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A vida na academia logo passou a ocupar todo o meu tempo. Eu só pensava em treinar. Houve um domingo em que encontrei o estádio trancado, então arrombei a porta e malhei lá dentro, no frio congelante e sem calefação. Tive que enrolar as mãos em toalhas para que não grudassem nas barras de metal. A cada semana, eu constatava meu progresso no peso que conseguia levantar, no número de repetições que meus músculos aguentavam, no formato do meu corpo e na massa e no peso totais. Eu me tornei um membro fixo da equipe. Quase não cabia em mim de tanto orgulho: eu, o pequeno Arnold Schwarzenegger, frequentando a mesma academia que o Mister Áustria, o grande Kurt Marnul.

Já tinha experimentado vários outros esportes, mas a reação do meu corpo à musculação deixou claro na hora que era nessa modalidade que eu tinha o maior potencial e poderia me destacar. Não saberia dizer o que me impulsionava, mas malhar parecia ser algo que eu nascera para fazer, e eu pressentia que aquilo poderia ser meu passaporte para sair de Thal. “Kurt Marnul conseguiu vencer o Mister Áustria”, eu pensava, “e ele já me disse que eu também poderia se treinasse bastante, então é isso que eu vou fazer.” Pensar assim transformava as horas que eu passava levantando toneladas de aço e ferro em uma verdadeira alegria. Cada série extenuante, cada repetição a mais eram passos em direção ao meu objetivo de vencer o Mister Áustria e participar do concurso Mister Europa. Então, em novembro, comprei o número mais recente da revista Muscle Builder na loja de departamentos de Graz. Na capa estava Reg Park, Mister Universo. Ele posava fantasiado de Hércules, apenas com um tapa-sexo, e percebi com espanto que aquele era o protagonista do filme que eu tanto amara no verão. Dentro da revista havia fotos de Reg posando, malhando, conquistando o título de Mister Universo pelo segundo ano seguido, apertando a mão de Joe Weider e conversando em Muscle Beach com o lendário Steve Reeves, ex-Mister Universo que também já fizera o papel de Hércules no cinema.

Mal pude esperar para encontrar Mui e descobrir o que dizia a matéria. O texto contava toda a história da vida de Reg, da infância pobre em Leeds, na Inglaterra, até a conquista do título de Mister Universo, o convite para ir aos Estados Unidos como campeão de fisiculturismo, a ida a Roma para interpretar Hércules no cinema e o casamento com uma beldade da África do Sul, onde ele agora morava quando não estava treinando em Muscle Beach.

Essa matéria consolidou uma nova visão para mim: eu poderia me tornar um novo Reg Park. Todos os meus sonhos de repente se conectaram e fizeram sentido. Eu havia encontrado um jeito de ir para os Estados Unidos: o fisiculturismo! E havia também achado um jeito de entrar para o cinema. Seria isso que faria todas as pessoas do mundo me conhecerem. O cinema me traria dinheiro – eu tinha certeza de que Reg Park era milionário – e as mais belas garotas, o que era um aspecto muito importante.

Nas semanas seguintes, fui refinando essa visão até torná-la bem específica. Eu iria tentar conquistar o título de Mister Universo, quebrar recordes em levantamento de peso, me mudar para Hollywood e ser igual a Reg Park. A visão se tornou tão nítida em minha mente que fui tomado pela sensação de que isso tinha que acontecer. Não havia opção: era isso ou nada. Minha mãe percebeu na hora que alguma coisa estava diferente. Passei a chegar em casa com um enorme sorriso estampado no rosto. Contei a ela que estava treinando, e ela viu que ficar mais forte me deixava feliz.

