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Egwene ficou chocada ao perceber uma ânsia de fazer o que Renna ordenava. Não canalizava, nem sequer tocava saidar, havia dois dias. O desejo de preencher a si mesma com o Poder Único lhe deu um calafrio.

— Eu… — Na mesma hora ela descartou o “não vou”: os vergões que não estavam lá ainda queimavam com intensidade demais para que ela agisse de forma tão tola — … não consigo — finalizou, em vez disso. — É muito longe, e nunca fiz isso antes.

Uma das sul’dam soltou uma gargalhada estrondosa, e Alwhin falou:

— Ela nem tentou.

Renna sacudiu a cabeça, quase triste.

— Quando alguém já foi sul’dam por tempo suficiente — disse a Egwene —, consegue saber muito sobre as damane, mesmo sem estarem ligadas pelo bracelete. Com ele, no entanto, é sempre possível saber se uma damane tentou canalizar. Você não deve mentir para mim, nunca, e nem para qualquer sul’dam, não importa quão pequena a mentira seja.

De repente os golpes invisíveis voltaram, atingindo seu corpo todo. Gritando, ela tentou atacar Renna, mas a sul’dam aparou seu soco, e Egwene sentiu como se Renna tivesse acertado seu braço com um porrete. Ela cravou os calcanhares nos flancos de Bela, mas a corrente que a sul’dam segurava quase a arrancou da sela. Ela buscou saidar, desesperada. Queria ferir Renna o suficiente para fazê-la parar, devolver o mesmo tipo de sofrimento que ela lhe causara. A sul’dam sacudiu a cabeça amargamente. Egwene uivou quando sentiu a pele ser escaldada. O ardor só começou a diminuir quando ela abandonou saidar, mas os golpes invisíveis sequer diminuíram. Egwene tentou gritar que tentaria obedecer, caso Renna parasse, mas tudo que conseguia era berrar e se contorcer.

Estava vagamente ciente de Min gritando, furiosa, e tentando cavalgar para perto dela. De Alwhin arrancando as rédeas de Min das mãos da menina, e de outra sul’dam falando de um jeito ríspido com sua damane, que olhou para Min. Então Min também começou a gritar e se debater como se tentasse se defender de golpes invisíveis ou afastar insetos que a picavam. Em sua própria dor, Min parecia distante.

Os gritos das duas foram suficientes para fazer alguns dos soldados se virarem nas selas. Depois de uma rápida olhadela, eles riam e voltavam a olhar para a frente. A forma que as sul’dam lidavam com as damane não era assunto deles.

Para Egwene, pareceu durar uma eternidade, mas o castigo chegou ao fim, finalmente. Ela jazia esparramada sobre a patilha da sela, com o rosto banhado em lágrimas, soluçando na crina de Bela. A égua relinchava, nervosa.

— É bom que tenha personalidade forte — comentou Renna, muito calma. — As melhores damane são as que têm uma personalidade forte para ser esculpida e moldada.

Egwene fechou os olhos com força. Queria poder fechar os ouvidos, também, para calar a voz de Renna. Preciso fugir. Preciso, mas como? Nynaeve, me ajude. Luz, alguém me ajude.

— Você vai ser uma das melhores — comentou Renna, em uma voz satisfeita. Ela acariciou os cabelos de Egwene como uma dona consolando seu cachorro.

Nynaeve se inclinou na sela para olhar em volta da cobertura de moitas de folhas espinhosas. Seus olhos encontraram árvores esparsas, algumas com folhas que começavam a mudar de cor. As áreas de grama e moitas entre elas pareciam vazias. Nada se movia, pelo que ela podia ver, exceto a coluna de fumaça da folha-de-couro que se afinava, levada pela brisa.

Aquilo fora obra dela, a folha-de-couro. E também um raio no céu limpo, assim como algumas outras coisas que nunca pensara em tentar até aquelas duas mulheres usarem contra ela. Achava que elas deviam trabalhar juntas de algum jeito, embora não conseguisse entender a relação de uma com a outra. Pareciam estar acorrentadas. Uma delas usava uma coleira, mas a outra não parecia tão acorrentada quanto a primeira. O que Nynaeve sabia com certeza era que uma delas era Aes Sedai, ou ambas. Não conseguira vê-las com clareza para reparar no brilho da canalização, mas tinha que ser isso.

