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— Aviendha? Venha cá.

Aviendha estava acocorada, inclinada com os braços ao redor dos joelhos, encarando o chão, desconsolada. Levantou-se devagar. Se Egwene não conhecesse bem a amiga, diria que ela estava com medo. Aviendha foi se arrastando até as Sábias e deitou a bolsa e as tapeçarias no chão, a seus pés.

— Está na hora — disse Bair, com delicadeza. Ainda assim, não havia condescendência nos olhos azul-claros. — Você correu com as lanças o quanto pôde. Mais do que deveria.

Aviendha ergueu a cabeça, desafiadora.

— Sou uma Donzela da Lança. Não quero ser Sábia. Não serei!

Os rostos das Sábias endureceram. Egwene lembrou-se do Círculo das Mulheres, em casa, confrontando uma mulher que se metia em alguma confusão.

— Você já foi tratada com mais gentileza do que se fazia no meu tempo — disse Amys, com a voz dura como pedra. — Eu também recusei meu chamado. Minhas irmãs de lança quebraram minhas lanças diante de meus olhos. Levaram-me até Bair e Coedelin com mãos e pés amarrados, completamente nua.

— E uma bonequinha linda enfiada debaixo do braço — completou Bair, em um tom seco — para lembrar o quanto estava sendo infantil. Se bem me lembro, você fugiu nove vezes no primeiro mês.

Amys assentiu, de cara feia.

— E a cada vez me fizeram chorar feito uma garotinha. No segundo mês, fugi apenas cinco. Pensava que tinha tanta força e dureza quanto uma mulher era capaz de ter. Mas não era esperta, levei meio ano para aprender que você, Bair, era mais forte e mais dura do que eu jamais poderia ser. Por fim, aprendi qual era meu dever, minha obrigação com os outros. Assim como você aprenderá, Aviendha. Você não é criança. Já está na hora deixar de lado as bonecas e as lanças e se tornar a mulher que está destinada a ser.

De repente, Egwene soube por que sentira uma afinidade tão grande com Aviendha desde a primeira vez que a vira, soube por que Amys e as outras queriam que ela se tornasse Sábia. Aviendha podia canalizar. Assim como ela própria, Elayne e Nynaeve — e até Moiraine — aquela Aiel era uma das raras mulheres que não apenas podiam ser treinadas a canalizar, mas que nasciam com a habilidade, de modo que um dia tocavam a Fonte Verdadeira, sabendo ou não o que estavam fazendo. O rosto de Moiraine estava tranquilo e plácido, mas Egwene viu a confirmação em seus olhos. A Aes Sedai sem dúvida soubera desde a primeira vez que se aproximou da Aiel. Egwene percebeu que sentia aquela mesma afinidade com Amys e Melaine, mas não com Bair e Seana. Apenas as duas primeiras eram capazes de canalizar, tinha certeza. E agora sentia o mesmo com Moiraine. Era a primeira vez que sentia uma coisa dessas. A Aes Sedai era uma mulher distante.

Algumas das Sábias, pelo menos, pareciam ver algo mais no rosto de Moiraine.

— Você pretendia levá-la para sua Torre Branca — disse Bair — para torná-la uma de vocês. Ela é Aiel, Aes Sedai.

— Com o treinamento correto, pode se tornar muito forte — retorquiu Moiraine. — Tanto quanto Egwene. Na Torre, ela pode alcançar essa força.

— Também podemos treiná-la, Aes Sedai. — A voz de Melaine era bastante suave, mas havia um toque de desprezo nos olhos verdes e resolutos. — E melhor. Já conversei com Aes Sedai. Vocês mimam as mulheres, na Torre. A Terra da Trindade não é lugar para isso. Conosco, Aviendha logo aprenderá do que é capaz. Com vocês, passaria anos na fase das brincadeiras.

Egwene lançou a Aviendha um olhar preocupado. A jovem encarava os próprios pés, a rebeldia desaparecera. Se as Sábias achavam que as mulheres treinadas na Torre era mimadas… Trabalhara mais duro e fora mais disciplinada como noviça do que em toda a vida. Sentiu uma pontada genuína de compaixão pela Aiel.

Amys estendeu as mãos, e Aviendha, relutante, entregou as lanças e o broquel, encolhendo-se quando a Sábia os jogou no chão com violência. Bem devagar, Aviendha foi deslizando o estojo do arco das costas e o entregou, depois desafivelou o cinto que continha a aljava e a faca embainhada. Amys pegou cada objeto ofertado e atirou no chão, como lixo. A cada vez, Aviendha estremecia. Uma lágrima tremulava no canto do olho verde-azulado.

