Выбрать главу

— Rhuarc não faria isso — retrucou Han, bruscamente. — Ele é o chefe do clã, é um homem honrado. Não fale do que não sabe, Sevanna!

— Eu não estou com medo! — gritou Couladin. — Nenhum homem pode me dizer que sinto medo! Eu também vi pelos olhos dos meus ancestrais! Eu vi nossa chegada à Terra da Trindade! Vi nossa glória! A glória que vou trazer de volta a nós!

— Eu vi a Era das Lendas — anunciou Rand — e o início da jornada dos Aiel até a Terra da Trindade. — Rhuarc agarrou seu braço, mas ele se desvencilhou do chefe de clã. Aquele momento estivera fadado a acontecer desde que os Aiel se reuniram diante de Rhuidean pela primeira vez. — Eu vi os Aiel quando eram chamados de Aiel Da’ shain, e seguiam o Caminho da Folha.

— Não! — O gritou se elevou de fora do cânion e se propagou em um estrondo. — Não! Não! — Vinha de milhares de gargantas. As pontas das lanças erguidas refletiam a luz do sol. Até alguns chefes de ramo dos Taardad gritavam.

Adelin encarou Rand, aflita. Mat gritou alguma coisa para ele, mas o grito se perdeu no estrondo. O rapaz gesticulava com premência para que ele montasse na sela.

— Mentiroso! — O formato do cânion conduzia o berro de Couladin, cólera misturada a triunfo, por sobre os gritos da multidão. Balançando a cabeça freneticamente, Sevanna estendeu o braço para ele. Àquela altura, devia ter pelo menos imaginado que ele era o falso, porém, se conseguisse mantê-lo quieto, talvez obtivessem sucesso. Como Rand esperava, Couladin a repeliu. O homem sabia que Rand fora a Rhuidean. Não era capaz de acreditar em sequer metade da própria história, mas também não acreditava no que Rand dissera. — A prova de que ele é uma fraude vem da própria boca! Nós sempre fomos guerreiros! Sempre! Desde o início dos tempos!

O estrondo se elevou, as lanças balançando, mas Bael, Erim, Jheran e Han permaneceram em completo silêncio. Agora sabiam. Sem se dar conta de seus olhares, Couladin abanou os braços coroados com os Dragões para os Aiel reunidos, exultante com a adulação.

— Por quê? — indagou Rhuarc, baixinho, ao lado de Rand. — Você não entendeu por que não falamos de Rhuidean? Não queremos encarar que um dia fomos tão diferentes de tudo em que acreditamos agora, que éramos iguais aos Perdidos desprezíveis que vocês chamam de Tuatha’an. Rhuidean mata os que não são capazes de enfrentá-la. Dos homens que vão a Rhuidean, nem um em três consegue sobreviver. E agora você falou para todos ouvirem. Não vai parar por aqui, Rand al’Thor. A coisa vai se espalhar. Quantos terão força suficiente para aguentar?

Ele os unirá e os destruirá.

— Eu trago a mudança — respondeu Rand, com tristeza. — Não paz, e sim desordem. — A destruição me acompanha aonde vou. Será que existe algum lugar que eu não vou destruir? — O que for, será, Rhuarc. Eu não posso mudar.

— O que for, será — murmurou o Aiel, depois de um instante.

Couladin ainda andava para cima e para baixo a passos firmes, gritando para os Aiel sobre glória e conquista, sem perceber os chefes dos clãs que o encaravam pelas costas. Sevanna sequer olhava para Couladin. Seus olhos verde-claros estavam concentrados nos chefes dos clãs, os lábios contraídos em um esgar, os seios se elevando com respirações ansiosas. Ela sem dúvida sabia o significado daqueles olhares silenciosos.

— Rand al’Thor — disse Bael em voz alta, o nome retalhando os gritos de Couladin, cortando o estrondo da multidão feito uma lâmina. Ele parou para pigarrear, balançando a cabeça como se procurasse uma saída para tudo aquilo. Couladin se virou e cruzou os braços, confiante, decerto à espera de uma sentença de morte para o aguacento. O imenso chefe de clã respirou fundo. — Rand al’Thor é o Car’a’carn. Rand al’Thor é Aquele Que Vem Com a Aurora.

Os olhos de Couladin se arregalaram, incrédulos e furiosos.