Ah, vai ser um prazer contar isso a Sheriam , pensou, seca. Aes Sedai não usam o Poder Único como arma, não é?

Ela usara. No mínimo tinha derrubado as duas mulheres com aquele raio, e vira um dos soldados, ou seu cadáver, queimado por uma bola de fogo que arremessara contra eles. Mas não via os estranhos já fazia algum tempo.

O suor escorria por sua testa, e não era apenas pelo esforço. O contato com saidar se fora, e ela não conseguia trazê-lo de volta. Na fúria por saber que Liandrin as traíra, saidar surgira quase antes de ela perceber que o Poder Único a inundava. Era como se pudesse fazer qualquer coisa. E, enquanto a perseguiam, a fúria por estar sendo caçada como um animal a alimentara. A perseguição havia terminado. Quanto mais tempo ficara sem ver um inimigo que pudesse atacar, mais Nynaeve começara a se preocupar com a possibilidade de sofrer algum tipo de emboscada, e mais tempo tinha para se preocupar com o que estava acontecendo com Egwene, Elayne e Min. Naquele momento, era forçada a admitir que o que mais sentia era medo. Medo por elas, medo por si mesma. Era de raiva que precisava.

Alguma coisa se mexeu atrás de uma árvore.

Ela perdeu o fôlego e buscou saidar, em desespero, mas todos os exercícios que Sheriam e as outras haviam ensinado, todos os brotos desabrochando em sua mente, todos os cursos d’água imaginários que ela continha como as margens, tudo aquilo de nada adiantava. Conseguia senti-la, sentir a Fonte, mas não conseguia tocá-la.

Elayne saiu de trás da árvore, agachada e temerosa, e Nynaeve afundou em sua sela, aliviada. O vestido da Filha-herdeira estava sujo e rasgado, seu cabelo dourado era um emaranhado de nós e folhas, e seus olhos atentos estavam tão grandes quanto os de uma corça assustada, mas ela empunhava uma adaga curta com a mão firme. Nynaeve puxou as rédeas, saindo de trás das moitas.

Elayne sobressaltou-se. Então, levou a mão ao pescoço e respirou fundo. Nynaeve desmontou e as duas se abraçaram, confortando-se em terem encontrado uma à outra.

— Por um momento — disse Elayne, quando o abraço terminou —, achei que você fosse… Você sabe o que eles são? Tinha dois homens me seguindo. Mais alguns minutos e eles teriam me capturado, porém uma trombeta soou e eles deram meia-volta com os cavalos e foram embora, galopando. Eles conseguiam me ver, Nynaeve, e apenas foram embora.

— Eu também ouvi, e não vi nenhum deles desde então. Você viu Egwene ou Min?

Elayne balançou a cabeça, sentando-se no chão.

— Não desde que… Aquele homem bateu em Min, ele a derrubou. E uma daquelas mulheres estava tentando prender alguma coisa no pescoço de Egwene. Vi isso tudo antes de correr. E acho que elas não escaparam, Nynaeve. Eu devia ter feito alguma coisa. Min esfaqueou a mão que estava me segurando, e Egwene… Eu só corri, Nynaeve. Percebi que estava livre e corri. É melhor minha mãe se casar com Gareth Bryne e ter outra ilha assim que puder. Eu não sou digna de assumir o trono.

— Não seja ingênua — respondeu Nynaeve, severa. — Lembre-se de que eu tenho um pacote de raiz de língua-de-ovelha no meio das minhas ervas. — Elayne estava com a cabeça enterrada nas mãos. Aquele sermão não gerou sequer um murmúrio em resposta. — Ouça o que eu digo, garota. Você me viu ficar para enfrentar vinte ou trinta homens armados, sem falar nas Aes Sedai? Se tivesse ficado, é muito mais provável que também tivesse sido pega. Isso se eles não resolvessem matar você. Eles pareciam estar mais interessados em mim e em Egwene, por algum motivo. Talvez não se importassem se você permaneceria viva ou não. — Por que estão interessados em mim e na Egwene? Por que nós, em especial? Por que Liandrin fez isso? Por quê? Não tinha mais respostas naquele momento do que na primeira vez em que se fizera aquelas perguntas.