Выбрать главу

– E o que faz o passarinho de Joff voando pelo caracol abaixo na noite escura? – quando ela não respondeu, ele a sacudiu. – Onde estava?

– No b-b-bosque sagrado, senhor – ela respondeu, sem se atrever a mentir. – Rezando… rezando pelo meu pai e… pelo rei, rezando para que não seja ferido.

– Acha que estou tão bêbado que acredito nisso? – o homem largou seu braço, cambaleando ligeiramente, com listras de luz e escuridão caindo sobre sua terrível cara queimada. – Parece quase uma mulher… cara, tetas e também está mais alta, quase… Ah, ainda é um estúpido passarinho, não é? Cantando todas as canções que lhe ensinaram… Cante-me uma canção, por que não canta? Vai. Cante para mim. Alguma canção sobre cavaleiros e belas donzelas. Gosta de cavaleiros, não gosta?

Sansa ficava cada vez mais assutada.

– De cavaleiros v-verdadeiros, senhor.

– Cavaleiros verdadeiros – ele caçoou. – E eu não sou senhor nenhum, assim como não sou nenhum cavaleiro. Será que preciso enfiar isso na sua cabeça na marra? – Clegane oscilou e quase caiu. – Deuses – praguejou –, vinho demais. Gosta de vinho, passarinho? De vinho verdadeiro? Um jarro de tinto amargo, escuro como sangue, é tudo do que um homem precisa. Ou uma mulher – riu, sacudindo a cabeça. – Bêbado que nem um cão, maldito seja. Vem agora. De volta à sua gaiola, passarinho. Eu a levo lá. Mantenho-a a salvo para o rei.

Cão de Caça deu-lhe um empurrão, estranhamente gentil, e seguiu-a pela escada. Quando chegaram ao fundo, ele tinha caído num silêncio meditativo, como se tivesse se esquecido de que ela estava ali.

Quando chegaram à Fortaleza de Maegor, ela ficou alarmada por ver que era Sor Boros Blount quem agora patrulhava a ponte. Seu grande elmo branco virou-se rigidamente ao ouvir o som dos passos deles. Sansa vacilou perante seu olhar. Sor Boros era o pior dos homens da Guarda Real, um homem feio, com um gênio mau, todo ele carranca e papada.

– Aquele não é nada a temer, moça – Cão de Caça pôs uma mão pesada no ombro dela. – Se pintar listras num sapo, ele não se transforma em tigre.

Sor Boros ergueu a viseira.

– Sor, onde…

– Que se foda o seu sor, Boros. Você é o cavaleiro, não eu. Eu sou o cão do rei, lembra?

– O rei andava há um tempo à procura do seu cão.

– O cão estava bebendo. Era a sua noite de defendê-lo, sor. Sua e dos meus outros irmãos.

Sor Boros virou-se para Sansa.

– Por que motivo não está nos seus aposentos a esta hora, senhora?

– Fui ao bosque sagrado rezar pela segurança do rei – a mentira daquela vez soou melhor, quase verdadeira.

– Espera que ela durma, com todo este barulho? – Clegane perguntou. – O que houve?

– Idiotas ao portão – Sor Boros admitiu. – Algumas línguas soltas espalharam histórias a respeito dos preparativos para o banquete de casamento de Tyrek, e aqueles infelizes puseram na cabeça que também deviam ser banqueteados. Sua Graça liderou um ataque surpresa e os escorraçou.

– Rapaz corajoso – disse Clegane, com a boca se retorcendo.

Veremos como ele é corajoso quando defrontar meu irmão, Sansa pensou. Cão de Caça a levou através da ponte levadiça. Enquanto subiam os degraus, ela disse:

– Por que deixa que as pessoas o chamem de cão? E não aceita que ninguém o chame de cavaleiro?

– Gosto mais de cães do que de cavaleiros. O pai do meu pai era mestre dos canis no Rochedo. Num ano de outono, Lorde Tytos interpôs-se entre uma leoa e a sua presa. A leoa estava se cagando por ser o próprio símbolo dos Lannister. Rasgou o cavalo do meu senhor às dentadas e teria dado cabo também do senhor, mas meu avô chegou com os cães de caça. Três dos seus cães morreram ao afugentá-la. Meu avô perdeu uma perna, por isso o Lannister pagou-lhe com terras e uma casa-torre e tomou seu filho como escudeiro. Os três cães no nosso estandarte são os três que morreram, no amarelo da grama de outono. Um cão de caça morrerá por você, mas nunca mentirá a você. E olhará diretamente no seu rosto – agarrou-a pelo queixo, erguendo-o, com os dedos beliscando-a dolorosamente. – E isso é mais do que os passarinhos podem fazer, não é? Não cheguei a ouvir a minha canção.

