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"Resposta errada", berrou o oficial da VEVAK. "Vou repetir a pergunta. O que estava o senhor a fazer no Ministério da Ciência e Tecnologia à uma da manhã?"

O recluso manteve-se calado.

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"Responda!"

Silêncio.

Nova pancada, agora um murro desferido no lado direito da cabeça com tal violência que Tomás se desequilibrou do banco e tombou para o lado esquerdo com um gemido atordoado, estendendo-se espalhafatosamente no chão, os braços ainda algemados nas costas.

"Eu... vocês... vocês", titubeou, atarantado, sentindo uma face da cara a latejar com o impacto, a outra a colar-se à pedra fria.

"Vocês não têm o direito de me fazer isto. Eu vou protestar. Vou queixar-me, ouviu?"

O coronel soltou uma gargalhada.

"Vai queixar-se?", perguntou, visivelmente divertido. "Vai queixar-se a quem? Uh?

À sua mãezinha?"

"Vocês não podem fazer isso. Eu tenho o direito de contactar um diplomata europeu."

Mãos fortes pegaram em Tomás e atiraram-no de novo para o banco de escola.

"Você não tem direitos nenhuns, já lhe disse", vociferou o coronel. "O seu único direito aqui é o de dizer a verdade, percebeu? A verdade! A verdade libertá-lo-á! A salvação através da verdade. É esse o nosso lema, é esse o lema da VEVAK. A salvação através da verdade. Conte-nos a verdade e isso será levado em linha de conta na hora da decisão. Ajude-nos a encontrar os inimigos da República Islâmica e será premiado.

Mais do que isso, será salvo. A salvação através da verdade. Mas, se persistir em manter-se calado, vai arrepender-se amargamente." Baixou o tom de voz, de modo a torná-la quase doce, sedutora. "Ouça o que eu lhe digo. O senhor cometeu um erro, é certo. Mas ainda vai a tempo de o emendar. Garanto-lhe isso. Afinal de contas, todos nós cometemos erros, não é verdade? O que é grave é se persistirmos no erro. Isso é que é grave, percebe?" Adoçou ainda mais a voz, tornou-se quase íntimo. "Ouça, fazemos já aqui uma combinação entre nós os dois. O senhor conta-me tudo e eu faço um relatório muito positivo sobre si. Repare, nós não temos nada contra si, não é? Por que razão lhe iríamos fazer mal? Apenas queremos que nos ajude a detectar os nossos inimigos. Está a ver como é simples? O senhor ajuda-nos, nós ajudamo-lo. Uh? O que me diz?"

"Terei muito gosto em ajudá-lo", disse Tomás, preparando-se para uma nova pancada a qualquer momento. "Mas entenda que eu primeiro tenho de falar com um diplomata da União Européia. Preciso de saber quais são os meus direitos, quero conhecer qual a acusação formada contra mim e gostaria de passar uma mensagem à minha família. Além disso, preciso de arranjar um advogado. Como vê, não estou a pedir nada de mais."

O coronel fez uma pausa, como se estivesse a ponderar o pedido.

"Deixe-me ver se percebo", disse o oficial da VEVAK. "Se nós lhe facilitarmos acesso a um diplomata europeu, você conta-nos tudo, é?"

Tomás hesitou.

"Uh... sim, claro... conto-vos tudo em função... uh... dos conselhos do diplomata e do que disser o meu advogado, claro."

O coronel Kazemi manteve-se calado. O recluso ouviu o som de um fósforo a ser aceso e sentiu, instantes depois, o cheiro acre de um cigarro ateado.

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"Você deve pensar que somos parvos", comentou Kazemi por entre dois bafos de fumo. "Por que motivo iríamos nós alertar a União Européia para a sua situação sem ter a garantia de que receberíamos algo em troca? Ninguém no mundo sabe onde você se encontra e não temos interesse nenhum em alterar essa situação. A menos que você nos dê um motivo válido, claro."

"Que motivo?"

"Por exemplo, contando-nos tudo. Olhe, podemos começar com uma dúvida que eu tenho, relativamente ao indivíduo que estava consigo. Quem era ele exatamente?"