— Precisa tratá-la desse jeito? — inquiriu Egwene, irritada. Amys e as outras a olharam, impassíveis, mas ela não seria intimidada. — Estão tratando coisas importantes para ela como se fossem lixo.

— Ela precisa vê-las como lixo — disse Seana. — Quando retornar, se retornar, vai queimá-las e espalhar as cinzas. O metal, dará para um ferreiro fazer objetos simples, mas não armas. Nem mesmo uma faca de cozinha. Fivelas, panelas, quebra-cabeças para crianças. Coisas que ela mesma vai passar adiante, com as próprias mãos, depois de prontas.

— A Terra da Trindade não é delicada, Aes Sedai — disse Bair. — Aqui, a delicadeza definha.

— O cadin’sor, Aviendha. — Amys apontou para as armas descartadas. — Suas roupas novas aguardarão seu retorno.

Aviendha se despiu com movimentos mecânicos, jogando casaco, calças, botas macias, tudo na pilha. Então parou, nua, sem mexer um dedo sequer, embora Egwene sentisse que os próprios pés estavam prestes a explodir em bolhas dentro dos sapatos. Lembrou-se de quando assistira à incineração das roupas que usara para ir à Torre Branca, rompendo os elos com sua vida pregressa, mas não fora assim, desse jeito. Não tão duro.

Quando Aviendha começou a juntar o saco e as tapeçarias de parede à pilha, Seana os tomou de sua mão.

— Isso você pode pegar de volta. Se retornar. Se não, irão para a sua família, como recordação.

Aviendha assentiu. Não parecia com medo. Parecia relutante, irada, até mesmo emburrada, mas não com medo.

— Em Rhuidean — disse Amys — você encontrará três aros, dispostos da seguinte forma. — Ela desenhou três linhas no ar, que se uniam ao centro. — Entre em qualquer um. Verá seu futuro diante de si, e de novo, e de novo, com variações. Sua vida não será toda guiada por eles, pois se juntam e desvanecem como histórias ouvidas há muito tempo, e é melhor assim. Mas você se lembrará o bastante para saber de algumas coisas necessárias a você, por mais que as menospreze, e outras desnecessárias, por serem esperanças alimentadas. Isso é o começo, para ser considerada sábia. Algumas mulheres jamais retornam dos aros, talvez não sejam capazes de encarar o futuro. Algumas que sobrevivem aos aros não sobrevivem à segunda viagem a Rhuidean, ao coração. Você não está abrindo mão de uma vida difícil e perigosa por uma mais branda, e sim por uma ainda mais difícil e mais perigosa.

Um ter’angreal. Amys estava descrevendo um ter’angreal. Que tipo de lugar era essa Rhuidean? Egwene percebeu que queria ir até lá para descobrir. Era bobagem. Não estava ali para correr riscos desnecessários com ter’angreal sobre os quais nada sabia.

Melaine tomou o queixo de Aviendha nas mãos e virou o rosto da jovem para si.

— Você tem a força — disse, com uma convicção tranquila. — Suas armas agora são a mente forte e o coração forte, mas você deve manejá-los com a segurança com que sempre manejou a lança. Lembre-se delas, use-as, e serão suficientes para você.

Egwene estava surpresa. Das quatro, a mulher de cabelos dourados seria a última que imaginaria ser capaz de demonstrar compaixão.

Aviendha assentiu e até conseguiu abrir um sorriso.

— Vou chegar em Rhuidean antes desses homens. Eles não sabem correr.

Cada uma das Sábias beijou-a com delicadeza, uma vez em cada face, e murmurou:

— Volte para nós.

Egwene apertou a mão de Aviendha e foi correspondida. Então a Aiel desceu a montanha aos saltos. Parecia que iria mesmo alcançar Rand e Mat. Egwene a observou ir, preocupada. Era como ser elevada a Aceita, pelo que via, porém sem qualquer treinamento como noviça, sem ninguém para consolá-la no fim. Como teria sido ser elevada a Aceita em seu primeiro dia na Torre? Achava que teria enlouquecido. Fora assim com Nynaeve, por conta da força da mulher. Achava que ao menos um pouco do desprezo da amiga pelas Aes Sedai vinha dessa experiência. Volte para nós, pensou. Seja firme.