a primeira vez que alguém fazia um debate público sério sobre o significado do fisiculturismo.

George esperava algumas centenas de pessoas, mas, apesar da nevasca que caiu nessa noite, mais de 2.500 convidados apareceram e a fila deu a volta no quarteirão. A galeria no quarto andar do museu ficou lotada de gente em pé e sentada em cada pedacinho de chão disponível. Bem no meio foi montada uma plataforma giratória onde nos revezaríamos para posar.

Provavelmente dois terços do público nunca tinham visto um fisiculturista na vida. Eram pessoas da mídia e do mundo da arte nova-iorquino: críticos, colecionadores, patrocinadores e artistas de vanguarda como Andy Warhol e Robert Mapplethorpe. As revistas People e New Yorker e os jornais New York Times e Daily News haviam mandado repórteres para cobrir o evento e a atriz Candice Bergen tirava fotos para o programa de TV Today. Ela era ótima fotógrafa, além, é claro, de ser lindíssima. De repente, o fisiculturismo estava em voga. Conseguíramos sair do mundo dos esportes e do circo para adentrar a cultura pop internacional.

Frank, Ed e eu ficamos orgulhosos por estar posando em um museu de verdade. Tínhamos planejado uma exibição artística, deixando de lado poses mais agressivas do fisiculturismo como a “mais musculoso”. Queríamos que cada pose fosse como uma escultura, sobretudo por estarmos em cima de uma plataforma giratória. Quando chegou a minha vez, Charles Gaines se encarregou da narração enquanto eu fazia as poses costumeiras e algumas de minhas marcas registradas, como a três quartos de costas. “Essa pose é típica do Arnold”, explicou Gaines. “E nela vocês podem ver todos os músculos das costas, as panturrilhas e todos os músculos da coxa.” Encerrei meus 10 minutos de apresentação com uma imitação perfeita de O pensador, de Rodin, e fui muito aplaudido.

Depois que posamos, nos vestimos e fomos participar do debate com os especialistas em arte. De certa forma, o que eles disseram foi fascinante. Para começar, mostraram que se pode debater qualquer assunto. Um dos professores universitários disse que aquele evento sinalizava “o ingresso da forma masculina altamente desenvolvida e bela na esfera da cultura oficial”. O próximo a falar afirmou que, por causa do Vietnã, os Estados Unidos estavam procurando uma nova definição de virilidade e que a resposta éramos nós. Mas então ele estabeleceu um vínculo entre o fisiculturismo e o racismo ariano da Europa na década de 1920, junto com a ascensão do nazismo, e alertou que nós simbolizávamos um possível crescimento do fascismo nos Estados Unidos. Outro professor comparou nossas poses aos piores exemplos de kitsch da era vitoriana. Ele foi vaiado.

Aquilo tudo foi principalmente um golpe de publicidade, é claro. Mas eu achei que falar sobre o corpo como escultura fazia sentido. Era assim que Joe Santo, meu personagem em O guarda-costas, o descrevia. A arte me fascinava, e, se a comparação com a escultura fosse atrair a atenção de pessoas de fora para o esporte e ajudá-las a entendê-lo, ótimo! Qualquer coisa era melhor que o estereótipo de fisiculturistas como aberrações burras, gays, narcisistas e obcecadas por músculos.

Infelizmente, havia muito menos coisas acontecendo em Hollywood do que em Nova York. O guarda-costas foi minha primeira experiência sobre como o marketing cinematográfico pode dar errado. Quando o filme estreou, em abril, as críticas foram boas, mas o número de espectadores decepcionou. Ele passou 10 ou 12 semanas em cartaz e depois sumiu dos cinemas. O problema era que os relações-públicas e marqueteiros da United Artists não conseguiam bolar um jeito de promovê-lo. Rafelson deixou que eu assistisse a uma reunião antes do lançamento, na qual se falou em colar cartazes nas academias. Então, quando o filme estreou, mandaram que eu e Sally Field participássemos do programa The Mike Douglas Show ensinando ao apresentador de 50 anos a se exercitar. Sempre que fazíamos algo assim, eu tinha a sensação de que estávamos indo na direção errada. O guarda-costas deveria ter sido vendido como um filme de Bob Rafelson – “do mesmo diretor de Cada um vive como quer!” –, e o quesito exercício deveria ter sido uma surpresa. Aí os espectadores teriam saído do cinema dizendo: “Rafelson é assim: sempre nos apresenta algum mundo diferente.”