Não sabia se deveria ir. Parecia complicado demais. Além disso, eu não levara dinheiro algum, e só tinha meu uniforme de tênis e a raquete ganha no torneio.
– Não se preocupe com suas roupas que ficaram no hotel – disse Maria. – De qualquer maneira, o quarto já está pago pela fundação até amanhã à noite. A essa hora você já terá voltado, então pode pegar suas coisas e ir para casa. Enquanto isso, venha conosco. O que vamos fazer lá, só para você saber... Você gosta de esqui aquático?
– Gosto, eu sei esquiar. Não consigo ficar em pé em um esqui só, mas em dois eu consigo.
– Sabe nadar?
– Sei, sim. Gosto muito de nadar.
– Ótimo, porque nós gostamos de sair de barco e de nos revezar para sermos rebocados pelo veleiro, e vamos até Egg Island. É muito divertido! Só fazemos coisas no mar, então você não precisa levar nada. Já está de short, mesmo, e meu irmão Bobby pode lhe emprestar outro, ou uma camisa, ou o que você precisar.
– Estou sem nenhum dinheiro, não tenho absolutamente nada.
– Você vai ficar na nossa casa! Não precisa de dinheiro.
Primeiro, uma leva de “adultos” embarcou: Ethel, Teddy e outros da mesma geração. Então, às nove da noite, entrei no avião com os primos. Lembro-me de ter aterrissado às dez e meia ou algo assim. Agora estávamos no casarão de Hyannis Port e Maria não parava de se exibir.
– Vamos nadar! – disse ela.
– Como assim, nadar?
– Está uma noite linda! Vamos nadar um pouco.
Então fomos. Nadamos até um barco bem distante do píer. Maria era um verdadeiro peixinho.
Tudo isso fazia parte do teste. Os primos viviam levando convidados à casa dos Kennedy para testá-los e fazer brincadeiras com eles. É claro que eu não sabia disso.
Finalmente, fomos dormir. Bobby me cedeu seu quarto, bem ao lado do de Maria. Na manhã seguinte, quando acordei, a casa estava em polvorosa. “Todo mundo pronto! Todo mundo pronto! Vamos nos encontrar na igreja! Vovó vai à igreja hoje! A missa é para ela!” Todos corriam para lá e para cá, pegando as roupas uns dos outros.
De repente, ocorreu-me que eu só tinha uma roupa de tênis.
– Não tenho nada para vestir – falei.
– Bom, tome aqui, vista uma camisa do Bobby – disse um dos primos.
Aquilo não parecia muito promissor: Bobby pesava 77 quilos e eu, 104. A camisa ficou toda apertada, com os botões a ponto de arrebentar. Eu não tinha roupa nenhuma, e estávamos a caminho da igreja onde Rose Kennedy iria nos encontrar. Bobby ainda tentou me emprestar uma calça, mas ficou pequena demais. Não consegui sequer fazê-la passar pelas coxas. Então tive que ir à igreja de short, feito um menininho. Foi muito constrangedor – o que, naturalmente, era o objetivo. Os primos todos se esbaldaram de rir. “Hilário! Olhem a calça dele! Olhem a camisa dele!”
Voltamos para tomar o café da manhã na casa. Tive uma pequena oportunidade para me recompor. A propriedade dos Kennedy consistia em um grupo de casas de dois andares no meio de amplos gramados à beira-mar, bem pitoresca. Rose tinha sua própria casa, assim como cada um dos filhos. Eu estava hospedado na propriedade dos Shriver, porque Maria e Caroline tinham decidido que eu seria um convidado principalmente de Maria.
Ao longo do dia, os adultos se reuniam numa casa ou em outra para tomar café, almoçar, tomar um drinque e assim por diante. A informação de que eu não iria precisar de roupas elegantes era uma mentira deslavada, pois todos os homens se encontravam para os drinques de calça e blazer branco – e eu ali, de short. Fiz o melhor que pude, porém, e Maria e Caroline me apresentaram aos outros.