Com o passar dos meses, porém, ela começou a ficar preocupada com minha obsessão. Quando a primavera chegou, eu havia pregado fotos de homens musculosos por toda a parede acima da minha cama. Eram boxeadores, lutadores profissionais, halterofilistas e praticantes de levantamento de peso. Mas a maioria das imagens era de fisiculturistas, principalmente Reg Park e Steve Reeves. Eu tinha orgulho da minha parede. Isso foi antes do advento das copiadoras, de modo que eu juntava as imagens de revistas que queria e as levava para um estúdio, onde elas eram fotografadas e reproduzidas em 20 × 25 centímetros. Eu havia comprado um fundo de feltro, mandara recortá-lo e era nele que colava as fotografias para pregá-las na parede. O modo como arrumei as fotos ficou muito bonito. Mas isso deixou minha mãe bem preocupada.

Finalmente, um dia ela resolveu procurar a ajuda de um profissional. Quando o médico passou pela rua em sua ronda habitual, ela o chamou.

– Quero que o senhor veja uma coisa – falou e levou-o até meu quarto no andar de cima.

Eu estava na sala fazendo o dever de casa, mas mesmo assim pude ouvir a maior parte da conversa.

– Doutor – dizia minha mãe –, todos os outros meninos amigos de Arnold têm fotos de garotas penduradas na parede, é o que eu vejo quando vou às suas casas. São cartazes, fotos de revistas, imagens coloridas de garotas. E olhe só o que ele tem: homens nus!

Frau Schwarzenegger – respondeu o médico –, não há nada de errado aqui. Meninos sempre precisam de alguma inspiração. Eles se espelham no pai, e muitas vezes isso não basta porque é o pai, então eles começam a prestar atenção em outros homens. Na verdade isso é bom. Não há nada com que se preocupar. – Ele foi embora, minha mãe enxugou as lágrimas dos olhos e fingiu que nada tinha acontecido. Depois disso, ela passou a dizer às amigas: “Meu filho tem fotos de caras fortões e atletas e fica tão animado quando olha para eles que agora treina todos os dias. Arnold, diga a elas quanto peso você está levantando.” É claro que eu também tinha começado a ter sucesso com as garotas, mas isso eu não podia compartilhar com minha mãe.

Na primavera daquele ano, ela descobriu quanto as coisas haviam mudado. Eu acabara de conhecer uma garota que era dois anos mais velha e gostava de atividades ao ar livre.

– Eu também gosto de acampar! – falei. – Tem um lugar bem legal na fazenda do nosso vizinho, antes da nossa casa. Por que você não traz sua barraca? – A garota apareceu na tarde seguinte e nos divertimos montando uma pequena e linda barraca. Algumas das crianças pequenas do nosso bairro ajudaram a fincar as estacas. A barraca tinha o tamanho perfeito para duas pessoas, e a abertura fechava com um zíper. Depois que as crianças foram embora, nós dois entramos na barraca e começamos a dar uns amassos. A garota já tinha tirado a blusa quando de repente ouvi o barulho do zíper e me virei bem a tempo de ver a cabeça da minha mãe se espichar para dentro da barraca. Ela armou um escarcéu, chamou a garota de vagabunda e puta e subiu a ladeira de volta para nossa casa soltando fogo pelas ventas. A pobre menina ficou arrasada. Eu a ajudei a desmontar a barraca e ela foi embora correndo.

Em casa, minha mãe e eu brigamos.

– Que história foi essa?! – gritei. – Um dia você conta para o médico que eu tenho fotos de homens e agora está preocupada porque tenho uma namorada. Não entendi. É isso que os rapazes fazem.

– Não, não, não. Na minha casa, não.

Minha mãe estava tendo que se adaptar a um filho totalmente novo. Mas eu fiquei muito bravo. Só queria viver minha vida! No sábado seguinte, fui à cidade e fiz as pazes com a garota – os pais dela estavam viajando.

O ESTÁGIO ERA UMA PARTE IMPORTANTE DA FORMAÇÃO na escola profissionalizante onde comecei a estudar no outono de 1962. De manhã tínhamos aula e à tarde nos espalhávamos por Graz, cada qual para o seu emprego. Era bem melhor do que passar o dia inteiro sentado em sala de aula. Meus pais sabiam que eu era bom em matemática e gostava de brincar fazendo cálculos de cabeça, de modo que me colocaram em um programa de administração e comércio, em vez de encanamento, carpintaria ou algum outro ofício desse tipo.