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— Eu trago a mudança! — gritou ele. — Conforme a profecia, eu trago novos dias! Vamos cruzar a Muralha do Dragão outra vez e recuperar o que nos pertence! Os aguacentos são moles, mas são ricos! Vocês se lembram da riqueza que foi trazida de volta, na última vez que adentramos as terras aguacentas! Desta vez, traremos tudo! Desta vez…!

Rand deixou-se inundar pela declamação do homem. De todas as coisas possíveis, jamais suspeitara disso. Como? A palavra ficava ressoando em sua mente, mas ele não conseguia acreditar na própria compostura. Bem devagar, tirou o casaco, hesitando por um instante antes de apanhar o angreal do bolso. Enfiou o entalhe no cós da calça, deixou cair o casaco no chão e caminhou para a dianteira da saliência, desfazendo os laços da camisa com muita calma. Quando ergueu os braços para o alto da cabeça, as mangas deslizaram para baixo.

Os Aiel reunidos levaram um instante para perceber os Dragões que também serpenteavam pelos braços de Rand, reluzentes sob o sol. O silêncio foi se abatendo aos poucos, mas, por fim, dominou o ambiente. O queixo de Sevanna desabou. Ela não sabia. Obviamente Couladin não pensara que Rand viria tão depressa, não dissera a ela que outro também portava as marcas. Como? O homem decerto acreditara que teria tempo. Depois que estivesse estabelecido, Rand seria rejeitado como fraude. Luz, como? Se a senhora do teto do Forte de Comarda estava atônita, os chefes dos clãs também estavam, exceto por Rhuarc. Dois homens marcados, enquanto a profecia rezava que apenas um poderia existir.

Couladin prosseguia com seu discurso inflamado, abanando os braços para garantir que todos vissem suas marcas.

— … não vamos parar ao dominar as terras dos violadores de juramentos! Vamos arrasar tudo até o Oceano de Aryth! Os aguacentos não poderão oferecer resistência… — De súbito, ele notou o silêncio onde antes haviam gritos inflamados. Sabia o motivo. Sem se virar para encarar Rand, gritou: — Aguacento! Olhem as roupas dele! É um aguacento!

— Um aguacento — concordou Rand. Não ergueu a voz, mas o cânion a conduziu a todos. O Shaido pareceu surpreso por um instante, mas logo escancarou um sorriso triunfante, até que Rand prosseguiu. — O que diz a Profecia de Rhuidean? “Nascido do sangue.” Minha mãe era Shaiel, uma Donzela dos Taardad Chumai. — Quem era ela, na verdade? De onde viera? — Meu pai era Janduin, do ramo da Montanha de Ferro, chefe do clã dos Taardad. — Meu pai é Tam al’Thor. Ele me encontrou, me criou, me amou. Queria ter podido conhecer o senhor, Janduin, mas o meu pai é Tam. — “Nascido do sangue, porém criado fora do sangue.” Onde foi que as Sábias mandaram me procurar? Nos fortes da Terra da Trindade? Elas mandaram procurar para além da Muralha do Dragão, n o local onde fui criado. Exatamente como a profecia.

Bael e os outros três assentiram devagar, mas com relutância. Havia ainda a questão de Couladin também estampar os Dragões, e sem dúvida eles prefeririam que fosse um deles. Sevanna tinha o rosto rígido. Não importava quem portasse as marcas verdadeiras, não havia dúvida a respeito de quem ela apoiava.

A confiança de Couladin não esmoreceu. O homem encarara Rand com desprezo desde a primeira vez que o vira.

— Faz quanto tempo que a Profecia de Rhuidean foi revelada pela primeira vez? — Ele ainda parecia acreditar que precisava gritar. — Quem pode dizer o quanto as palavras mudaram? Minha mãe era Far Dareis Mai, antes de abrir mão da lança. Quanto do restante mudou? Ou foi mudado? Dizem que um dia servimos às Aes Sedai. Eu digo que elas querem nos atar a elas mais uma vez! Esse aguacento foi escolhido porque se parece com a gente! Ele não é do sangue! Veio em companhia de Aes Sedai, preso numa coleira! E as Sábias as receberam como se fossem irmãs-primeiras! Vocês todos ouviram falar de Sábias capazes de fazer coisas além de qualquer compreensão. As Andarilhas dos S onhos usaram o Poder Único para me manter longe desse aguacento! Usaram o Poder Único, como dizem que as Aes Sedai fazem! As Aes Sedai trouxeram esse aguacento aqui para nos prender com falsidades! E as andarilhas dos sonhos as ajudaram!

