corpo de lado, isso, assim. Você é magro como o cabo de
uma lança, sabia? Isso também é bom, o alvo é menor.
Agora, o modo de agarrar. Mostre -me - aproximou-se e
espiou-lhe a mão, afastando-lhe os dedos, rearranjando -os.
- Assim mesmo, sim. Não aperte com muita força, não,
deve segurá-la de forma hábil, delicada.
- E se a deixar cair? - perguntou Arya.
- O aço deve fazer parte do seu braço - disse-lhe o homem
calvo. - Pode deixar cair parte do seu braço? Não. Durante
nove anos, Syrio Forel foi primeira-espada do Senhor do
Mar de Bravos, ele sabe destas coisas. Escute -o, rapaz.
Era a terceira vez que o homem a chamava "rapaz".
- Sou uma menina - objetou Arya.
- Rapaz, menina - disse Syrio Forel. - É uma espada, é
tudo - fez estalar os dentes. - Isso mesmo, é assim que se
segura. Não está segurando um machado de batalha, mas
uma...
- ... agulha - terminou Arya por ele, ferozmente.
- Isso mesmo. Agora começamos a dança. Lembre -se,
criança, não é a dança de ferro de Westeros que estamos
aprendendo, a dança dos cavaleiros, que corta e bate, não.
Esta é a dança do espadachim, a dança da água, rápida e
súbita. Todos os homens são feitos de água, sabia disto?
Quando os perfura, a água jorra e eles morrem - deu um
passo para trás, ergueu a própria lâ mina de madeira. -
Agora tente me atingir.
Arya tentou atingi -lo. Tentou durante quatro horas, até
ficar com cada músculo do corpo dolorido, enquanto Syrio
Forel fazia estalar os dentes e lhe dizia que fazer. No dia
seguinte, começou o verdadeiro trabalho.
Daenerys
O Mar Dothraki - disse Sor Jorah Mormont ao puxar as
rédeas do cavalo e parar ao lado dela no topo da colina.
A seus pés, a planície estendia -se imensa e vazia, uma
vasta extensão plana que atingia e ultrapassava o
horizonte distante. Foi um mar, pensou Dany. Para lá do
lugar onde estavam não havia colinas nem montanhas,
nem árvores, cidades ou estradas, apenas a mata sem fim,
cujas folhas altas ondulavam como ondas quando o vento
soprava.
- É tão verde - ela admirou.
- Aqui e agora - concordou Sor Jorah. - Tem de vê-lo
quando floresce, flores vermelhas escuras de horizonte a
horizonte, como um mar de sangue. E quando chega a
estação seca, o mundo fica da cor de bronze velho. E isto
é apenas a hranna, menina. Há ali cem tipos de plantas,
amarelas como limão-siciliano e escuras como índigo,
azuis e cor de laranja, e as que são como arco -íris. E
dizem que nas Terras das Sombras, para lá de Asshai, há
oceanos de erva-fantasma, mais alta que um homem a
cavalo e com caules tão claros como vidro leitoso. Mata
todas as outras plantas e brilha no escuro com os
espíritos dos condenados. Os dothrakis dizem que um dia
a erva-fantasma cobrirá o mundo inteiro, e então toda a
vida terminará.
Essa idéia fez Dany se arrepiar.
- Não quero falar disso agora - ela retrucou, - Isto aqui é
tão lindo que não quero pensar na morte de tudo,
- Como desejar, Khaleesi - Sor Jorah disse respeitosamente.
Dany ouviu o som de vozes e virou -se para olhar para
trás. Ela e Mormont tinham se distan ciado do resto da
comitiva, e agora os outros vinham subindo a colina lá
embaixo. Os movimentos da criada Irri e dos jovens
arqueiros de seu khas eram fluidos como centauros, mas
Viserys ainda lutava com os estribos curtos e a sela plana.
O irmão era infeliz ali. Nunca deveria ter vindo. Magíst er
Illyrio insistira com ele para que esperasse em Pentos,
oferecera-lhe a hospitalidade de sua mansão, mas Viserys
nem quisera ouvir falar do assunto. Queria ficar com
Drogo até que a dívida fosse paga, até ter a coroa que lhe
fora prometida. "E se ele te ntar me enganar, aprenderá,
para sua desgraça, o que significa acordar o dragão", ele
garantira, pousando a mão na espada em prestada. Illyrio
pestanejara ao ouvir aquilo e lhe desejara boa sorte.
Dany percebeu que naquele momento não desejava ouvir
nenhuma das queixas do irmão. O dia estava bastante
perfeito. O céu era de um azul profundo, e muito acima
deles um falcão caça dor voava em círculos. O mar de
plantas oscilava e suspirava a cada sopro do vento, o ar
batia-lhe morno no rosto, e Dany sentia -se em paz. Não
deixaria que Viserys estragasse tudo.
- Espere aqui - disse Dany a Sor Jorah. - Diga a todos
para ficar. Diga que eu estou orde nando.
O cavaleiro sorriu. Sor Jorah não era um homem bonito.
Tinha pescoço e ombros de touro e rudes pelos negros
cobriam-lhe os braços e o pescoço de uma forma tão
densa que nada restava rara a cabeça. Mas seus sorrisos
davam conforto a Dany.
- Está aprendendo a falar como uma rainha, Daenerys.
- Uma rainha, não - ela respondeu. - Uma khaleesi - fez
girar o cavalo e galopou sozinha rela encosta abaixo.
A descida era íngreme e rochosa, mas Dany cavalgou
destemidamente, e o júbilo e o perigo d aquilo eram uma
canção no seu coração. Por toda sua vida Viserys lhe
dissera que era uma prin cesa, mas só quando montou sua
prata é que Daenerys Targaryen se sentira como uma.
A princípio não fora fácil. O khalasar levantara o
acampamento na manhã seguinte ao casa mento, dirigindo-
se para leste em direção a Vaes Dothrak, e no terceiro dia
Dany pensou que ia morrer. Feridas provocadas pela sela
abriram-se no seu traseiro, hediondas e sangrentas. As
coxas ficaram em carne viva, as rédeas fizeram nascer
bolhas nas mãos, e os músculos das pernas e das costas
estavam de tal forma doloridos que quase não era capaz
de se sentar. Quando caía o cre púsculo, as criadas tinham
de ajudá-la a desmontar,
Nem mesmo as noites traziam alívio. Khal Drogo ignorava -
a enquanto viajavam, tal como a ignorara durante o
casamento, e passava o começo da noite bebendo com
seus guerreiros e com panheiros de sangue, com petindo
com seus melhores cavalos, vendo mulheres dançar e
homens morrer. Dany não tinha lugar naquelas partes de
sua vida. Era abandonada para jantar sozinha ou com Sor
Jorah e o irmão, para depois chorar até adormecer. Mas
todas as noites, em algum momen to antes da alvorada,
Drogo vinha à sua tenda e a acordava na escuridão para
montá-la
tão
implacavelmente
como
montava
seu
garanhão. Possuía-a sempre por trás, à moda dothraki, e
Dany sentia-se grata por isso; dessa maneira, o senhor seu
marido não podia ver as lágrimas que lhe molhavam o
rosto, e podia usar a almofada para abafar seus gritos de
dor. Quando acabava, ele fechava os olhos e começava a
ressonar baixinho, e Dany se deitava ao seu lado, com o
corpo dolorido e machucado, com dores demais para