dias, e quase não dormira uma hora desde o
desaparecimento de Arya. Naquela manhã estivera tão
desanimado e cansado que quase não conseguira se
levantar, mas agora tinha no corpo sua fúria, enchendo -o
de força.
Homens o chamaram quando atravessou o pátio do
castelo, mas, em sua pressa, Ned os igno rou. Teria
corrido, mas ainda era a Mão do Rei, e uma Mão deve
manter a dignidade. Estava cons ciente dos olhares que o
seguiam, das vozes murmuradas que interrogavam sobre o
que ele faria,
O castelo era um modesto domínio a meio dia de viagem
para sul do Tridente. A comitiva real impusera -se como
um hóspede não convidado do senhor do domínio, Sor
Raymun Darry, enquanto eram conduzidas as buscas por
Arya e pelo filho do carnicei ro em ambas as margens do
rio. Não eram visitantes bem -vindos. Sor Raymun vivia
sob a paz do rei, mas a família lutara no Tridente pelos
estandartes do dragão de Rhaegar, e os três irmãos mais
velhos tinham mor rido ali, uma verdade que nem Robert
nem Sor Raymun tinham esquecido. Com os homens do
rei, os de Darry, os dos Lannister e os dos Stark, todos
apinhados num castelo que era muito menor que o
necessário para recebê -los juntos, as tensões ardiam
quentes e pesadas.
O rei apropriara-se da sala de audiências de Sor Raymun,
e foi aí que Ned os encontrou. A sala estava cheia de
gente quando entrou num impulso. Demasiado cheia,
pensou; a sós, ele e Robert poderiam ser capazes de tratar
o assunto de forma amigável.
Robert estava afundado na cadeira alta de Da rry, na
extremidade mais distante da sala, com uma expressão
fechada e carrancuda. Cersei Lannister e o filho
encontravam-se em pé ao seu lado. A rainha tinha a mão
pousada no ombro de Joffrey, Espessas ataduras de seda
ainda cobriam o braço do rapaz.
Arya estava no centro da sala, só com Jory Cassei, com
todos os olhos pousados nela.
- Arya - chamou Ned em voz alta. E foi falar com ela,
fazendo ressoar as botas no chão de pedra. Quando o viu,
ela gritou e começou a soluçar.
Ned caiu sobre um joelho e a to mou nos braços. Ela
tremia.
- Lamento - soluçou -, lamento, lamento.
- Eu sei - ele disse, Ela parecia tão minúscula nos seus
braços, nada mais que uma menininha magricela. Era
difícil compreender como causara tantos problemas. - Está
ferida?
- Não - seu rosto estava sujo, e as lágrimas deixaram
trilhos cor-de-rosa nas bochechas. - Tenho alguma fome.
Comi umas frutinhas, mas não havia mais nada.
- Em breve a alimentaremos - prometeu Ned, erguendo-se
para encarar o rei. - O que significa isto? - seus olhos
varreram a sala em busca de rostos amistosos. Sem contar
com seus homens, eram muito poucos. Sor Raymun Darry
reservava bem a expressão. Lorde Renly ostentava um
meio sorriso que podia significar qualquer coisa, e o velho
Sor Barristan tinha uma expressão grave; o resto eram
homens dos Lannister, hostis. Sua única sorte era que
tanto Jaime Lannister como Sandor Clegane não se
encontravam ali, porque ainda dirigiam buscas a norte do
Tridente, - Por que motivo não fui avisado de que minha
filha foi encontrada? - Ned exigiu saber, fazendo a voz
ressoar. - Por que não me foi trazida de imediato?
Falava para Robert, mas foi Cersei Lannister quem
respondeu.
- Como ousa falar assim ao seu rei?
Ao ouvir aquilo, o rei agitou -se.
- Silêncio, mulher - ele a silenciou. Endireitou-se no
assento. - Lamento, Ned. Não quis assustar a menina.
Pareceu melhor trazê -la aqui e despachar o assunto
rapidamente.
- E que assunto é este? - Ned tinha a voz gelada.
A rainha deu um passo à frente.
- Sabe perfeitamente bem, Stark. Esta sua meni na atacou
meu filho. Ela e o filho de carni ceiro. Aquele animal que
ela tem tentou arrancar o braço de Joffrey.
- Isso não é verdade - disse Arya em voz alta. - Ela só o
mordeu um pouco. Ele estava fazendo mal a Mycah.
- Joff contou-nos o que aconteceu - disse a rainha. - Você
e o filho do carniceiro bateram nele com paus enquanto
você atiçava o lobo.
- Não foi assim que as coisas se passaram - disse Arya, de
novo perto das lágrimas. Ned pôs-lhe a mão no ombro.
- Foi, sim, senhora! - insistiu Príncipe Joffrey. - Todos me
atacaram, e ela atirou a Dente de Leão ao rio! - Ned
reparou que ele sequer olhava para Arya enquanto falava.
- Mentiroso! - gritou Arya.
- Cale-se! - gritou o príncipe.
- Basta! - rugiu o rei, erguendo-se da cadeira, com a voz
carregada de irritação. Ca iu o silêncio. Robert lançou um
olhar ameaçador a Arya.
- E agora, criança, vai me contar o que aconteceu. Vai
contar tudo, e somente a verdade. Men tir a um rei é um
grande crime - depois olhou para o filho. - Quando ela
acabar, será a sua vez. Até lá, ten ha cuidado com a língua.
Quando Arya começou sua história, Ned ouviu a porta
abrir atrás de si, olhou de relance por cima do ombro e
viu Vayon Poole entrar com Sansa. Ficaram em silêncio no
fundo da sala enquanto Arya falava. Quando chegou à
parte em que atirava a espada de Joffrey no meio do
Tridente, Renly Baratheon desatou a rir. O rei ficou
irritado.
- Sor Barristan, escolte meu irmão para fora da sala antes
que se engasgue.
Lorde Renly abafou o riso.
- Meu irmão é demasiado bondoso. Eu consigo encontr ar
a porta sozinho - fez uma reverência a Joffrey. - Talvez
mais tarde tenha oportunidade de me contar como foi que
uma menina de nove anos e do tamanho de um rato -dagua
conseguiu desarmá-lo com um pau de vassoura e atirar
sua espada ao rio - quando a porta se fechava atrás dele,
Ned o ouviu dizer: - Dente de Leão - e soltar outra
gargalhada.
Príncipe Joffrey estava pálido ao iniciar sua versão muito
diferente dos acontecimentos. Quando o filho acabou de
falar, o rei ergueu-se pesadamente da cadeira com um a
expressão de quem queria estar em qualquer lugar, menos
ali.
- O que, com todos os sete infernos, devo eu pensar? Ele
diz uma coisa e ela, outra.
- Eles não eram os únicos presentes - disse Ned. - Sansa,
venha cá - Ned ouvira sua versão da história na noite em
que Arya desaparecera. Conhecia a verdade. - Conte-nos o
que se passou.
A filha mais velha deu um passo hesitante à frente. Vestia
veludo azul debruado de branco e usava uma corrente de
prata em volta do pescoço. Os espessos cabelos ruivos
tinham sido escovados até brilharem. Olhou para a irmã, e
depois para o jovem príncipe.
- Não sei - disse com voz chorosa, com uma expressão de
quem queria fugir. - Não me lembro. Aconteceu tudo tão
depressa, não vi...
- Sua nojenta! - Arya guinchou. Saltou sobre a irmã como