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— E Thom Merrilin? — perguntou Elayne. — Acho que podemos confiar nele. Não sei por quê, mas tenho essa sensação.

— Ele confessou que foi enviado por Moiraine — concordou Nynaeve, parecendo cansada. — Mas o que foi que não confessou? O que ela disse que ele não nos contou? Veio para nos ajudar, ou está aqui por outro motivo? Moiraine está sempre com aqueles jogos dela, então confio nela quase tanto quanto em Liandrin. Moiraine vai usar nós duas, eu e você, se for para ajudar a causa de Rand. Ou melhor, se for para servir aos planos que tem para Rand. Ela o levaria na coleira feito um cachorrinho, se pudesse.

— Moiraine sabe o que precisa ser feito, Nynaeve. — Pela primeira vez, Elayne ficou relutante em admitir aquilo. O que Moiraine sabia que tinha de ser feito podia muito bem acelerar os passos do Dragão em direção a Tarmon Gai’don. Em direção à morte, talvez. Rand e o mundo estavam em lados opostos de uma balança. Era ingênuo e infantil ela considerar os dois lados dessa balança equilibrados. E mesmo assim não ousava movê-los, nem em sua mente, porque não tinha certeza de qual teria mais peso para ela. — Moiraine sabe mais do que ele — disse, com a voz firme. — Mais do que nós.

— Talvez. — Nynaeve suspirou. — Mas não sou obrigada a gostar disso.

Cordas foram jogadas na proa, onde velas triangulares se abriram de repente, e o Bailador das Ondas afastou-se do ancoradouro. Mais velas apareceram, quadrados e triângulos brancos e imensos, as cordas da popa foram desamarradas. Logo o navio adentrou o rio, fazendo uma grande curva em volta das embarcações que aguardavam a hora de zarpar ancoradas no cais — um arco suave que terminou apontando para o sul, rio abaixo. O Povo do Mar conduzia o navio como um mestre cavaleiro conduziria um belo corcel. Aquela roda estranha e cheia de raios de madeira pontudos guiava o leme sempre que um dos tripulantes sem camisa a girava. Um homem, Elayne ficou aliviada em ver. A Mestra das Velas e a Chamadora de Ventos ficavam paradas de um dos lados da roda, e Coine emitia algumas ordens, às vezes depois de uma consulta sussurrada à irmã. Toram observou durante um tempo, com uma expressão que parecia esculpida na tábua de um deque, depois saiu do convés pisando duro.

Havia um taireno no convés da popa, um homem gorducho e de aparência abatida, vestindo um casaco amarelo desbotado com mangas cinza bufantes e esfregando as mãos, nervoso. Fora levado a bordo às pressas, enquanto a prancha de embarque era erguida. Um piloto que supostamente deveria conduzir o Bailador rio abaixo. De acordo com a lei tairena, navio algum tinha permissão de passar pelas Garras do Dragão sem um piloto taireno a bordo. A falta de animação do homem decerto vinha de ficar sem fazer nada, pois mesmo que fornecesse alguma instrução, o Povo do Mar não lhe daria ouvidos.

Murmurando algo sobre ir ver como era a cabine, Nynaeve desceu as escadas para o andar de baixo — para o deque inferior — mas Elayne ficou apreciando a brisa no convés e a sensação de partir. Viajar, conhecer lugares que nunca vira, era uma alegria. Jamais pensara que o faria, não daquele jeito. A Filha-herdeira de Andor talvez fizesse algumas visitas a outros reinos, além de tantas mais depois de subir ao trono, mas teria de ficar sempre presa às convenções e formalidades. Não seriam como aquela experiência. Gente do Povo do Mar descalça e um navio zarpando em direção ao oceano.

A margem do rio deslizava bastante depressa enquanto o sol se erguia, e um ou outro conglomerado de casas de fazenda feitas de pedra ou de celeiros desertos e solitários surgiam e desapareciam logo em seguida. Mas não passaram por aldeia alguma. Tear não permitiria a existência de qualquer aldeia, por menor que fosse, no rio entre a cidade e o mar, pois até a menorzinha de todas poderia algum dia competir com a capital. Os Grão-lordes controlavam os tamanhos das aldeias e cidades por todo o país com uma taxa predial, que subia na mesma proporção em que o número de construções aumentava. Elayne tinha certeza de que nunca teriam permitido a prosperidade de Godan, na Baía de Remara, não fosse a suposta necessidade de uma presença de peso para vigiar Mayene de perto. De certa forma, era um alívio deixar para trás um povo tão tolo. Se pelo menos não tivesse que deixar um homem tolo para trás, junto com aquele povo.

