nascem, vivem e morrem sempre na escuridão, enquanto
os lobos gigantes se tornam magros e famintos, e os
caminhantes brancos se movem pelos bosques.
- Você está falando dos Outros - Bran falou, como que se
lamentando.
- Os Outros - concordou a Velha Ama. - Há milhares e
milhares de anos, caiu um in verno que era mais frio, duro
e infinito que qualquer outro na memória do homem.
Chegou uma noite que durou uma geração, e tanto
tremeram e morreram os reis em seus castelos como os
criadores de porcos em suas cabanas. As mulheres
preferiram asfixiar os f ilhos a vê-los passar fome, e
choraram, e sentiram as lágrimas congelarem em seu
rosto - a voz e as agulhas calaram --se, ela olhou Bran com
seus olhos claros e velados e perguntou: - Então, criança?
Este é o tipo de história de que gosta?
- Bem... - disse Bran com relutância - sim, só que...
A Velha Ama acenou com a cabeça.
- Nessa escuridão, os Outros vieram pela primeira vez - a
velha começou, enquanto as agu lhas faziam clic, clic, clic. -
Eram coisas frias, mortas, que odiavam o ferro, o fogo, o
toque do sol e todas as criaturas com sangue quente nas
veias.
Arrasaram
fortificações,
cidades
e
reinos,
derrubaram heróis e exércitos às centenas, montando seus
pálidos cavalos mortos e liderando hostes de assassinados.
Nem todas as espadas dos homens juntas l ogravam deter
seu avanço, e até donzelas e bebês de peito neles não
encontravam piedade. Perseguiam as donzelas através de
florestas congeladas e alimentavam seus servos mortos
com a carne de crianças humanas.
A voz da Ama tinha se tornado muito baixa, qua se um
sussurro, e Bran deu por si inclinando -se para a frente
para ouvir.
- Esses foram os tempos antes da chegada dos ândalos, e
muito antes de as mulheres terem fugido das cidades do
Roine através do mar estreito, e os cem reinos desses
tempos eram os reinos dos Primeiros Homens, que tinham
tomado estas terras dos filhos da floresta. Mas aqui e ali,
nos bosques mais densos, os filhos ainda viviam em suas
cidades de madeira e colinas ocas, e os rostos das árvores
mantinham-se vigilantes. E assim, enquanto o frio e a
morte enchiam a terra, o último herói decidiu procurar os
filhos da floresta, na esperança de que sua antiga magia
pudesse reconquistar aquilo que os exércitos dos homens
tinham perdido. Partiu para as terras mortas com uma
espada, um cavalo, um cão e uma dúzia de companheiros.
Procurou durante anos, até perder a esperança de chegar
algum dia a encontrar os filhos da floresta em suas
cidades secretas. Um por um os amigos morreram, e
também o cavalo, e por fim até o cão, e sua espada
congelou tanto que a lâmina se quebrou quando tentou
usá-la. E os Outros cheiraram nele o san gue quente e
seguiram-lhe o rastro em silêncio, perseguindo -o com
matilhas de aranhas brancas, grandes como cães de caça...
De repente a porta se abriu com um bang, e o coração de
Bran saltou-lhe até a boca num medo súbito, mas era
apenas Meistre Luwin, com Hodor parado na escada atrás
dele.
- Hodor! - anunciou o cavalariço, como era seu costume,
com um enorme sorriso para todos.
Meistre Luwin não estava sorrindo.
- Temos visitantes - anunciou -, e sua presença é
solicitada, Bran,
- Mas agora estou ouvindo uma história - o menino
protestou,
- As histórias esperam, meu pequeno senhor, e quando
regressar, elas estarão aqui - disse a Velha Ama. - Os
visitantes não são assim tão pacien tes, e muitas vezes
trazem suas próprias histórias.
- Quem é? - Bran perguntou a Meistre Luwin.
- Tyrion Lannister e alguns homens da Patrulha da Noite,
com notícias de seu irmão Jon. Robb os está recebendo.
Hodor, ajude Bran a descer até o salão?
- Hodor! - o moço concordou alegremente e abaixou -se
para passar sua grande cabeça desgrenhada pela porta,
Hodor tinha quase dois metros e quinze. Era difícil
acreditar que fosse pa rente da Velha Ama. Bran perguntou
a si mesmo se, quando envelhecesse, encarquilharia até
ficar tão pequeno como a bisavó. Não parecia provável,
mesmo que Hodor vivesse até os mil anos.
Hodor levantou Bran tão facilmente como se fosse um
pequeno amontoado de feno e aninhou-o no peito maciço.
Hodor exalava um leve odor de cavalos, mas não era um
cheiro desagradável. Seus braços eram grossos, cheios de
músculos e atapetados com pelos castanhos.
- Hodor - o gigante disse uma vez mais. Theon Greyjoy
comentara que Hodor não sabia muito, mas ninguém
podia duvidar de que conhecesse seu nome. A Velh a Ama
cacarejara como uma galinha quando Bran lhe contou isso,
e ela então confessou que o verdadeiro nome de Ho dor
era Walder. Ninguém sabia de onde viera "Hodor", ela
disse, mas quando ele começou a repe tir Hodor,
começaram a chamá-lo por esse nome. Era a única palavra
que o gigante conhecia.
Deixaram a Velha Ama no quarto da torre com suas
agulhas
e
suas
memórias.
Hodor
canta rolava
desafinadamente enquanto carregava Bran pelos degraus e
através da galeria, com Meistre Luwin atrás, esforçando -se
para acompanhar as longas passadas do cavalariço.
Robb estava sentado no cadeirão do pai, usando cota de
malha, couro fervido e o rosto severo como o de um
Senhor. Theon Greyjoy e Hallis Mollen estavam em pé a
seu lado. Uma dúzia de guardas estava disposta ao lo ngo
das paredes de pedra cinzenta, sob janelas altas e
estreitas. No centro da sala, encontravam -se o anão com
seus criados e quatro estranhos vestidos com o negro da
Patrulha da Noite. Bran sentiu a ira que pairava no salão
no momento em que Hodor o carre gou pela porta.
- Qualquer homem da Patrulha da Noite é bem -vindo aqui
em Winterfell pelo tempo que desejar ficar - seu irmão
dizia com a voz de Robb, o Senhor. Tinha a espada
pousada sobre os joelhos, mostrando o aço para que todo
mundo visse. Até Bran sabi a o que significava receber um
hóspede com uma espada desembainhada.
- Qualquer homem da Patrulha da Noite - repetiu o anão -
, mas eu, não, percebo bem o que quer dizer, meu rapaz?
Rob pôs-se de pé e apontou para o homenzinho com a
espada.
- Eu aqui sou senhor enquanto minha mãe e meu pai
estiverem fora, Lannister. Não sou seu rapaz.
- Se é um senhor, bem podia aprender a cortesia de um -
respondeu o homenzinho, ignorando a ponta da espada
apontando para sua cara. - Seu irmão bastardo ficou com
toda a elegância do seu pai, ao que parece.
- Jon - Bran arquejou nos braços de Hodor.
O anão virou-se para olhá-lo.
- Então é verdade, o rapaz está vivo. Quase não acreditei.
Vocês, os Stark, são difíceis de matar.