Rose apareceu para me conhecer. Tinha ficado muito curiosa em relação àquele rapaz do mundo dos músculos e começou a me fazer perguntas sobre exercícios. “As crianças da nossa família não se exercitam o suficiente e isso me preocupa. Pode nos mostrar uns exercícios agora? Preciso fazer alguns para minha barriga.” Rose tinha quase 90 anos na época. Em pouco tempo, as crianças pequenas e até mesmo alguns dos pais estavam fazendo vários tipos de abdominais. Foi engraçadíssimo.
Mas ainda havia muito a entender ali. Por que aquela propriedade familiar coletiva? Por que todas aquelas casas juntas? Era fascinante ver como os Kennedy circulavam pelas propriedades uns dos outros: “Hoje vamos tomar um drinque na casa de Teddy, depois jantar na de Pat, e amanhã vamos tomar café com Eunice e Sarge”, e assim por diante.
Supercompetitivos entre si, os primos quiseram me testar para ver se eu tinha espírito esportivo. Entre outras coisas, amarraram-me a uma corda e me arrastaram atrás do veleiro, por exemplo. No entanto, sob a liderança do mais velho, Joe Kennedy II, eles eram também encantadores. Quando estavam todos se preparando para a habitual partida de touch football, uma variante do futebol americano, no gramado da avó, Joe me perguntou:
– Você joga?
– Nunca toquei numa bola de futebol americano – respondi.
– Reparei ontem que você apresentou Pelé como se o conhecesse muito bem, então imagino que tenha mais familiaridade com o futebol de campo.
– É.
Então, nesse dia, Joe fez todos jogarem futebol. Foi um daqueles pequenos gestos que nunca se esquece. Primogênito de Robert F. Kennedy, Joe tinha a reputação de ser um rapaz difícil, dado a acessos de raiva e gritarias. Nesse dia, porém, vi quanto ele era classudo e compreensivo. Quis saber o que eu fazia, em que consistia meu treino, e perguntou sobre o lugar de onde eu vinha, a Áustria. O fato de ele ser mais ou menos da minha idade também ajudou – tinha cinco anos a menos que eu –, e Joe se identificou mais comigo do que os outros. Quando uma pessoa me trata com esse tipo de consideração, eu faço tudo o que puder por ela pelo resto da vida.
Mais ou menos na hora do pôr do sol, Maria e eu acompanhamos a avó dela em um passeio. Rose fez perguntas de gramática para a neta, como para se certificar de que os estudos universitários dela estavam indo bem: “Qual é o certo, para eu fazer ou para mim fazer?” Então começou a usar o alemão comigo e explicou que quando criança havia frequentado uma escola de freiras na Holanda, onde aprendeu aquele idioma como língua estrangeira. Rose falou com desenvoltura sobre Beethoven, Bach e Mozart. Contou-nos que adorava óperas e sinfonias e que tocava piano desde pequena. Foi muito interessante estar assim tão próximo da matriarca dos Kennedy – e da história sobre a qual eu tanto ouvira falar.
Mais tarde nesse dia, tive que ir embora. Maria me acompanhou ao aeroporto, e estávamos conversando perto dos guichês quando lembrei que não tinha dinheiro algum. Ela teve que fazer um cheque para pagar minha passagem. Ter que pedir dinheiro emprestado a uma garota de 20 anos me fez ficar vermelho igual a um tomate, tamanho meu constrangimento. Sempre quis ganhar meu próprio dinheiro justamente para nunca ter que pedir doações ou empréstimos. A primeira coisa que fiz ao chegar a Los Angeles foi falar com Ronda: “Faça um cheque agora mesmo e o mande para Maria, porque ela me emprestou 60 dólares. Tenho que devolver o dinheiro o mais rápido possível.” Mandei o cheque junto com um cartão agradecendo a gentileza dela.
Maria e eu não tornamos a nos falar até perto do Dia das Bruxas. Eu agora estava fazendo uma turnê promocional do meu novo livro, Arnold: The Education of a Bodybuilder (Arnold – A educação de um fisiculturista), misto de relato pessoal e introdução à musculação que assinei junto com um escritor e fotógrafo chamado Douglas Kent Hall depois que me aposentei das competições. O editor – Dan Green, da Simon & Schuster – era fascinado por fisiculturismo, e a ideia do projeto tinha sido sua. Quando me reuni com ele para discutir o plano de marketing do livro, ele se mostrou muito animado.