Выбрать главу

– Por que devo temer Pono? – Dany quis saber. – Ele era ko de Drogo, e sempre falou comigo com gentileza.

– Ko Pono falou com você com gentileza – Sor Jorah Mormont respondeu. – Khal Pono matará você. Ele foi o primeiro a abandonar Drogo. Foram com ele dez mil guerreiros. Você tem cem.

Não, Dany pensou. Tenho quatro. O resto são mulheres, velhos doentes e garotos cujo cabelo nunca foi trançado.

– Tenho os dragões.

– Crias – corrigiu-a Sor Jorah. – Um golpe de arakh daria cabo deles, embora seja mais provável que Pono os capture para si. Seus ovos de dragão eram mais preciosos do que rubis. Um dragão vivo não tem preço. No mundo inteiro há apenas três. Todos os homens que os virem vão desejá-los, minha rainha.

– São meus – ela disse ferozmente. Tinham nascido da sua fé e da sua necessidade, tinham recebido a vida das mortes do marido, do filho natimorto e da maegi Mirri Maz Duur. Dany tinha penetrado nas chamas no momento em que nasciam, e eles tinham bebido leite dos seus seios inchados. – Ninguém vai tirá-los de mim enquanto eu viver.

– Não viverá por muito tempo caso se encontre com Khal Pono. Nem com Khal Jhaqo, ou qualquer um dos outros. Tem de ir para onde eles não forem.

Dany nomeara-o o primeiro da sua Guarda Real… E quando os conselhos duros de Mormont e os presságios coincidiam, seu caminho ficava claro. Reuniu seu povo e montou a égua prateada. Seu cabelo tinha ardido na pira de Drogo, por isso as aias envolveram-na na pele do hrakkar que Drogo havia matado, o leão branco do mar dothraki. A medonha cabeça do animal formava um capuz para cobrir seu couro cabeludo nu, e a pele era um manto que escorria pelos seus ombros e costas. O dragão de cor creme enfiou suas negras garras afiadas na juba do leão e enrolou a cauda no braço de Dany, enquanto Sor Jorah ocupava a seu lado o lugar de costume.

– Seguimos o cometa – Dany falou ao khalasar. Depois da frase pronunciada, não se levantou uma única palavra de discórdia. Eles tinham sido o povo de Drogo, mas agora eram dela. Chamavam-na de A Não Queimada e de Mãe dos Dragões. Sua palavra era a lei deles.

Avançavam durante a noite, e de dia refugiavam-se do sol sob as tendas. Em breve, Dany viu a verdade das palavras de Doreah. Aquela não era uma região receptiva. Deixaram atrás de si um rastro de cavalos mortos e moribundos, pois Pono, Jhaqo e os outros tinham levado o que havia de melhor nas manadas de Drogo, deixando para Dany os animais velhos e esqueléticos, os doentes e os coxos, os animais inutilizados e os de mau temperamento. Era o mesmo com as pessoas. Não são fortes, Dany disse a si mesma, portanto, eu devo ser a sua força. Não posso mostrar medo, nem fraqueza, nem dúvida. Por mais assustado que esteja meu coração, quando olharem meu rosto, devem ver apenas a rainha de Drogo. Sentia-se mais velha do que os seus catorze anos. Se alguma vez tinha sido realmente uma menina, esse tempo já passara.

Três dias depois de iniciarem a marcha, o primeiro homem morreu. Um velho desdentado, com olhos azuis enevoados, caiu exausto da sela e não conseguiu se levantar. Uma hora mais tarde, partiu. Moscas de sangue enxamearam em volta do seu cadáver e transportaram sua má sorte para os vivos.

– Já tinha passado seu tempo – a aia Irri declarou. – Nenhum homem deve viver mais do que os seus dentes.

Os outros concordaram. Dany ordenou-lhes que matassem o mais fraco dos cavalos moribundos, para que o morto pudesse partir montado para as terras da noite.

Duas noites mais tarde, foi uma menina pequena quem pereceu. Os lamentos angustiados da mãe duraram o dia inteiro, mas não havia o que fazer. A pobre criança era pequena demais para montar a cavalo. O mato negro sem fim das terras da noite não era para ela; teria de voltar a nascer.