– Eu… eu sei uma canção sobre Florian e Jonquil.

– Florian e Jonquil? Um idiota e a sua boceta. Poupe-me. Mas um dia vou conseguir uma canção de você, quer queira quer não.

– Cantarei de bom grado.

Sandor Clegane fungou.

– Coisinha linda, e tão má, mentirosa. Um cão consegue farejar uma mentira, você sabe. Olhe em volta e dê uma boa cheirada. Aqui são todos mentirosos… e todos eles são melhores do que você.

Arya

Quando subiu até o galho mais alto, Arya conseguiu ver chaminés espreitando por entre as árvores. Telhados de sapé aglomeravam-se ao longo das margens do lago e do pequeno riacho que nele desaguava, e um embarcadouro de madeira projetava-se pela água ao lado de um longo edifício baixo com telhado de ardósia.

Arrastou-se mais para a frente, até o galho começar a ceder sob seu peso. Não havia barcos amarrados ao embarcadouro, mas conseguia ver finos anéis de fumaça que se erguiam de algumas das chaminés e parte de uma carroça que se mostrava por detrás de um estábulo.

Tem alguém ali. Arya mordeu o lábio. Todos os outros lugares a que tinham chegado estavam vazios e desolados. Quintas, aldeias, castelos, septos, celeiros, não fazia diferença. Se pudesse arder, os Lannister tinham posto fogo; se pudesse morrer, tinham matado. Tinham incendiado a floresta até onde puderam, embora as folhas ainda estivessem verdes e úmidas de chuvas recentes e os incêndios não tivessem se espalhado.

– Se pudessem, teriam queimado o lago – Gendry dissera, e Arya sabia que ele tinha razão. Na noite da fuga, as chamas da vila incendiada tinham brilhado tanto na água, que parecia que o lago estava ardendo.

Quando, por fim, reuniram coragem para se esgueirar de volta às ruínas na noite seguinte, nada restava, a não ser pedras enegrecidas, as cascas vazias de casas e cadáveres. Em alguns lugares, fiapos de fumaça branca ainda subiam das cinzas. Torta Quente tinha insistido com eles para que não regressassem; Lommy chamara-os de loucos e jurara que Sor Amory os apanharia e os mataria também, mas Lorch e seus homens já tinham partido havia muito quando chegaram ao castro. Encontraram os portões arrombados, as muralhas parcialmente demolidas e o interior polvilhado de mortos por enterrar. Uma olhadela tinha sido o bastante para Gendry:

– Foram mortos, todos eles. E cães também estiveram aqui, olhem.

– Ou lobos.

– Cães, lobos, não faz diferença. Isso aqui acabou.

Mas Arya não quis partir até encontrarem Yoren. Não podiam tê-lo matado, dissera a si mesma, ele era duro e rígido demais e, além disso, um irmão da Patrulha da Noite. Tinha dito isto a Gendry enquanto procuravam por entre os cadáveres.

O golpe de machado que o matara abriu seu crânio, mas a grande barba emaranhada não podia pertencer a mais ninguém e o vestuário também, remendado, sujo, e tão desbotado que era mais cinza do que negro. Sor Amory Lorch não perdera mais tempo enterrando seus mortos do que aqueles que tinha assassinado, e os cadáveres de quatro homens de armas Lannister estavam empilhados perto do de Yoren. Arya perguntou-se quantos teriam sido necessários para abatê-lo.

Ele ia me levar para casa, ela pensou enquanto escavavam a cova do velho. Havia mortos demais para enterrar todos, mas Arya insistira que pelo menos Yoren tinha de ter uma sepultura. Ele prometeu que ia me levar a salvo para Winterfell. Uma parte de si quis chorar, a outra, chutá-lo.

Foi Gendry quem pensou na casa-torre do senhor e nos três que Yoren enviara para defendê-la. Tinham sido atacados também, mas a torre redonda tinha apenas uma entrada, uma porta no segundo andar à qual se chegava por uma escada. Uma vez a escada puxada para dentro, os homens de Sor Amory não podiam chegar até eles. Os Lannister tinham empilhado galhos em volta da base da torre e colocado fogo, mas a pedra não ardia, e Lorch não tivera paciência nem quis levá-los para passar fome. Cutjack abriu a porta ao grito de Gendry e, quando Kurz disse que era melhor continuarem para norte do que voltar, Arya agarrou-se à esperança de que ainda pudesse chegar a Winterfell.