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Puxou o lenço da cabeça e enxugou o suor do rosto, depois amarrou-o de volta. O calor e o sol incessante nos olhos estavam começando a irritá-lo. Será que não havia uma única sombra naquela terra inteira? O suor fazia as feridas arderem. Ele recusara a Cura na noite anterior, quando Moiraine o acordara depois de ele finalmente conseguir pegar no sono. Uns poucos cortes eram um preço baixo para não ter o Poder usado em si, e o chá nojento das Sábias dera um alívio na dor de cabeça. Bem, de certo modo. Não acreditava que Moiraine fosse capaz de fazer algo a respeito da outra coisa que o afligia, e também não tinha intenção de contar a ela até que ele mesmo tivesse compreendido. Se é que contaria depois. Não queria nem pensar a respeito.

Moiraine e as Sábias o observavam. Observavam Rand, na verdade, mas a sensação era a mesma. Foi uma surpresa notar que a de cabelos dourados, Melaine, montara em Aldieb atrás da Aes Sedai e cavalgava desajeitada, segurando Moiraine pela cintura, enquanto as duas conversavam. Ele não sabia que os Aiel cavalgavam. Uma mulher muito bonita, Melaine, com aqueles olhos verdes impetuosos. Exceto, naturalmente, pelo fato de que ela conseguia canalizar. Só mesmo um completo idiota para se meter com uma dessas. Remexendo-se na sela de Pips, lembrou a si mesmo que o que os Aiel faziam não era de sua conta.

Estive em Rhuidean. Fiz o que aquela gente traiçoeira disse que eu tinha de fazer. E o que ganhara com aquilo? Essa porcaria de lança, um medalhão de prata e… Eu podia ir embora agora. Se tiver algum bom senso, eu vou.

Ele poderia ir. Tentar encontrar sozinho a saída do Deserto, antes que morresse de sede ou insolação. Poderia, se Rand ainda não o estivesse puxando, segurando. A maneira mais fácil de descobrir seria simplesmente tentar ir embora. Encarando a paisagem sombria, ele fez uma careta. Um vento se elevou — parecia soprar de um forno superaquecido — e pequenos torvelinhos afunilados de poeira amarela subiram do chão rachado. A névoa quente fazia as montanhas ao longe cintilarem. Talvez fosse melhor ficar um pouquinho mais.

Uma das Donzelas que saíra como batedora voltou correndo e inclinou-se ao lado de Rhuarc, falando apenas em seu ouvido. A mulher abriu um sorriso para Mat, ao terminar, e ele se ocupou em puxar um carrapicho da crina de Pips. Lembrava-se muito bem dela, uma Donzela de cabelos ruivos chamada Dorindha, mais ou menos da idade de Egwene. Dorindha fora uma das que tentara convencê-lo a jogar O Beijo da Donzela. Cobrara a primeira prenda. Não que ele não quisesse cruzar os olhos com os da moça, e não que não pudesse, mas era importante tirar os carrapichos do cavalo, e tudo o mais.

— Mascates — anunciou Rhuarc, quando Dorindha voltou feito uma flecha por onde viera. — Carroções de mascates vindo nesta direção. — Ele não parecia satisfeito.

Mat, no entanto, se viu bastante animado. Um mascate poderia ser muito bem o que ele precisava. Se o sujeito conhecia o caminho de entrada, conhecia o de saída. Ele se perguntou se Rand suspeitava de suas ideias. O amigo estava tão impassível quanto qualquer Aiel.

Os Aiel apertaram um pouco o passo — o povo de Couladin seguiu o ritmo dos Jindo e do grupo das Sábias sem hesitar; decerto seus batedores também tinham levado a notícia. Todos caminhavam rápido o bastante para que os cavalos tivessem de manter um ritmo ligeiro. O sol não incomodava os Aiel, nem mesmo os gai’shain de robes brancos. Eles deslizavam pelo solo rachado.

A menos de duas milhas, os carroções surgiram em seu campo de visão. Dezoito deles, enfileirados. Todos pareciam exibir os sinais de desgaste de uma viagem difícil, com as rodas reserva surradas em todos os pontos. Apesar da camada de poeira amarela, os dois primeiros pareciam caixas brancas sobre rodas, ou mesmo casinhas, com degraus de madeira nos fundos e uma chaminé de metal projetando-se do teto. Os três últimos, puxados por engates de vinte mulas, pareciam apenas imensos barris, também brancos, decerto cheios d’água. Os que iam no meio teriam se passado por carroções de mascates em Dois Rios, com rodas raiadas altas e pesadas e amontoados de panelas e outras coisas de metal tilintando nas grandes redes presas às coberturas de lona comprida.

