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— Meu cavalo — retrucou Perrin, tentando se libertar. As duas agarravam com força as mangas de seu casaco; ele só conseguia balançar os braços para a frente e para trás. — Pelo amor da Luz, podem parar de me puxar e me deixar pegar meu cavalo? Me soltem.

Olhando para ele, Faile deu um suspiro e soltou-lhe o braço.

— Senhora al’Vere, a senhora poderia mandar selar e trazer o cavalo dele?

— Mas, minha querida, ele realmente precisa…

— Por gentileza, Senhora al’Vere — disse Faile, com firmeza. — E o meu também. — As duas mulheres se entreolharam como se ele não existisse. Por fim, a Senhora al’Vere assentiu.

Perrin franziu o cenho pelas costas da mulher enquanto ela corria pelo salão e desaparecia rumo à cozinha e ao estábulo. O que Faile dissera de diferente dele? Voltando a atenção para ela, ele disse:

— Por que foi que você mudou de ideia?

Enfiando a camisa dele para dentro da calça, ela resmungou, entre dentes. Sem dúvida Perrin não escutava tão bem a ponto de entender.

— Não é para eu falar, é? Quando ele estiver sendo teimoso demais para enxergar com clareza, eu devo guiá-lo com doçura e sorrisos, não é? — Ela lhe disparou um olhar que certamente não continha doçura alguma, depois abruptamente abriu um sorriso tão doce que ele quase deu para trás. — Meu querido — ela quase arrulhou, endireitando-lhe o casaco — o que quer que esteja acontecendo lá fora, espero muito que você permaneça em sua sela, e o mais longe dos Trollocs que puder. Ainda não está muito em condições de enfrentar um Trolloc, não é? Talvez amanhã. Por favor, lembre que você é um general, um líder, e um verdadeiro símbolo para o seu povo, assim como aquele estandarte lá fora. Se permanecer à vista do povo, vai dar uma injeção de ânimo em todo mundo. E é muito mais fácil enxergar o que precisa ser feito e dar ordens quando você mesmo não está no campo de batalha. — Ela pegou o cinto dele do chão e afivelou-o em sua cintura, ajeitando com cuidado o machado em seus quadris. E também piscou para ele! — Por favor, diga que vai fazer isso. Por favor?

Ela estava certa. Ele não duraria dois minutos diante de um Trolloc. Diante de um Desvanecido, era mais provável que durasse dois segundos. E, por mais que odiasse admitir, não duraria duas milhas na sela atrás de Loial e Gaul. Ogier estúpido. Você é um escritor, não um herói.

— Está bem — disse ele. Um impulso malicioso tomou conta de si. A forma como ela e a Senhora al’Vere estavam falando por cima dele e dando piscadelas como se ele fosse um imbecil. — Não consigo recusar nada quando você sorri assim, tão linda.

— Fico muito feliz. — Ainda sorrindo, ela alisou o casaco dele e removeu umas bolinhas que ele não conseguia ver. — Porque, se você recusar, e ainda conseguir sobreviver, vou fazer com você o mesmo que fez comigo naquele primeiro dia nos Caminhos. Acho que você ainda não está com força suficiente para me impedir. — Ela abriu aquele sorriso radiante para ele, todo doce e primaveril. — Está entendendo?

A contragosto, ele soltou uma risadinha.

— Parece que é melhor deixar que eles me matem. — Ela não pareceu achar graça.

Hu e Tad, os cavalariços desengonçados, levaram Galope e Andorinha logo depois que o casal saiu. Todos os outros estavam reunidos no extremo oposto da aldeia, para além do Campo, com suas ovelhas, vacas e gansos, e o estandarte vermelho e branco com a cabeça do lobo balançava ao sabor da brisa da manhã. Assim que ele e Faile montaram nos cavalos, os cavalariços saíram correndo pela mesma direção, sem dizer uma palavra.

O que quer que estivesse acontecendo, estava claro que não se tratava de um ataque. Ele via mulheres e crianças entre a multidão, e os gritos de “Trolloc” haviam se esvaído a um murmúrio, que ecoava feito o grasnido de gansos. Ele avançou devagar, tentando não balançar em cima da sela; Faile seguia bem perto com Andorinha, de olho nele. Se havia sido capaz de mudar de ideia uma vez sem motivo aparente, poderia fazê-lo de novo, e ele não queria discutir se deveria ou não estar ali.