Havia pouco alimento no deserto vermelho e ainda menos água. Era uma terra ressequida e desolada de montes baixos e planícies estéreis varridas pelo vento. Os rios que cruzaram estavam secos como ossos de cadáveres. As montarias subsistiam da dura erva-do-diabo marrom que crescia em moitas na base dos rochedos e de árvores mortas. Dany enviou batedores à frente da coluna, mas não encontraram poços nem nascentes, apenas charcos amargos, rasos e parados, minguando ao sol quente. Quanto mais profundamente penetravam no deserto, menores se tornavam os charcos, enquanto a distância entre eles crescia. Se havia deuses nessa vastidão sem trilhas feita de pedra, areia e barro vermelho, eram duros e secos, surdos às preces que pediam chuva.

O vinho foi o primeiro a acabar, e pouco depois terminava o leite coalhado de égua que os senhores dos cavalos apreciavam mais do que hidromel. Então esgotaram-se também as reservas de pão frito e carne-seca. Os caçadores não encontravam caça, e só a carne dos cavalos mortos enchia suas barrigas. As mortes sucediam-se. Crianças fracas, velhas encarquilhadas, doentes, estúpidos e imprudentes, a terra cruel reclamava-os todos. Doreah tornou-se magra e de olhos encovados, e seu delicado cabelo dourado ficou quebradiço como palha.

Dany passava fome e sede como os outros. O leite secou nos seus seios, seus mamilos racharam e sangraram, e a carne foi desaparecendo do seu corpo dia após dia, até ficar magra e dura como um pau, mas era pelos dragões que temia. O pai tinha sido morto antes de ela nascer, e seu magnífico irmão Rhaegar também. A mãe morrera trazendo-a ao mundo, enquanto lá fora a tempestade rugia. O gentil Sor Willem Darry, que a seu modo devia tê-la amado, fora levado por uma doença debilitante quando era muito nova. O irmão Viserys, Khal Drogo, que era o sol-e-estrelas de Daenerys, até o filho natimorto, os deuses tinham reclamado todos eles. Não terão os meus dragões, Dany jurou. Não os terão.

Os dragões não eram maiores do que os gatos magros que via antigamente esgueirando-se junto aos muros da propriedade do Magíster Illyrio em Pentos… Até abrirem as asas. A envergadura era três vezes maior que o comprimento do corpo, e cada asa era um delicado leque de pele translúcida, maravilhosamente colorida, bem retesada entre longos ossos finos. Quando se olhava com atenção, via-se que a maior parte do corpo dos animais era pescoço, cauda e asas. Coisas tão pequenas, ela pensou, enquanto os alimentava na mão. Ou melhor, tentava alimentá-los, pois os dragões não queriam comer. Silvavam e cuspiam todos os pedaços de carne de cavalo, exalando vapor pelas narinas, mas não aceitavam a comida… Até que Dany se recordou de algo que Viserys lhe tinha dito quando eram crianças.

Só os dragões e os homens comem carne cozida.

Quando mandou as aias torrarem a carne de cavalo até deixá-la preta, os dragões devoraram-na avidamente, projetando as cabeças como serpentes. Desde que a carne estivesse crestada, engoliam várias vezes seu próprio peso todos os dias, e por fim começaram a crescer e a se fortalecer. Dany maravilhava-se com a maciez das suas escamas, e com o calor que emanavam, tão palpável que, em noites frias, os corpos inteiros pareciam gerar vapor.

Sempre que caía a noite, quando o khalasar se punha em movimento, escolhia um dragão para seguir empoleirado no seu ombro. Irri e Jhiqui levavam os outros numa gaiola de madeira trançada, pendurada entre as suas montarias, e seguiam logo atrás dela, para que Dany sempre pudesse ser vista. Era a única maneira de mantê-los tranquilos.

– Os dragões de Aegon foram batizados em homenagem aos deuses da antiga Valíria – Dany contou aos companheiros de sangue uma manhã, depois de uma longa noite de viagem. – O dragão de Visenya era Vhagar, Rhaenys tinha Meraxes e Aegon montava Balerion, o Terror Negro. Dizia-se que o sopro de Vhagar era tão quente, que era capaz de derreter a armadura de um cavaleiro e cozinhar o homem lá dentro; que Meraxes engolia cavalos inteiros; e quanto a Balerion… Seu fogo era negro como suas escamas, as asas tão vastas que vilas inteiras eram engolidas pela sua sombra quando passava por cima delas.