— Isso é loucura! — Rhuarc avançou a passos largos atrás de Rand, enca rando a multidão ainda em silêncio. — Couladin nunca pôs os pés em Rhuidean. Eu ouvi quando as Sábias recusaram sua entrada. Mas Rand al’Thor foi. Eu o vi sair de Chaendaer e retornar, marcado, como vocês também podem ver.

— E por que elas recusaram minha entrada? — indagou Couladin, com um rosnado. — Porque as Aes Sedai mandaram! Rhuarc não conta a vocês que uma das Aes Sedai desceu de Chaendaer com esse aguacento! Foi por isso que ele retornou com os Dragões! Bruxaria de Aes Sedai! Meu irmão, Muradin, morreu debaixo de Chaendaer, assassinado por esse aguacento e a Aes Sedai Moiraine. E as Sábias, ordenadas pelas Aes Sedai, deixaram os dois impunes! Quando a noite caiu, eu fui até Rhuidean. Não me revelei até agora porque este aqui é o lugar apropriado para o Car’a’carn aparecer! Eu sou o Car’a’carn!

Mentiras entremeadas com fragmentos de verdade. O homem ostentava uma confiança vitoriosa, e sem dúvida teria resposta para qualquer coisa.

— Você diz que foi a Rhuidean sem a permissão das Sábias? — inquiriu Han, de cara feia. O imenso Bael exibia o mesmo olhar de desaprovação, com os braços cruzados, e Erim e Jheran pareciam apenas um tantinho menos irritados. Mas, pelos menos os chefes dos clãs ainda hesitavam. Sevanna agarrou a faca de cintura, cravando os olhos em Han como se quisesse enfiá-la em suas costas.

Couladin, no entanto, tinha uma resposta.

— Isso mesmo, sem a permissão delas! Aquele Que Vem Com a Aurora traz a mudança! É isso o que diz a profecia! Os costumes inúteis têm que mudar, e vou mudar todos eles! Eu não cheguei aqui com a aurora?

Os chefes dos clãs permaneciam indecisos, e também os Aiel que observavam, todos de pé aos milhares, observando em silêncio, aguardando. Se Rand não fosse capaz de convencê-los, era certo que não sairia vivo de Alcair Dal. Mat indicou outra vez a sela de Jeade’en. Rand sequer deu-se ao trabalho de balançar a cabeça. Havia mais coisa a levar em conta além de sair dali vivo: ele precisava daquele povo, precisava de sua lealdade. Precisava ter gente que o seguisse por acreditar nele, não para usá-lo ou pelo que ele tivesse para dar. Precisava.

— Rhuidean — disse. A palavra preencheu todo o cânion. — Você está alegando que foi a Rhuidean, Couladin. O que viu por lá?

— Todos sabem que é proibido falar a respeito de Rhuidean — retrucou Couladin, mais do que depressa.

— Nós podemos nos afastar — sugeriu Erim — e conversar em particular, para que você possa nos contar…

O Shaido o interrompeu bruscamente, o rosto vermelho de raiva.

— Eu não vou falar com ninguém. Rhuidean é um lugar sagrado, e o que eu vi é sagrado. Eu sou sagrado! — Ele ergueu outra vez os braços com as marcas do Dragão. — Isso aqui me torna sagrado!

— Eu caminhei por colunas de vidro ao lado de Avendesora. — Rand falava baixinho, mas as palavras chegavam a todos os cantos. — Eu vi a história dos Aiel pelos olhos dos meus ancestrais. O que foi que você viu, Couladin? Eu não tenho medo de falar. Você tem?

O Shaido tremia de fúria, o rosto estava quase da cor de seus cabelos.

Olhares indecisos percorreram Bael e Erim, Jheran e Han.

— Para isso, teremos que nos afastar — murmurou Han.

Couladin não parecia perceber que perdera vantagem com os quatro, mas Sevanna, sim.

— Foi Rhuarc que contou tudo isso a ele — vociferou a mulher. — Uma das esposas de Rhuarc é Andarilha dos Sonhos, uma dessas que ajudam as Aes Sedai! Rhuarc contou tudo a ele!