Eu sabia que The Streets of San Francisco seria um bom cartão de visita e que poderia ajudar Hollywood a me levar mais a sério. A série também era uma forma de conquistar o reconhecimento do público de TV. A cena em que eu mato a garota, porém, foi um desafio. Machucar uma mulher, gritar, arrancar quadros da parede e atirar móveis não tinha nada a ver comigo. Quando li o roteiro, pensei: “Meu Deus, como é que fui entrar nessa?” Considerando as centenas de pessoas que posteriormente viria a matar no cinema, chega a ser engraçado pensar nisso agora. No final das contas, fiz a cena e pronto, sem pensar muito no assunto, e o diretor gostou.
Minha maior preocupação era ficar marcado por fazer sempre o mesmo tipo de papel. Na minha cabeça, fazer um vilão ou um cara violento no cinema era a pior coisa do mundo. Quando Robert de Niro mata em Taxi Driver, ele é um cara pequeno e as pessoas o defendem totalmente, então isso foi bom para sua carreira. Para um homem do meu tamanho, porém, com minha aparência e meu sotaque, os papéis de vilão pareciam um beco sem saída. Conversei com Bob Rafelson sobre isso e ele concordou. Sua sugestão foi que eu agisse de forma inesperada para contrabalançar os papéis estereotipados. Fiquei fascinado com a ideia de fazer uma refilmagem de “The Killers” (Os assassinos), um conto de Ernest Hemingway em que um ex-boxeador chamado Sueco é perseguido por dois assassinos da Máfia. Eu me imaginava fazendo a vítima, Sueco. Mas a ideia nunca saiu do papel.
Por sorte, a expectativa em torno de O homem dos músculos de aço não parava de aumentar. George Butler conseguira o dinheiro necessário para finalizar o filme e estava trabalhando feito um louco na divulgação. Sua jogada mais inteligente com certeza foi contratar Bobby Zarem, o rei das relações públicas de Nova York. Bobby era um cara já meio careca de uns 40 anos, criado na Geórgia, que começara a atuar na área assim que se formara em Yale. Ele gostava de fazer o estilo professor maluco: usava a camisa para fora da calça, sem gravata, e tinha tufos de cabelo eriçado nas laterais da cabeça. Sempre falava como se não estivesse entendendo nada e o mundo estivesse acabando. Vivia se lamentando: “Não sei o que estou fazendo, nunca vi uma situação ruim como esta, preciso ir ao analista, o cara não retorna meus telefonemas, acho que o projeto inteiro está indo por água abaixo.” Ouvi-lo falar assim sobre O homem dos músculos de aço me deixou assustado, até eu entender que era uma estratégia. Inevitavelmente, alguém sempre lhe dizia: “Não, Bobby, está tudo bem. Você vai conseguir.” E ele adorava.
Fazia apenas um ou dois anos que Bobby abrira a própria agência, e acho que ele assumiu a divulgação de O homem dos músculos de aço em parte para provar que era capaz. Com certeza George Butler não estava lhe pagando um valor alto pelo trabalho. No entanto, nos 11 meses que transcorreram entre o evento no Whitney e o lançamento do filme, Zarem trabalhou nos bastidores para criar expectativa. Organizava sessões especiais e convidava umas 20 pessoas importantes do mundo da arte, da literatura e das finanças para mostrar cenas do filme ainda em finalização. Embora essas exibições fossem informais, ele sempre fazia questão de que um ou dois membros da imprensa comparecessem. Eu o acompanhava com alguma frequência, e foi assim que conheci o jornalista de TV Charlie Rose, por exemplo, cuja esposa na época, Mary, se tornou uma das patrocinadoras do filme. Bobby sempre começava a projeção com um discurso rápido a respeito de como o fisiculturismo era uma ligação fascinante entre o esporte e a arte ou sobre como era um importante indicador da valorização atual da boa forma física – isso era suficiente para dar aos convidados a sensação de estar na vanguarda. Depois da projeção, choviam perguntas.
Eu ficava boquiaberto ao ver Bobby interagir com os veículos de comunicação. Ele me ensinou que os releases de imprensa normais eram uma perda de tempo, sobretudo quando se tentava atrair a atenção dos repórteres de TV. “Ninguém lê esses releases!”, dizia ele. Em vez de mandar esse material de divulgação padronizado, ele aproveitava o fato de conhecer pessoalmente dezenas de jornalistas e seus editores. Criava uma matéria para um jornalista específico, ligava para ele e dizia: “Estou lhe mandando um material agora. Por favor, me ligue assim que receber. Se não ligar, vou assumir que não quer a matéria e não vai sobrar muita coisa para você.” Bobby era famoso por suas propostas longas e antiquadas, escritas à mão. Certa vez ele me deixou ler uma carta de quatro páginas que enviou para o editor da Time explicando por que a revista deveria publicar uma reportagem grande sobre fisiculturismo. Editores e diretores de redação de toda Nova York se dispunham a encontrá-lo para conversar. Caso jornais ou canais de televisão diferentes estivessem competindo por uma mesma reportagem, ele criava um ângulo distinto para cada veículo, de modo que eles não ficassem simplesmente seguindo o que os outros faziam. Estudava a matéria, a aprimorava e depois conversava com as pessoas a respeito – ele costumava frequentar o Elaine’s, ponto de encontro de personalidades do mundo literário, jornalistas e celebridades do Upper East Side.
O trabalho de Bobby era promover O homem dos músculos de aço, mas eu me inspirei no estilo dele para ser reconhecido por meu trabalho em O guarda-costas. Embora o filme não tivesse tido um grande público, eu fora indicado ao Globo de Ouro de melhor ator estreante. (Hércules em Nova York fora um fracasso tamanho que O guarda-costas era considerado meu filme de estreia!) Éramos cinco indicados – entre os outros estavam Harvey Spencer Stephens, o menino de 5 anos que fizera o papel de Damien no filme de terror A profecia, e o escritor Truman Capote, por sua participação na comédia Assassinato por morte. Naturalmente, a indicação despertou meu lado competitivo. Como eu poderia me destacar? A estratégia que escolhi foi publicar anúncios nas revistas Variety e Hollywood Reporter, especializadas no show business, agradecendo à Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood pela indicação – são os seus membros que escolhem os vencedores do prêmio.
Também convidei membros da associação para um jantar e uma sessão particular de O homem dos músculos de aço. Bobby Zarem não gostou muito da ideia, pois eu fora indicado por O guarda-costas, e não pelo documentário, e na sua opinião o filme de George Butler era vanguardista demais para a imprensa estrangeira de Hollywood. Mas eu achei que mal não poderia fazer. Para começar, os críticos apreciam ver o trabalho mais recente de um artista, ainda que não seja o que estão julgando, pois gostam de sentir que estão votando em alguém que está em uma boa fase profissional. Além disso, no documentário eu podia me soltar muito mais, então por que não dar aos críticos as duas visões: O guarda-costas pela atuação e O homem dos músculos de aço pelo atrevimento? Também imaginei que a imprensa estrangeira fosse simpatizar imediatamente com um imigrante se esforçando para divulgar um esporte nos Estados Unidos. E, mesmo que nenhuma dessas razões se sustentasse, eu tinha muito orgulho do trabalho que fizera em O guarda-costas e queria chamar atenção para ele de todas as formas possíveis. Vários jornalistas foram assistir à projeção e, no final, as pessoas me abraçaram e disseram coisas como “Você arrasou!” ou “Que maravilha!”, mostrando que a estratégia tinha funcionado.