— Rand al’Thor é Aquele Que Vem Com a Aurora — anunciou Han, com o rosto curtido igualmente relutante.

— Rand al’Thor é Aquele Que Vem Com a Aurora — repetiu Jheran, taciturno.

— Rand al’Thor é Aquele Que Vem Com a Aurora — disse Erim.

— Rand al’Thor — enunciou Rhuarc — é Aquele Que Vem Com a Aurora. — E, em um tom baixo demais até para ecoar pela saliência, acrescentou: — E que a Luz tenha piedade de nós.

Por um longo e lento instante, o silêncio se abateu. Então Couladin saltou da saliência, rosnando, agarrou uma lança de um de seus Seia Doon e avançou direto para Rand. Porém, enquanto ele avançava, Adelin deu um salto. A ponta da lança do Aiel enfurecido perfurou as camadas do couro do broquel que a mulher estendera, atirando-a para longe.

Um pandemônio irrompeu no cânion, homens gritavam, empurrando uns aos outros. As demais Donzelas Jindo pularam ao lado de Adelin, formando uma proteção na frente de Rand. Sevanna descera para gritar com Couladin, pendurando-se no braço do homem enquanto ele tentava liderar os Shaido Olhos Negros contra as Donzelas que estavam entre ele e Rand. Heirn e mais uma dúzia de chefes de ramos Taardad juntaram-se a Adelin, de lanças a postos, mas outros gritavam alto. Mat se levantou, desajeitado, e agarrou a lança de cabo preto com a ponta marcada pela garça, urrando o que deveriam ser xingamentos na Língua Antiga. Rhuarc e os outros chefes dos clãs ergueram a voz, tentando em vão restaurar a ordem. O cânion ebulia feito um caldeirão. Rand viu homens e mulheres velando o rosto. Uma lança reluziu no meio de um golpe. Outra. Ele precisava impedir aquilo.

Tentou tocar saidin, e a energia fluiu dentro de seu corpo até ele achar que iria explodir, se não se incendiasse primeiro. A imundície da mácula que o dominou parecia prestes a petrificar seu sangue. As ideias flutuaram para fora do Vazio. Ideias frias. Água. Ali, onde a água era tão escassa, os Aiel sempre falavam disso. Até mesmo naquele ar seco havia alguma água. Ele canalizou, sem saber ao certo o que fazia, tateando às cegas.

Um raio lancinante estalou sobre Alcair Dal, e o vento soprou com violência, vindo de todos os lados, chiando pela beirada do cânion, abafando os gritos dos Aiel. Um vento que trouxe diminutos pingos de água, depois mais e mais, até acontecer algo que homem nenhum jamais vira por ali. Uma cerração de chuva começou a descer. O vento acima uivava e remoinhava. Relâmpagos indômitos varavam o céu. E a chuva foi ficando mais e mais forte, até virar um pé d’água, desabando pela saliência da encosta, colando os cabelos de Rand à cabeça e a camisa às costas, turvando a visão de tudo a cinquenta passadas de distância.

De súbito, a chuva parou de açoitá-lo; um domo invisível formara-se ao redor dele, afastando Mat e os Taardad. Sob a água que corria pelas laterais, mal dava para ver Adelin, que esmurrava o domo, tentando entrar à força.

— Seu idiota, brincando com esses outros idiotas! Desperdiçando todo o meu esforço e planejamento!

A água escorria por seu rosto quando Rand se virou e encarou Lanfear. O vestido branco com cinto de prata estava perfeitamente seco, as ondas negras dos cabelos entre as estrelas e luas prateadas estavam intocadas pelas gotas de chuva. Aqueles olhos negros o encaravam com fúria; a ira contorcia seu belo rosto.

— Não imaginei que você fosse se revelar tão cedo — murmurou ele. O Poder ainda o preenchia. Ele manuseou a torrente que o açoitava, agarrando-se ao Poder com um desespero que não chegava à voz. Não era necessário puxar mais Poder. Ele apenas o deixou fluir até sentir os ossos prestes a torrarem e virarem cinzas. Não sabia se a mulher podia blindá-lo enquanto saidin corria por seu corpo, mas deixou-se preencher contra essa possibilidade. — Sei que você não está sozinha. Onde ele está?

A bela boca de Lanfear se contraiu.