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Isendre apanhou a moeda e começou a manuseá-la, espiando o topo da encosta. Os outros também olhavam para lá, Kadere, Keille e Natael.

— Você pode vir — disse Rand. — Rhuarc, já não está na hora?

O chefe de clã olhou para trás.

— Está. Bem… — Atrás dele, flautas começaram a tocar uma melodia lenta e dançante. — Agora.

Uma cantoria uniu-se às flautas de pã. Os garotos Aiel paravam de cantar quando chegavam à idade adulta, exceto em certas ocasiões. Depois de botar as mãos na lança, um homem de Aiel entoava apenas canções de batalha e lamentos para os mortos. Sem dúvida havia muitas vozes de Donzelas naquela melodia bela e harmoniosa, mas vozes graves e masculinas as faziam desaparecer.

“Banhem as lanças — ao subir do sol. Banhem as lanças — ao cair do sol.”

Meia milha à direita e à esquerda surgiram os Taardad, correndo em duas largas fileiras no ritmo da canção, as lanças a postos, os rostos velados. Pareciam colunas infinitas avançando em direção às montanhas.

“Banhem as lanças — quem teme morrer? Banhem as lanças — que eu saiba, ninguém!”

Nos acampamentos dos clãs e na feira, Aiel observavam, estupefatos. Algo na forma como se portavam dava a Rand a certeza de que estavam em silêncio. Alguns condutores de carroções permaneciam parados, meio atônitos, enquanto outros soltavam as mulas e corriam de volta para os carroções. Keille e Isendre, Kadere e Natael ainda observavam Rand.

“Banhem as lanças — enquanto a vida pulsa. Banhem as lanças — até que a vida acabe. Banhem as lanças…”

— Vamos?

Ele não esperou a confirmação de Rhuarc para cravar as botas em Jeade’en, que começou a descer a montanha, com Adelin e as outras Donzelas logo atrás. Mat hesitou por um instante antes de disparar com Pips, mas Rhuarc e os chefes dos ramos dos Taardad, cada um com seus dez guerreiros, arrancaram na mesma hora que o sarapintado. Em dado momento, a meio caminho das tendas da feira, Rand olhou o topo da encosta atrás de si. Moiraine e Egwene permaneciam em cima dos cavalos, com Lan. Aviendha estava parada com as três Sábias. Todos de olhos fixos nele. Quase se esquecera de como era não ter ninguém a encará-lo.

Enquanto cavalgava no mesmo nível da feira, surgiu uma delegação de dez ou doze mulheres vestidas em saias e blusas, os corpos enfeitados com muito ouro, prata e marfim, e o mesmo número de homens vestidos nos tons cinza e marrom dos cadin’sor, porém desarmados, exceto pelas facas de cintura menores que a arma de lâmina bruta de Rhuarc. O grupo, no entanto, assumia uma postura que forçou Rand e os outros a pararem, e pareciam ignorar os Taardad velados que avançavam a leste e a oeste.

“Banhem as lanças — a vida é um sonho. Banhem as lanças — todo sonho tem fim.”

— Eu não esperava isso de você, Rhuarc — disse um homem corpulento e grisalho. Não era gordo, seu peso era todo músculos. Rand nunca vira um Aiel gordo. — Até vindo dos Shaido foi uma surpresa, mas de você?

— Os tempos mudam, Mandhuin — retrucou o chefe de clã. — Há quanto tempo os Shaido estão aqui?

— Chegaram logo ao nascer do sol. Quem pode explicar por que viajaram à noite? — Mandhuin fechou um pouco a cara para Rand e inclinou a cabeça na direção de Mat. — Realmente, Rhuarc, são tempos estranhos.

— Quem está aqui, além dos Shaido? — perguntou Rhuarc.

— Nós, Goshien, chegamos primeiro. Depois vieram os Shaarad. — O homem corpulento fez uma careta ao dizer o nome dos inimigos de sangue, sem deixar de analisar os dois aguacentos. — Os Chareen e os Tomanelle vieram depois. E, por último, os Shaido, como eu disse. Faz pouco tempo que Sevanna convenceu os chefes a virem. Bael não viu motivo para esse encontro de hoje, e alguns dos outros também não.

