uma seta, atirando Sansa ao chão, enchendo -a de socos. -
Mentirosa, mentirosa, mentirosa, mentirosa.
- Arya, pare com isso! - Ned gritou. Jory a puxou de cima da
irmã ainda agitando os braços. Sansa estava pálida e
tremendo quando Ned a colocou de novo em pé. - Está
machucada? - perguntou, mas ela estava de olhos fixos em
Arya e não pareceu ouvi-lo.
- A menina é tão selvagem como aquele seu animal
nojento - disse Cersei Lannister. - Robert, quero vê-la
punida.
- Sete infernos - praguejou Robert. - Cersei, olhe para ela.
É uma criança. Que quer que eu faça, que a chicoteie
pelas ruas? Com os diabos, as crianças lutam. Já acabou.
Não foi feito nenhum mal duradouro.
A rainha estava furiosa.
- Joff ficará com aquelas cicatrizes para o resto da vida.
Robert Baratheon olhou para o filho mais velho.
- Pois que fique. Talvez lhe ensinem uma lição. Ned, trate
de disciplinar sua filha. Eu farei o mesmo com meu filho.
- De bom grado, Vossa Graça - Ned respondeu, bastante
aliviado.
Robert começou a se afastar, mas a rain ha ainda não tinha
terminado.
- E o lobo gigante? - ela gritou para suas costas. - E o
animal que mordeu seu filho? O rei parou, virou -se,
franziu a sobrancelha.
- Tinha me esquecido do maldito lobo.
Ned pôde ver Arya ficar tensa entre os braços de Jory,
que falou rapidamente.
- Não encontramos nenhum sinal do lobo gigante, Vossa
Graça.
O rei não pareceu infeliz com a notícia.
- Não? Pois que assim seja.
A rainha ergueu a voz.
- Cem dragões de ouro ao homem que me trouxer sua
pele!
- Uma pele bem cara - resmungou Robert. - Não tomarei
parte disto, mulher. Bem pode comprar as suas peles com
o ouro dos Lannister.
A rainha o olhou com frieza.
- Eu não o imaginava capaz de tamanho avaro. O rei com
quem pensei casar -me teria disposto uma pele de lobo
sobre a minha cama antes de o sol se pôr.
O rosto de Robert escureceu de ira.
- Isso seria um belo truque sem um lobo.
- Nós temos um lobo - disse Cersei Lannister. Sua voz
estava muito calma, mas seus olhos verdes brilhavam de
triunfo.
Precisaram todos de um momento para compre ender suas
palavras, mas, quando consegui ram, o rei encolheu os
ombros, irritado.
- Como quiser. Que Sor Ilyn trate do assunto.
- Robert, não pode estar falando a sério - Ned protestou.
O rei não estava com disposição para mais discussões.
- Basta, Ned, não quero ouvir mais nada. Um lobo gigante
é um animal selvagem. Mais cedo ou mais tarde teria se
virado contra sua filha tal como o outro se virou contra
meu filho. Arranje-lhe um cão, ela ficará mais feliz assim.
Foi então que Sansa pareceu finalmente compreender.
Seus olhos estavam assustados ao dirigi -los para o pai.
- Ele não está falando da Lady, está? - ela viu a verdade
no rosto de Ned.
- Não - disse. - Não, a Lady não, a Lady não mordeu
ninguém, ela é boa...
- Lady não estava lá - gritou Arya em tom zang ado. -
Deixem-na em paz!
- Impeça-os - suplicou Sansa. - Não deixe que façam isto,
por favor, por favor, não foi a Lady, foi a Nymeria, foi
Arya, não podem, não foi a Lady, não deixe que eles
machuquem Lady, eu faço com que ela seja boa, prometo,
prometo... - começou a chorar.
Tudo o que Ned pôde fazer foi tomá -la nos braços e
consolá-la enquanto chorava. Olhou para o outro lado da
sala, para Robert. Seu velho amigo, mais próximo que um
irmão.
- Por favor, Robert. Pelo amor que me tem. Pelo amor que
tinha à minha irmã. Por favor. O rei olhou para eles por
um longo momento, depois virou -se para a mulher,
- Maldita seja, Cersei - disse com repugnância,
Ned pôs-se em pé, libertando-se gentilmente do abraço de
Sansa. Todo o cansaço dos últi mos quatro dias tinha
regressado.
- Então o faça, Robert - disse, numa voz fria e afiada
como aço. - Pelo menos, tenha a cora gem de fazê-lo.
Robert olhou para Ned com olhos baços e mortos, e saiu
sem uma palavra, com passos pesa dos como chumbo. O
silêncio encheu a sala.
- Onde está o lobo gigante? - perguntou Cersei Lannister
quando o marido saiu. Ao seu lado Príncipe Joffrey sorria.
- O animal está acorrentado ao lado da casa do portão,
Vossa Graça - respondeu relutante mente Sor Barristan
Selmy.
- Mande chamar Ilyn Payne.
- Não - disse Ned. - Jory, leve as meninas para os quartos
e me traga Gelo - as palavras tinham o gosto da bílis na
garganta, mas ele as forçou sair. - Se tem de ser feito, eu
o farei.
Cersei Lannister olhou-o com suspeita.
- Você, Stark? Isto é algum truque? Por q ue faria uma
coisa dessas?
Todos o olhavam, mas era o olhar de Sansa que cortava.
- Ela pertence ao Norte. Merece mais que um carrasco.
Saiu da sala com os olhos ardendo e os lamentos da filha
ecoando em seus ouvidos, e encontrou a cria de lobo
gigante onde a tinham acorrentado. Ned sentou -se a seu
lado por um momento.
- Lady - disse, saboreando o nome. Nunca prestara
grande atenção aos nomes que as crian ças tinham
escolhido, mas olhando -a agora compreendeu que Sansa
tinha escolhido bem. Era a menor da ninhada, a mais
bonita, a mais gentil e confiante. A loba o olhou com
brilhantes olhos dourados, e ele afagou -lhe o espesso pelo
cinzento.
Pouco tempo depois, Jory trouxe-lhe Gelo.
Quando acabou, disse:
- Escolha quatro homens e ordene que transportem o
corpo para o Norte. Enterrem-na em Winterfell.
- Toda essa distância? - perguntou Jory, espantado.
- Toda essa distância - Ned afirmou. - A mulher Lannister
nunca terá esta pele. Regressava à torre para se abandonar
por fim ao sono, quando Sandor Clegane e seus ca valeiros
atravessaram com estrondo o portão do castelo,
regressando de sua caçada.
Havia algo atirado sobre a garupa de seu cavalo de
batalha, uma forma pesada enrolada num manto
ensanguentado.
- Nenhum sinal da sua filha, Mão - disse o Cão de Caça
com voz áspera -, mas o dia não foi um desperdício
completo. Encontramos seu animalzinho de estimação -
esticou o braço para trás e atirou o fardo de cima do
cavalo, fazendo-o cair com um baque surdo à frente de
Ned.
Dobrando-se, Ned afastou o manto, temendo as palavras
que teria de encontrar para Arya, mas afinal não se
tratava de Nymeria. Era o filho do carniceiro, Mycah, com
o corpo coberto de sangue seco. Tinha sido quase cortado
ao meio, do ombro à cintura, por um terrível golpe dado
de cima.
- Você o matou de cima do cavalo - disse Ned.
Os olhos do Cão de Caça pareceram cintilar através do
aço daquele hediondo elmo em forma de cabeça de cão.
- Ele fugiu - olhou para a cara de Ned e soltou uma
gargalhada. - Mas não muito depressa.