A multidão balbuciante de fato parecia composta de toda a população de Campo de Emond, tanto aldeões quanto fazendeiros, todos espremidos, ombro com ombro, mas o grupo abriu caminho para ele e Faile ao reconhecê-lo. Perrin virou assunto do burburinho, em geral com o nome de Olhos-Dourados. Também pescou a palavra “Trollocs”, mas em um tom mais de fascinação do que de medo. De cima da sela de Galope ele tinha uma boa visão de suas cabeças.

A massa de gente aglomerada se estendia por todo o trecho depois das últimas casas até as sebes de estacas espinhosas. Os limites da floresta, quase seiscentos passos para além de um campo de tocos quase no nível do chão, estava silenciosa, sem homens com machados. Eles formavam um círculo de peitorais suados e desnudos em torno de Alanna, Verin e dois homens. Jon Thane, o moleiro, limpava uma mancha de sangue das costelas, com a lanterna apontada para o peito para enxergar o que as próprias mãos faziam. Alanna se empertigava diante do outro homem, um sujeito de cabelos grisalhos que Perrin não reconheceu e que pulou de pé e dançou um passinho, hesitante. Tanto ele quanto o moleiro encaravam as Aes Sedai com espanto.

Havia gente demais em torno das Aes Sedai para que o povo pudesse abrir espaço para Galope e Andorinha, mas havia uns espaços livres em volta de Ihvon e Tomas, um de cada lado de seus cavalos de batalha. O povo não queria chegar muito perto daqueles animais de olhos ferozes, ambos com cara de quem só estava aguardando uma oportunidade de pisotear e abocanhar.

Perrin conseguiu aproximar-se de Tomas sem muito esforço.

— O que foi que houve?

— Um Trolloc. Só um. — Apesar do tom displicente do Guardião grisalho, seus olhos escuros não pararam em Perrin e Faile, perscrutando com igual atenção Verin e a linha das árvores. — Eles não são muito espertos sozinhos. São safos, mas não espertos. O grupo cortando árvores o espantou antes que ele fizesse mais do que tirar um pouco de sangue.

Das árvores surgiram as duas mulheres Aiel, correndo, as cabeças envoltas em shoufas e véus de modo que ele não conseguia dizer quem era quem. Elas reduziram o passo e seguiram serpenteando entre as estacas pontudas, depois deslizaram com destreza pelo meio da multidão, e o povo foi abrindo caminho como pôde naquela balbúrdia. Quando chegaram perto de Faile, as mulheres já haviam tirado os véus, e ela se inclinou para escutá-las.

— Talvez uns quinhentos Trollocs — disse Bain — provavelmente não mais de uma ou duas milhas atrás de nós. — Sua voz era firme, mas os olhos azul-escuros cintilavam, ávidos. Os cinza de Chiad também.

— Como eu imaginei — disse Tomas, calmamente. — Aquele ali provavelmente se afastou do grupo, na esperança de arrumar algo para comer. O resto deve vir em breve. — As Donzelas assentiram.

Perrin apontou consternado para a multidão.

— Então essa gente não deveria estar aqui. Por que vocês não os afastaram?

Foi Ihvon, aproximando o cinzento do grupo, quem respondeu:

— O seu povo não está querendo escutar ninguém de fora, não quando estão com a atenção toda voltada para as Aes Sedai. Sugiro que veja o que pode fazer.

Perrin tinha certeza de que eles poderiam ter imposto algum tipo de ordem, se tivessem realmente tentado. Verin e Alanna sem dúvida poderiam. Então por que esperaram e deixaram a coisa na minha mão, se estavam prevendo Trollocs? Seria muito fácil pôr tudo na conta de um ta’veren — fácil e tolo. Ihvon e Tomas não deixariam Trollocs matarem o povo — nem Verin nem Alanna — enquanto ficavam esperando que um ta’veren lhes dissesse o que fazer. As Aes Sedai o estavam manipulando, colocando todos em risco, talvez até a si próprias. Mas com que objetivo? Ele e Faile se entreolharam, e ela assentiu sutilmente, como se soubesse o que ele estava pensando.