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"Einstein acreditava que o Antigo Testamento escondia a prova de Deus?"

"Não."

Tomás olhou para Tenzing, baralhado.

"Desculpe, não estou a entender. Julgava que tinha dito que Einstein achava que a Bíblia ocultava esse segredo."

"Ele começou por acreditar nisso, sim."

"E depois deixou de acreditar?"

"Não."

"Então? Não percebo..."

"O que aconteceu foi que o assunto deixou de ser matéria de crença."

"Como assim?"

"Einstein descobriu essa prova."

Fez-se um silêncio breve, com Tomás a digerir a implicação desta revelação.

"Ele descobriu a prova?"

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"Sim."

"A prova da existência de Deus?" sim.

"Tem a certeza?"

"Absoluta. Ele encontrou a fórmula na qual assenta tudo. A fórmula que gera o universo, que explica a existência, que faz de Deus o que Ele é."

Tomás e Ariana entreolharam-se. A iraniana fez uma expressão admirada, mas não teceu quaisquer comentários. O historiador voltou a fitar o velho tibetano.

"E onde está essa fórmula?"

"No manuscrito."

"No Die Gottesformel”.

"Sim."

Tomás voltou a mirar Ariana. A mulher encolheu os ombros, como se dissesse que não tinha encontrado nada quando lera o documento.

"Em que sítio do manuscrito?"

"Encontra-se escondido."

O historiador esfregou o queixo, pensativo.

"Mas por que razão Einstein escondeu isso? Não acha que, se ele descobriu mesmo a prova da existência de Deus, a coisa mais natural era que a divulgasse aos quatro ventos? Por que motivo haveria ele de ocultar uma descoberta tão... tão extraordinária?"

"Porque precisava ainda de confirmar algumas coisas."

"Confirmar o quê?"

Tenzing respirou fundo.

"Todo este trabalho decorreu entre 1951 e 1955, ano em que Einstein morreu. O

problema é que as tais frequências de luz geradas pelo Big Bang não passavam, nessa altura, de uma mera previsão teórica feita pouco tempo antes, em 1948. Como poderia o autor das teorias da Relatividade afirmar peremptoriamente que os seis dias da Criação correspondiam aos quinze mil milhões de anos da existência do universo se as contas se baseavam na previsão de umas frequências cuja existência se limitava a uma mera hipótese académica? Além do mais, naquela altura nem existiam cálculos tão rigorosos sobre a idade do universo como os que temos hoje disponíveis. Não se esqueça, por outro lado, de que a comunidade científica dessa época colocava a teoria do Big Bang em pé de igualdade com a teoria do universo eterno. Assim sendo, como poderia Einstein arriscar a sua reputação?"

Tomás balançou afirmativamente a cabeça.

"Estou a entender..."

"Einstein achou que não podia cair no ridículo e foi por isso que tomou duas precauções. A primeira foi deixar todas as suas descobertas registadas num manuscrito que designou Die Gottesformel. Com receio de que o documento caísse em mãos erradas, porém, teve o cuidado de encriptar subtilmente o texto, de modo a impedir que qualquer outra pessoa, que não eu ou o Augusto, entendesse o 271

documento. Como medida adicional, cifrou explicitamente a prova da existência de Deus, utilizando um sistema de dupla cifra."

"Dupla cifra?"

"Sim."

"E qual a chave?"

Tenzing abanou a cabeça.

"Não sei", disse. "Apenas sei que a primeira chave está relacionada com o seu nome."

"Com o nome de Einstein?"

"Sim."

"Hmm", murmurou Tomás, refletindo sobre esta informação. "Terei de ver isso com atenção." Voltou a cravar os olhos no tibetano. "E onde está essa mensagem cifrada? É aquela charada que se encontra redigida perto do final do manuscrito?"

"Sim."

"Aquela que diz see sign e mais uma data de letras?"

"Essa mesmo."

"São seis letras em dois grupos, começando com um ponto de exclamação", lembrou Ariana, que tinha a sequência memorizada. "!Ya ovqo."

"Deve ser isso", admitiu Tenzing. "Não me lembro bem, como devem calcular. Já se passaram muitos anos."

"Eu entendo", disse Tomás. "Foram essas, portanto, as cautelas que ele teve?"

"Não", respondeu o tibetano. "A encriptação do segredo foi apenas a primeira precaução. Einstein não queria correr riscos e, ao entregar-nos o manuscrito, fez-nos assumir um segundo compromisso. O documento só poderia ser revelado se a teoria do Big Bang viesse a ser confirmada e as frequências de luz primordiais descobertas.

Para além disso, requeria que nós continuássemos as pesquisas para procurar uma outra via de confirmação da existência de Deus."

"Uma outra via? Qual via?"

"Cabia-nos a nós encontrá-la", retorquiu Tenzing. "Lao Tzu disse: quando um caminho chegar a um termo, muda — depois de mudares, continuas em frente."

"Isso significa o quê?"

"Que eu e o Augusto seguimos caminhos diferentes para chegar ao mesmo destino. Depois de Einstein morrer, eu regressei ao Tibete e vim aqui para o mosteiro de Tashilhunpo, onde explorei a minha via de confirmação da existência de Deus.

Após uma vida de meditação, alcancei a luz. Fundi-me com a Dharmakaya e tornei-me bodbisattva."

"E o professor Siza?"

"O Augusto seguiu o seu caminho. Ficou ele com o manuscrito e explorou ele a sua via de confirmação da existência de Deus."

"Que via era essa?"

"A via do Augusto era a via da ciência ocidental, claro. A via da física e da matemática."

"E o que aconteceu depois?"

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Tenzing sorriu.

"Os requisitos de Einstein para a divulgação do manuscrito foram finalmente satisfeitos."

"Ah, sim? O que quer dizer com isso?"

"O primeiro passo ocorreu dez anos depois da morte de Einstein. Em 1965, dois astrofísicos americanos estavam a testar uma antena de comunicações de New Jersey quando depararam com um sopro de fundo proveniente de todos os pontos do universo. Julgaram que se tratava de uma avaria da antena, mas, após contactarem uma equipa de cientistas da Universidade de Princeton, perceberam finalmente o que era esse sopro. Tratava-se da luz primordial prevista na teoria do Big Bang e utilizada por Einstein para o cálculo da idade do universo. Esse fenómeno designa-se, hoje em dia, radiação cósmica de fundo e constitui o registo em microondas da primeira luz emitida pelo universo que chegou até nós. É uma espécie de eco do Big Bang, mas pode servir também de relógio cósmico."

"Já ouvi falar nisso", disse Tomás, reconhecendo a história. "Não é o tal ruído de fundo que aparece num ecrã de televisão quando o aparelho não está sintonizado em qualquer canal?"

"Sim", confirmou o tibetano. "Um por cento desse ruído provém da radiação cósmica de fundo."

"Portanto, com a descoberta da luz primordial, ficaram criadas as condições para a divulgação do manuscrito..."

"Não. Ficou satisfeita apenas a primeira condição. Faltava a segunda."

"A descoberta de uma segunda via de prova da existência de Deus?"

"Sim." Tenzing pousou a mão no peito. "Através do óctuplo caminho sagrado do Buda, eu segui a minha via e satisfiz essa condição."

"E o professor Siza?"

"Ele seguiu a sua via na Universidade de Coimbra."

"E satisfez a segunda condição?"

O bodhisattva esperou um instante antes de responder.

"Sim", disse por fim.

Tomás e Ariana inclinaram-se para a frente, muito atentos.

"Desculpe", disse o historiador. "Está-me a dizer que o professor Siza arranjou uma segunda maneira de provar a existência de Deus?"