Os condutores dos carroções frearam as rédeas assim que avistaram os Aiel, esperando que se aproximassem. Um homem pesado de casaco cinza-claro e chapéu escuro de aba larga desceu dos fundos do primeiro carroção e ficou observando, de vez em quando tirando o chapéu para secar a testa com um grande lenço branco. Se estava nervoso, já que encarava uns mil e quinhentos Aiel deslizando em sua direção, Mat não o culpava. O mais estranho eram as expressões nos rostos dos Aiel mais perto de Mat. Rhuarc, trotando adiante do cavalo de Rand, fechara a cara e estava com o rosto soturno, e Heirn tinha uma expressão capaz de detonar pedregulhos.

— Não entendo — comentou Mat. — Parece que vocês vão matar alguém. — Aquilo sem dúvida era o fim de todas as esperanças. — Pensei que houvesse três tipos de gente que vocês Aiel deixavam entrar aqui no Deserto: mascates, menestréis e o Povo Errante.

— Mascates e menestréis são bem-vindos — retrucou Heirn, em um tom áspero.

Se aquilo eram boas-vindas, Mat não queria ver os Aiel quando não estavam sendo hospitaleiros.

— E o Povo Errante? — perguntou, curioso. Quando Heirn manteve o silêncio, ele acrescentou: — Latoeiros? Os Tuatha’an?

O rosto do chefe de ramo ficou ainda mais rígido antes de ele voltar o olhar outra vez para os carroções. Aviendha fuzilou Mat com os olhos, como se ele fosse um idiota.

Rand aproximou Jeade’en de Pips.

— Se eu fosse você, não mencionaria os latoeiros perto dos Aiel — disse baixinho. — É… um assunto delicado.

— Se você diz. — Por que latoeiros eram um assunto delicado? — Para mim, parece que eles já estão bastante irritados com esse mascate. Mascate! Eu me lembro de mercadores que apareciam em Campo de Emond com menos carroções.

— Ele entrou no Deserto. — Rand deu uma risadinha. Jeade’en jogou a cabeça para trás e deu uns passos bambos. — Será que vai sair?

O sorriso de Rand não chegava aos olhos. Às vezes, Mat quase desejava que o amigo decidisse de uma vez se estava ou não louco e acabasse logo com tudo. Quase.

A trezentas passadas dos carroções, Rhuarc fez um gesto para que o grupo parasse, e ele e Heirn prosseguiram sozinhos. Pelo menos, aquela parecia ter sido a intenção do homem, mas Rand cravou os calcanhares no garanhão sarapintado e foi atrás dos dois, e a centena de inevitáveis guarda-costas Jindo o acompanhou. E Aviendha, naturalmente, que estava colada em Rand como se estivesse amarrada à sela de Jeade’en. Mat foi cavalgando com os outros. Se Rhuarc mandasse o camarada fazer as malas, não pretendia perder a chance de ir junto.

Couladin veio trotando do grupo dos Shaido. Sozinho. Talvez tivesse a intenção de fazer o mesmo que Rhuarc e Heirn, mas Mat suspeitou que o homem chamava a atenção para o fato de que ia sozinho aonde Rand precisava de cem guardas. A princípio, pareceu que Moiraine também se aproximaria, mas ela e as Sábias trocaram algumas palavras e ficaram onde estavam. Só que observavam, atentas. A Aes Sedai desceu da montaria, mexendo em um objeto pequeno e reluzente, e Egwene e as Sábias se agruparam à volta dela.

Ao chegar perto, Mat viu que, apesar de ficar secando o rosto, o homem grande de casaco cinza não parecia incomodado, embora tivesse se sobressaltado quando Donzelas surgiram do nada e rodearam os carroções. Os condutores, sujeitos de rostos duros e mais do que uma boa cota de cicatrizes e narizes quebrados, pareciam prontos para se esconder sob os assentos. Comparados aos lobos Aiel, eles não eram mais que cachorros de rua selvagens. O mascate se recuperou depressa. Não era gordo, apesar do tamanho. Todo aquele peso eram músculos. Rand e Mat, em cima dos cavalos, foram alvo de seus olhares curiosos, mas ele distinguiu Rhuarc logo de primeira. O nariz curvo e aquilino e os olhos escuros e oblíquos conferiam um ar predatório ao rosto quadrado e moreno do homem, que não se suavizou quando ele abriu um sorriso largo e deslizou da cabeça o chapéu de aba larga, em uma mesura.