O número de barcos de pesca, a maioria pequenos — e todos cercados por nuvens de gaivotas e pássaros pescadores — aumentava à medida que o Bailador avançava, sobretudo depois que a embarcação adentrou o labirinto de canais chamado de Garras do Dragão. Os pássaros e os mastros compridos que prendiam as redes eram a única vista além dos juncos e capim-navalha balançando com a brisa, a não ser por algumas ilhas baixas onde cresciam árvores estranhas e retorcidas, as raízes emaranhadas brotando do chão. Muitos barcos ficavam bem entre os juncos, mas trabalhavam sem redes. Em dado momento, Elayne avistou alguns perto da água limpa, onde homens e mulheres jogavam linhas com ganchos entre as algas e as puxavam de volta com peixes serpenteantes de listras escuras, todos do tamanho de um braço.

O piloto taireno começou a andar de um lado para o outro, ansioso, quando chegaram ao delta, com o sol a pino, e torceu o nariz para a tigela de peixe cozido com especiarias e o pão que lhe ofereceram. Elayne comeu com vontade, limpando a tigela de cerâmica com os últimos pedaços de pão, embora compartilhasse do incômodo do homem. Passagens amplas e estreitas pareciam levar a todas as direções. Algumas terminavam de repente, ainda à vista, em uma muralha de juncos. Não havia como dizer quais das outras desapareceriam da mesma forma abrupta após a curva seguinte. Apesar disso, Coine não reduzia a velocidade do Bailador, nem hesitava em traçar o caminho. Era óbvio que sabia em quais canais entrar — ou a Chamadora de Ventos sabia — mas o piloto continuava resmungando sozinho, como se pensasse que fossem encalhar a qualquer momento.

Era fim de tarde quando a boca do rio surgiu à frente de súbito, revelando a infinita superfície do Mar das Tempestades. O Povo do Mar fez um movimento com as velas, e o navio estremeceu de leve e parou de vez. Foi só então que Elayne percebeu um grande bote a remos deslizando depressa, parecia uma barata d’água cheia de pernas. A pequena embarcação saía de uma ilha onde algumas construções solitárias estavam espalhadas ao redor de uma torre estreita e comprida. No topo, homens que pareciam pequeninos a distância esperavam sob o estandarte de Tear, três luas crescentes em um campo vermelho e dourado. O piloto pegou a bolsa que Coine ofereceu sem dizer uma palavra e desceu correndo uma escada de cordas para o bote. Assim que ele subiu a bordo, as velas se abriram outra vez, e o Bailador enfrentou as primeiras ondas do mar aberto, erguendo-se de leve, abrindo caminho. O Povo do Mar correu até os cordames e ergueu mais velas, e o navio disparou para o sudoeste, para longe da cidade.

Quando a última faixa estreita de terra desapareceu no horizonte, as mulheres do Povo do Mar tiraram as blusas. Todas elas, até a Mestra das Velas e a Chamadora de Ventos. Elayne não sabia para onde olhar. Todas as mulheres andavam para lá e para cá, seminuas, sem se preocuparem com os homens ao redor. Juilin Sandar parecia tão constrangido quanto ela, e olhava, embasbacado, das mulheres para os próprios pés, até que saiu correndo para o deque inferior. Elayne não se deixaria abalar. Optou, em vez disso, por olhar para o lado e observar o mar.

Costumes diferentes, lembrou a si mesma. Desde que não esperem que eu faça o mesmo. Só o pensamento quase a fez soltar uma risada histérica. De certo modo, era mais fácil pensar na Ajah Negra do que nisso. Costumes diferentes. Luz!

O céu ficou roxo, com o sol opaco no horizonte. Golfinhos escoltavam a embarcação, dando voltas e saltando logo ao lado. Mais adiante, cardumes de uma espécie de peixe brilhante azul-prateado irrompiam da superfície, deslizando pelo ar com as barbatanas esticadas por cinquenta passadas ou mais antes de mergulhar de volta na água azul-acinzentada e turbulenta. Elayne assistiu a uns doze mergulhos, estupefata, até que os bichos não apareceram mais.