bobos...
- Bobos temos com fartura - disse Lorde Renly.
O Grande Meistre Pycelle olhou para Mindinho e
perguntou:
- O tesouro suporta a despesa?
- Que tesouro? - respondeu Mindinho com um trejeito de
boca. - Poupe-me as tolices, Meistre. Sabe tão bem como
eu que o tesouro está vazio há anos. Terei de pedi r
dinheiro emprestado. Não há dúvida de que os Lannister o
adiantarão. Devemos atualmente ao Senhor Tywin cerca
de três milhões de dragões, que importam mais cem mil?
Ned ficou estupefato.
- Está dizendo que a Coroa tem uma dívida de três milhões
de peças de ouro?
- A Coroa tem uma dívida de mais de seis milhões de
peças de ouro, Lorde Stark. Os Lannis-ter são os maiores
credores, mas também pedimos emprestado a Lorde
Tyrell, ao Banco de Ferro de Bravos e a vários cartéis
mercantis de Tyrosh. Nos últimos tempos, tive de me
virar para a Fé. O Alto Septão é pior no regateio do que
um pescador de Dorne.
Ned estava horrorizado.
- Aerys Targaryen deixou um tesouro repleto de ouro.
Como pôde deixar que isto acontecesse? Mindinho
encolheu os ombros.
- O mestre da moeda arranja o dinheiro. O rei e a Mão o
gastam.
- Não posso acreditar que Jon Arryn tenha permitido que
Robert reduzisse o reino à miséria - exclamou Ned em
tom acalorado.
O Grande Meistre Pycelle abanou a grande cabeça calva,
fazendo tilintar as correntes suavemente.
- Lorde Arryn era um homem prudente, mas temo que Sua
Graça nem sempre escute con selhos sábios.
- Meu real irmão adora torneios e festins - disse Renly
Baratheon -, e abomina aquilo a que chama "contar
cobres".
- Falarei com Sua Graça - disse Ned. - Este torneio é uma
extravagância que o reino não pode pagar.
- Fale com ele como quiser - disse Lorde Renly -, mas
ainda assim temos de fazer nossos planos.
- Outro dia - disse Ned. Talvez de forma muito incisiva, a
julgar pelos olhares que lhe lança ram. Teria de se
recordar de que já não estava em Winterfell, onde apenas
o rei tinha uma posi ção superior; ali, não era mais que o
primeiro entre iguais. - Perdoem-me, senhores - disse,
num tom mais suave. - Estou fatigado. Paremos por hoje e
recomecemos quando estivermos mais descansados - não
pediu o consentimento dos outros; em vez disso, levantou -
se abruptamente, fez a todos um aceno e dirigiu -se à
porta.
Lá fora, cavaleiros e carroças ainda jorravam através dos
portões do castelo, e o pátio era um caos de la ma, cavalos
e homens gritando. O rei ainda não chegara, disseram -lhe.
Desde os feios acontecimentos no Tridente, os Stark e sua
comitiva tinham viajado bem à frente da coluna prin cipal,
a fim de se distanciarem dos Lannister e da crescente
tensão. Robert quase não fora visto; dizia -se que viajava
na enorme casa rolante, mais frequentemente bêbado que
sóbrio. Se assim era, poderia estar várias horas atrasado,
mas mesmo assim chegaria cedo demais para a vontade de
Ned. Bastava-lhe olhar o rosto de Sansa para sentir a
raiva retorcer-se de novo dentro de si. A última quinzena
da viagem fora miserável. Sansa culpava Arya e dizia-lhe
que devia ter sido Nymeria a morrer. E Arya estava
desnorteada depois de saber o que havia acontecido ao
seu amigo, filho do carnic eiro. Sansa chorava até
adormecer, Arya cismava em silêncio o dia inteiro, e
Eddard Stark sonhava com um inferno gelado reservado
para os Stark de Winterfell.
Atravessou o pátio exterior e passou sob uma porta
levadiça, entrando no recinto do castelo, e, q uando se
encaminhava para aquilo que pensava ser a Torre da Mão,
Mindinho apareceu à sua frente.
- Está indo na direção errada, Stark. Venha comigo.
Hesitante, Ned o seguiu. Mindinho o levou até uma torre,
desceram uma escada, atravessa ram um pequeno pátio
rebaixado e caminharam por um corredor deserto onde
armaduras vazias montavam guarda ao longo das paredes.
Eram relíquias dos Targaryen, de aço negro com escamas
de dragão coroando os elmos, agora poeirentos e
esquecidos.
- Este não é o caminho para os me us aposentos - disse
Ned.
- E eu disse que era? Estou levando você para as
masmorras, a fim de abrir sua garganta e selar seu
cadáver atrás de uma parede - respondeu Mindinho, com
a voz sarcástica. - Não temos tempo para isto, Stark. Sua
esposa o espera.
- Que jogo está jogando, Mindinho? Catelyn está em
Winterfell, a centenas de léguas daqui.
- Ah! - os olhos cinza-esverdeados de Mindinho cintilaram
de divertimento. - Então parece que alguém conseguiu
realizar uma espantosa imitação. Pela última vez, venha.
Ou, então, não, e eu a guardo para mim - e apressou-se a
descer a escada.
Ned o seguiu, desconfiado, perguntando a si mesmo se
aquele dia chegaria ao fim. Não tinha nenhum gosto por
aquelas intrigas, mas começava a compreender que para
um homem como Mindinho elas eram naturais como o ar
que respirava.
Onde os degraus terminavam havia uma pesada porta de
carvalho e ferro. Petyr Baelish ergueu a tranca e, com um
gesto, indicou a Ned que a atravessasse. Saíram para o
avermelhado brilho do crepúsculo, numa falésia rochosa
bem acima do rio.
- Estamos fora do castelo - Ned observou.
- Você é um homem difícil de enganar, Stark - disse
Mindinho com um sorriso afetado.
- Foi o sol que o denunciou, ou terá sido o céu? Siga -me.
Há vãos abertos na rocha. Tente não cair para a morte,
Catelyn nunca compreenderia - e, ao acabar de falar,
estava para lá do limite da falésia, descendo depressa
como um macaco.
Ned estudou por um momento a face da escarpa, e depois
o seguiu mais devagar. Os nichos estavam lá, tal como
Mindinho prometera, ranhuras pouco profundas, invisíveis
na parte de baixo, a menos que se soubesse onde procurá -
las. O rio espraiava-se a uma longa e entontecedora
distância lá embaixo. Ned manteve o rosto pressionado
contra a rocha e tentou não olhar para baixo com mai s
frequência do que era obrigado.
Quando chegou finalmente ao fim da descida e a uma
estreita trilha enlameada que seguia pela margem do rio,
Mindinho espreguiçava-se encostado a uma rocha,
comendo uma maçã, já no caroço.
- Está ficando velho e lento, Star k - disse, atirando a
maçã, com indiferença, para a corrente,
- Não importa, o resto do caminho é a cavalo - tinha dois
cavalos à espera. Ned montou e trotou atrás dele, ao
longo da trilha, para a cidade.
Por fim, Baelish puxou as rédeas na frente de um ed ifício
que ameaçava ruir, de três andares de madeira, com
janelas que brilhavam com a luz das lâmpadas no lusco -
fusco que se aprofun dava. Os sons de música e risos
rudes abriam caminho até o exterior e flutuavam por