Ideias ruins o deixavam realmente irritado, sobretudo quando diziam respeito ao roteiro. Um belo dia, decidi que O exterminador do futuro não tinha momentos engraçados suficientes. Há uma cena em que o ciborgue entra em uma casa e passa em frente à geladeira. Então pensei que talvez a porta da geladeira pudesse estar aberta, ou então ele poderia abri-la. Veria cervejas lá dentro, ficaria intrigado pensando o que era aquilo, beberia uma e o álcool lhe subiria à cabeça, fazendo-o se comportar feito um bobo por alguns segundos. Jim me interrompeu antes mesmo de eu terminar. “Arnold, ele é uma máquina, não um ser humano”, disse ele. “Não é o E.T. Não pode ficar bêbado!”
Nosso maior desacordo foi em relação à famosa frase “I’ll be back” (que foi traduzida como “Eu voltarei” na versão em português). Essa é a fala do Exterminador logo antes de destruir a delegacia. A cena levou muito tempo para ser filmada, porque eu fiquei insistindo em dizer “I will be back”. Eu achava que a frase fosse soar mais mecânica e ameaçadora sem a contração.
– Se eu disser I’ll fica muito feminino – reclamei, repetindo a contração para Jim poder escutar o problema. – I’ll. I’ll. I’ll. Assim não me soa másculo.
Ele me olhou como se eu tivesse perdido a razão.
– Vamos manter I’ll – sentenciou. Só que eu ainda não estava pronto para aceitar isso, então continuamos a debater o assunto. No final, Jim começou a gritar: – Olhe aqui, confie em mim e pronto, tá bom? Eu não ensino você a atuar, e você não me ensina a escrever.
E filmamos a cena como estava escrita no roteiro. A verdade era que, mesmo após tantos anos falando inglês, eu ainda não entendia muito bem as contrações. A lição que aprendi, porém, foi que roteiristas nunca mudam nada. Jim não estava filmando o roteiro de outra pessoa: foi ele quem escrevera aquele texto. Ele era ainda pior que Milius. Não aceitava mudar sequer um apóstrofo.
NO VERÃO DE 1984, QUANDO Conan, o destruidor estreou nos cinemas, me dediquei totalmente a promover o filme. Participei de todos os programas de entrevistas nacionais e regionais que aceitaram me receber, começando pelo Late Night with David Letterman, e dei entrevistas aos maiores jornais e revistas do país, e até aos menos importantes. Tive que depender do pessoal de relações públicas para agendar aparições no exterior, muito embora 50 milhões de dólares da bilheteria do primeiro Conan – ou seja, mais da metade – tivessem sido arrecadados fora dos Estados Unidos. Estava decidido a fazer tudo o que pudesse para transformar meu primeiro papel de 1 milhão de dólares num sucesso.
No fim das contas, o segundo filme acabou superando a arrecadação de Conan, o bárbaro, rompendo a marca dos 100 milhões de dólares em receitas no mundo inteiro. Mas o que foi bom para minha reputação não foi tão bom assim para a série. Nos Estados Unidos, Conan, o destruidor foi exibido em menos salas e arrecadou 31 milhões, 23% a menos que o primeiro. Nossos temores haviam se concretizado. Ao repaginar Conan como o que o crítico de cinema Roger Ebert batizou alegremente de “um simpático bárbaro família”, o estúdio afastou parte de nosso público principal.
Minha sensação era que Conan já não me interessava mais. A franquia havia chegado ao fim da estrada. Quando voltei das turnês publicitárias, tornei a me encontrar com Dino de Laurentiis e lhe disse de uma vez por todas que não queria mais fazer filmes pré-históricos, só contemporâneos. Na realidade, ele também havia perdido o interesse por Conan. Em vez de me pagar milhões por novas continuações, preferia que eu fizesse um filme de ação para ele, embora ainda não tivesse um roteiro. Sendo assim, eu por enquanto estava livre para fazer mais projetos como O exterminador do futuro.
Foi tudo muito amigável, e exatamente como tínhamos conversado no outono anterior – só que, como Dino era Dino, tinha um favor a me pedir antes que eu aposentasse de vez a espada. “Por que você não faz uma participação especial?”, e me entregou um roteiro chamado Guerreiros de fogo.
Sonja, a protagonista da história, era a versão feminina de Conan nos quadrinhos e romances de fantasia: uma guerreira querendo vingar o assassinato dos pais que rouba tesouros e talismãs mágicos e enfrenta feiticeiros e monstros malvados. O papel que Dino tinha em mente para mim não era Conan, mas Lorde Kalidor, aliado de Sonja. Grande parte da trama gira em torno do desejo que ele sente por ela e da virgindade da moça. “Nenhum homem jamais me terá a não ser que me derrote em uma luta justa”, declara ela.
Maria leu o roteiro e disse: “Não faça esse filme. É um lixo.” Eu concordava, mas sentia que estava devendo um favor a Dino. Assim, no final de outubro, logo antes da data marcada para a estreia de O exterminador do futuro, peguei um avião para Roma, onde as filmagens de Guerreiros de fogo já haviam começado.
Dino passara mais de um ano procurando uma atriz que se parecesse suficientemente com uma amazona para interpretar Sonja. Acabou encontrando Brigitte Nielsen na capa de uma revista: uma modelo dinamarquesa de 21 anos e 1,86 metro, com cabelos ruivos flamejantes e a reputação de ser da pá virada. Ela nunca havia atuado, mas Dino simplesmente pagou sua passagem até Roma, fez um teste de câmera com ela e a contratou para o papel principal. Então, para fazer o filme acontecer, recrutou veteranos da equipe de Conan: Raffaella na produção, Richard Fleischer na direção e Sandahl Bergman como a traiçoeira rainha Gedren de Berkubane.
No fim das contas, minha suposta participação especial exigiu quatro semanas inteiras no set. Eles filmaram todas as cenas de Lorde Kalidor com três câmeras, depois usaram as imagens extras na sala de montagem para esticar o tempo em tela do personagem. Assim, em vez de uma pequena aparição, acabei virando um dos principais personagens do filme. No cartaz de Guerreiros de fogo, minha imagem era duas vezes maior que a de Brigitte. Eu me senti ludibriado. Era o jeito que Dino havia encontrado de usar minha imagem para vender seu filme, por isso me recusei a participar de qualquer promoção em julho do ano seguinte, quando Guerreiros de fogo estreou.
O filme ficou tão ruim que foi indicado a três Framboesas de Ouro, espécie de Oscar às avessas para filmes ruins: Pior Atriz, Pior Atriz Coadjuvante e Pior Atriz Estreante. Brigitte acabou “vencendo” na categoria Pior Atriz Estreante. Péssimos filmes às vezes podem ser sucessos de bilheteria, mas Guerreiros de fogo era ruim demais até mesmo para ser kitsch e acabou sendo um fracasso. Tentei manter distância e brinquei que estava aliviado por ter sobrevivido.
Para mim, a maior complicação de Guerreiros de fogo foi a própria Sonja. Eu me envolvi com Brigitte Nielsen e tivemos um tórrido caso no set. Gitte, como todos a chamavam, tinha uma personalidade alegre e divertida aliada a uma enorme carência. Depois das filmagens, passamos umas duas semanas viajando pela Europa antes de seguir cada qual o seu caminho. Voltei para casa imaginando que nosso romance tivesse acabado.
Em janeiro, porém, ela foi a Los Angeles fazer a dublagem do filme – regravar os diálogos para que ficassem mais nítidos – e disse que queria um relacionamento firme comigo. Tivemos que ter uma conversa séria.