Esta pergunta levou Tomás a concluir nesse instante que Bagheri provavelmente tinha morrido. Por um lado, se o coronel não sabia qual a identidade de Bagheri era porque o homem da CIA se calara, talvez para sempre; e, por outro, o oficial usara o pretérito para se referir a Bagheri, o que lhe parecia revelador.

O historiador resolveu testar o interrogador.

"Por que não lhe perguntam diretamente?"

Kazemi pareceu momentaneamente desconcertado com a pergunta, o que, em si, constituiu uma forma de resposta.

"Uh... porque...", gaguejou, antes de se recompor. "Ouça, aqui quem faz as perguntas sou eu, ouviu?"

Silêncio.

"Ouviu?"

"Sim."

O coronel aspirou mais uma lufada do cigarro.

"Você é da CIA."

Tomás percebeu que o oficial tinha mudado de tática, para o surpreender, e que não poderia hesitar neste ponto crucial.

"Está a perguntar ou está a afirmar?"

"Estou a afirmar. Você é da CIA."

"Disparate."

"Temos provas."

"Ah, sim? Como é que se pode ter provas de uma fantasia?"

"O seu amigo falou."

"Falou, é? E disse que era da CIA?"

"Sim. Contou-nos tudo sobre si."

Tomás forçou-se a fazer um sorriso.

"Se contou tudo sobre mim, então estou mais descansado. Eu não tenho nada a ver com política, sou apenas um acadêmico e vocês sabem-no."

"Você é um espião. Você é um espião que veio ao Irã para nos roubar o segredo da bomba atômica."

Kazemi estendeu aqui uma nova armadilha, mas não foi muito hábil e Tomás pressentiu-o.

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"O segredo da bomba atômica?", perguntou, com o ar mais admirado que foi capaz de encenar. "Ena, onde é que isso já vai! Nunca ninguém me falou de bomba atômica alguma, ouviu? Deve haver aqui um engano qualquer. Eu não vim cá para roubar coisa nenhuma. Eu fui convidado, percebe? Eu vim cá para ajudar o Irã a decifrar um documento científico, mais nada. Que história é essa da bomba atômica?"

"Não se faça desentendido", retorquiu o coronel. "Você sabe muito bem do que eu estou a falar."

"Não sei, não. Nunca ouvi falar em tal coisa. O meu trabalho limita-se à decifração de um documento científico, mais nada. Foi para isso que fui contratado.

Nunca ninguém me falou em bombas atômicas ou tretas do gênero. E, se tivessem falado, eu nem aceitaria estar aqui, percebeu? Portanto, não se ponha para aí a inventar coisas que não existem."

"Veio cá decifrar um documento científico, é? Então por que razão foi às escondidas ao ministério tirar aquele documento do cofre, uh? Por que razão?"

"Aquele não é um documento militar, já lhe disse. É um documento científico.

Pergunte ao ministro da Ciência, se quiser. O senhor é que está a fantasiar e a ver conspirações onde elas não existem."

"O ministro já nos disse que, dada a natureza do documento em questão, você só podia estar a espiar."

"Eu? A espiar? Que coisa mais ridícula! Admito que tinha curiosidade em ver aquele documento científico, isso é verdade. Mas era curiosidade científica, apenas isso. Eu sou um cientista e é muito natural que queira ver uma relíquia científica, não acha?"

"O ministro não lhe chamou relíquia."

"Então chamou-lhe o quê?"

"Chamou-lhe um documento da mais alta importância para a segurança do Irã."

Aproximou-se do recluso e segredou-lhe ao ouvido. "Chamou-lhe um segredo de Estado."

"Isso é ridículo", protestou Tomás. "Aquilo é um documento científico. Pelo menos foi isso o que ele sempre me disse e nunca tive razões para duvidar de tal." Alterou o tom de voz, tentando parecer muito razoável. "Ouça, se fosse mesmo um segredo de Estado, acha que me contratavam a mim para o decifrar? Hã? Acha? Então não arranjavam aqui gente capaz de o fazer? Por que razão iriam buscar um ocidental para decifrar um documento tão sensível?"