Uma mulher de meia-idade, com rosto largo e os cabelos mais loiros que os de Adelin, pôs as mãos na cintura, com um clangor de braceletes de marfim e ouro. Usava tantos braceletes e colares quanto Amys e sua esposa-irmã juntas.

— Ouvimos dizer que Aquele Que Vem Com a Aurora saiu de Rhuidean, Rhuarc. — Ela franziu o rosto para Rand e Mat. Toda a delegação fez o mesmo. — Ouvimos dizer que o Car’a’carn será anunciado hoje. Antes da chegada de todos os clãs.

— Então alguém lhe fez uma profecia — interveio Rand.

Ele tocou os flancos do sarapintado com os calcanhares, e a delegação abriu caminho.

— Dovienya — murmurou Mat. — Mia dovienya nesodhin soende. — Fosse lá o que aquilo significasse, soava como um desejo fervoroso.

As fileiras de Taardad tinham subido até o topo, pelos dois lados dos Shaido, e virado de frente para eles, a algumas centenas de passadas de distância, ainda velados, ainda cantando. Não faziam qualquer movimento que pudesse ser considerado ameaça. Na realidade, apenas permaneciam ali parados. Havia quinze ou vinte vezes o número de Shaido, todos cantando, as vozes ressoando na harmonia da canção.

“Banhem as lanças… até a sombra acabar. Banhem as lanças… até a água secar. Banhem as lanças… quão longe de casa? Banhem as lanças… até eu sucumbir!”

Ao se aproximar dos Shaido de véus negros, Rand viu Rhuarc levar uma das mãos ao próprio véu.

— Não, Rhuarc. Não estamos aqui para lutar com eles.

Ele quis dizer que não esperava que chegassem a esse ponto, mas o Aiel interpretou de maneira diferente.

— Tem razão, Rand al’Thor. Não há honra para os Shaido. — Deixando o véu pender, Rhuarc elevou a voz. — Não há honra para os Shaido!

Rand não virou a cabeça para olhar, mas teve a sensação de que véus negros estavam sendo baixados atrás dele.

— Ah, sangue e cinzas! — murmurou Mat. — Sangue e malditas cinzas!

“Banhem as lanças — até o sol morrer. Banhem as lanças — até a água correr. Banhem as lanças…”

As fileiras de Shaido se remexeram, incomodadas. Fosse lá o que Couladin ou Sevanna tivessem dito, os homens do clã sabiam contar. Dançar as lanças com Rhuarc e seus companheiros era uma coisa, mesmo que fosse contra todos os costumes. Enfrentar Taardad suficientes para varrê-los para fora do mapa feito uma avalanche era outra. Eles se retiraram relutantes, afastando-se para deixar Rand avançar, dando um passo atrás para abrir um caminho largo.

Rand soltou um suspiro de alívio. Adelin e as outras Donzelas, pelo menos, caminhavam com o olhar fixo à frente, como se os Shaido não existissem.

“Banhem as lanças — enquanto eu respirar. Banhem as lanças — meu aço vai brilhar. Banhem as lanças…”

A cantoria foi diminuindo atrás deles até virar um murmúrio, enquanto o grupo passava pela garganta estreita, profunda e sombria que serpenteava por entre as montanhas. Durante alguns minutos, os sons mais altos eram o clangor dos cascos na pedra e o sussurro das botas macias dos Aiel. De repente, a passagem estreita deu lugar a Alcair Dal.

Rand entendeu porque o cânion fora chamado de bacia de ouro, embora não houvesse nenhum reflexo dourado ali. Era um círculo quase perfeito, com uma muralha cinza formando uma encosta em quase toda a circunferência, exceto no trecho mais afastado, onde a parede fazia uma curva para dentro, feito uma onda gigante. Grupos de Aiel pontilhavam toda a encosta, cabeças e rostos descobertos. Havia muitos mais grupos do que clãs. Os Taardad que tinham vindo com os chefes dos ramos começaram a se afastar em direção a cada um do seu. Segundo Rhuarc, agrupar-se por sociedade, não por clã, ajudava a manter a paz. Apenas seus Escudos Vermelhos e as Donzelas permaneceram com Rand e os chefes dos Taardad.