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respiração condensava-se à sua frente como um

estandarte. Enfiou as mãos embaixo dos braços e

caminhou mais depressa, rezando pa ra que Morrec se

tivesse lembrado de aquecer sua cama com tijolos quentes

retirados da lareira.

Por trás da Torre do Rei, a Muralha cintilava à luz da lua,

imensa e misteriosa. Tyrion parou por um momento para

olhá-la. As pernas doíam-lhe do frio e da pres sa.

De repente, foi assaltado por uma estranha loucura, um

desejo de olhar mais uma vez para lá do fim do mundo.

Seria sua última oportunidade, pensou; no dia seguinte

iria se dirigir para o sul, e não era capaz de imaginar um

motivo para alguma vez querer regressar àquela gelada

desolação. A Torre do Rei estava à sua frente, com sua

promessa de calor e de uma cama suave, mas Tyrion deu

por si caminhando para lá dela, na direção da vasta

paliçada de cor clara da Muralha.

Uma escada de madeira subia a face sul, ancorada em

enormes vigas rudemente talhadas, que penetravam

profundamente no gelo. Ziguezagueava para um lado e

para o outro, escalando a muralha tão torta como um

relâmpago. Os irmãos negros tinham -lhe assegurado que

era muito mais forte do que pare cia, mas as pernas de

Tyrion estavam com cãibras demais para que sequer

pensasse em subi-la. Em vez disso, dirigiu -se à gaiola de

ferro junto ao poço, pulou para dentro dela e puxou com

força a corda do sino, três sacudidelas rápidas.

Teve de esperar o que pareceu ser uma eternidade ali,

atrás das grades e com a Muralha nas costas. Tempo

suficiente para começar a interrogar -se sobre o motivo

que o levava a fazer aquilo. Estava quase decidido a

esquecer aquele súbito capricho e ir para a cama quando

a gaiola deu um solavanco e começou a subir.

Subiu lentamente, a princípio com paradas e arranques,

mas depois mais suavemente. O chão desapareceu por

baixo de seus pés, a gaiola oscilou e Tyrion enrolou as

mãos nas grades de ferro. Conseguia sentir o frio do

metal mesmo através das luvas. Percebeu, com aprovação,

que Morrec tinha um fogo a arder no seu quarto, mas a

torre do Senhor Comandante estava às escuras. Pare cia

que o Velho Urso tinha mais juízo do que ele.

E, então, viu-se acima das torres, ainda subindo

lentamente. Castelo Negro jazia abaixo de si, delineado ao

luar. Dali, via-se bem como era um lugar rígido e vazio,

com suas torres sem janelas, muros em ruínas, pátios

entupidos de pedra partida. Mais longe, conseguia ver as

luzes da Vila da Toupeira, um pequeno povoado a meia

légua para sul ao longo da estrada do rei, e aqui e ali a

cintilação brilhante do luar na água onde córregos gelados

desciam dos cumes das montanhas e cortavam as

planícies. O resto do mundo era um vazio desolado de

colinas varridas pelo vento e campos pedregosos

manchados de neve.

- Sete infernos, é o anão - disse por fim uma voz grossa

atrás dele, e a jaula parou com um salto súbito e ali ficou,

oscilando lentamente de um lado para o outro, com as

cordas rangendo.

- Tragam-no, raios - ouviu-se um grunhido e um sonoro

gemido de madeira quando a gaio la deslizou de lado e a

muralha apareceu por baixo de seus pés. Tyrion esperou

que a oscilação parasse antes de abrir a porta da gaiola e

saltar para o gelo. Uma pesada figura vestida de negro

apoiava-se no guincho, enquanto uma segunda segurava a

gaiola com uma mão enluvada. Seus rostos estavam

cobertos por lenços de lã que deixavam ver apenas os

olhos, e estavam inchados com as camadas de lã e couro

que traziam, negro sobre negro.

- E o que o senhor há de querer a esta hora da noite? -

perguntou o homem do guincho.

- Um último olhar.

Os homens trocaram olhares carrancudos.

- Olhe o que quiser - disse o outro. - Tenha apenas

cuidado para não cair, homenzinho. O Velho Urso exigiria

a nossa pele - uma pequena cabana de madeira erguia-se

sob a grande grua. Tyrion viu o pálido brilho de um

braseiro e sentiu uma breve lufada de calor quando os

homens do guincho abriram a porta e voltaram para

dentro. E então ficou só.

Estava um frio medonho ali em cima, e o vento o puxava

pela roupa como uma amante insis tente. O topo da

Muralha era mais largo que a maior parte da estrada do

rei, e Tyrion não tinha medo de cair, embora seus pés

escorregassem mais do que gostaria.

Os irmãos

espalhavam pedra esmagada pelas passagens, mas o peso

de incontáveis passos derretia a Muralha nesses locais e o

gelo parecia crescer em torno do cascalho, engolindo -o,

até que o caminho ficava de novo liso e era tempo de

esmagar mais pedra.

Mesmo assim, não era nada com que Tyrion não

conseguisse lidar. Olhou para leste e oeste, para a

Muralha que se estendia à sua frente, uma vasta estrada

branca sem princípio nem fim e um abismo escuro de

ambos os lados. Oeste, decidiu, por nenhum motivo em

especial, e começou a andar nessa direção, s eguindo o

caminho mais próximo da beira norte, onde o cascalho

parecia mais recente.

As bochechas nuas estavam coradas de frio, e as pernas

queixavam-se mais alto a cada passo, mas Tyrion as

ignorou. O vento rodopiava em seu redor, a brita rangia

sob as botas, enquanto à frente a fita branca seguia os

contornos das colinas, erguendo -se cada vez mais alta, até

se perder para lá do horizonte ocidental. Passou por uma

maciça catapulta, alta como uma muralha de cidade, com

a base profundamente afundada na Mural ha. O braço

lançador tinha sido removido para passar por reparos, e

depois fora esquecido; jazia ali como um brinquedo

partido, meio em butido no gelo.

Do lado de lá da catapulta, uma voz abafada soltou um

grito.

- Quem vem lá? Alto!

Tyrion parou.

- Se fizer alto por muito tempo, congelo, Jon - disse,

enquanto uma hirsuta silhueta clara deslizava em silêncio

na sua direção e farejava suas peles. - Olá, Fantasma.

Jon Snow se aproximou. Parecia maior e mais pesado

dentro de suas camadas de peles e cou ro e com o capuz

do manto sobre o rosto.

- Lannister - disse, soltando o lenço para descobrir a boca.

- Este é o último lugar em que esperaria vê -lo - carregava

uma pesada lança com ponta de ferro, maior que ele, e da

cintura pendia uma espada numa bainha de cour o.

Atravessado no peito trazia um cintilante corno de guerra

negro com faixas de prata.

- Este é o último lugar onde esperaria ser visto - admitiu

Tyrion. - Fui tomado por um ca pricho. Se tocar no

Fantasma, ele arranca minha mão?

- Comigo aqui, não - Jon assegurou.

Tyrion coçou o lobo branco atrás das orelhas. Os olhos

vermelhos observaram-no, impassíveis. O animal já lhe