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GEORGE R. R. MARTIN

A MORTE DA LUZ

Tradução Marcia Blasques

LeYa

2012

Prólogo

Um planeta errante, um viajante sem objetivo, um pária da criação; esse mundo era todas essas coisas.

Havia incontáveis séculos ele seguia, sozinho, sem propósito, entre os frios e solitários espaços entre os sóis. Gerações de estrelas haviam sucedido umas às outras em imponentes enxames que preenchiam seu céu desolado. Ele não pertencia a ninguém. Era um mundo em si mesmo, inteiro. Em certo sentido, não era nem mesmo parte da galáxia; seu percurso irregular atravessava o plano galáctico como um prego introduzido em uma mesa de madeira redonda. Não fazia parte de nada.

E o nada estava bem perto. Na aurora da história humana, o planeta errante perfurou uma cortina de poeira interestelar que cobria uma área minúscula perto da borda superior das grandes lentes da galáxia. Um punhado de estrelas estava além - trinta ou quase isso, um mero punhado. Em seguida, o vazio, uma noite maior do que qualquer mundo errante já conhecera. Ali, passando por aquela sombria região de fronteira, ele se deparou com os povos devastados.

Os Imperiais da Terra o encontraram primeiro, no auge de sua vertiginosa embriaguez expansionista, quando o Império Federal da Antiga Terra ainda estava tentando governar todos os mundos povoados pelo homem através de abismos imensos e impossíveis. Um bombardeio chamado Mao Tse-tung, avariado durante uma incursão contra os hranganos, com a tripulação morta em seus postos, os motores ligando e desligando alternadamente, tornou-se a primeira nave do reino humano a seguir à deriva para além do Véu do Tentador. O Mao era uma nave abandona da, sem ar e cheia de cadáveres grotescos que tombavam sem rumo pelos corredores e esbarravam nos anteparos a cada século; mas os computadores ainda funcionavam e cumpriam obstinadamente seus rituais, esquadrinhando bem o bastante para notar o planeta errante em seus gráficos quando a nave-fantasma passou a poucos minutos-luz dele. Quase sete séculos mais tarde, um cargueiro de Tober tropeçou no Mao Tse-tung e nessa anotação. Mas então isso não era novidade; o mundo já havia sido encontrado novamente.

Célia Marcyan foi a segunda descobridora. Seu Perseguidor de Sombras circulou o planeta escuro por um dia inteiro, durante a geração do interregno que se seguiu ao Colapso. Mas o planeta errante não tinha nada para Célia, apenas rocha, gelo e uma noite sem-fim, então não levou muito tempo até que ela seguisse seu caminho. No entanto, era aficionada por nomes, e antes de partir batizou o novo mundo. Worlorn, ela o chamou. Nunca disse o motivo ou o significado, mas assim o nomeou. E Célia seguiu para outros mundos e outras histórias.

Kleronomas foi o visitante seguinte, em di-46. Sua nave de reconhecimento fez uma passagem rápida e mapeou as extensões desertas desse mundo. O planeta revelou seus segredos aos sensores; era maior e mais rico do que a maioria, Kleronomas descobriu, com oceanos congelados e uma atmosfera congelada esperando para ser libertada.

Alguns dizem que Tomo e Walberg foram os primeiros a pousar em Worlorn, em di-97, em sua louca empreitada de atravessar a galáxia. Verdade? Provavelmente não. Cada mundo do reino humano tinha uma história sobre os dois exploradores, mas o Puta Sonhadora nunca retornou, então quem pode saber onde pousaram?

Os avistamentos posteriores foram mais realistas e menos legendários. Sem estrelas, inútil e apenas marginalmente interessante, Worlorn tornou-se uma notação comum nos mapas estelares da Orla, aquela dispersão de mundos escassamente colonizados entre a escura nuvem de gases do Véu do Tentador e o Grande Mar Negro.

Então, em di-446, um astrônomo da Tocadolobo fez de Worlorn o objeto de seus estudos, e pela primeira vez alguém se preocupou em juntar todas as coordenadas. Foi quando as coisas mudaram. O nome do astrônomo lupino era Ingo Haapala, e ele saiu da sala de computadores incontrolavelmente excitado, do jeito que os lupinos freqüentemente ficam. Pois Worlorn teria um dia - um longo e brilhante dia.

A constelação chamada Roda de Fogo ardia nos céus de cada mundo exterior, uma maravilha notória tanto dentro quanto fora da Antiga Terra. O centro da formação era a supergigante vermelha, chamada por uma dúzia de nomes, tais como o Centro, o Olho do Inferno, o Satã Gordo. Em órbita ao redor dela, equidistantes e dispostas ordenadamente como seis bolas de fogo amarelo rolando em um único sulco, estavam as outras: os Sóis Troianos, os Filhos de Satã, a Coroa do Inferno. Os nomes não importavam. O que importava era a própria Roda, seis estrelas de tamanho médio que rendiam homenagem ao seu vasto mestre vermelho, ao mesmo tempo o mais improvável e mais estável sistema de estrelas múltiplas já descoberto. A Roda foi um sucesso passageiro, um novo mistério para a humanidade cansada dos mistérios antigos. Nos mundos cientificamente mais desenvolvidos, cientistas fizeram teorias para explicá-la; além do Véu do Tentador, um culto cresceu ao redor dela, e homens e mulheres falavam de uma raça desaparecida de engenheiros estelares que haviam movido sóis inteiros para construir um monumento para eles mesmos. Tanto especulação científica quanto veneração supersticiosa se propagaram febrilmente por algumas décadas e então começaram a perder força; o assunto acabou esquecido em pouco tempo.

O lupino Haapala anunciou que Worlorn se deslocaria ao redor da Roda de Fogo uma vez, em uma larga e lenta hipérbole, nunca entrando no sistema propriamente dito mas chegando perto o suficiente. Cinqüenta anos-padrão de luz do sol; então sairia novamente para a escuridão da Orla, além das Últimas Estrelas, para dentro do Grande Mar Negro do vazio intergaláctico.

Aqueles eram os séculos turbulentos, quando o Alto Kavalaan e os outros mundos exteriores provavam o gosto do orgulho pela primeira vez e ficavam cada vez mais ansiosos para encontrar um lugar nas histórias devastadas da humanidade. E todo mundo sabe o que aconteceu. A Roda de Fogo sempre fora a glória dos mundos exteriores, mas era uma glória sem planetas - até agora.

Foi um século de tempestades enquanto Worlorn se aproximava da luz: anos de gelos derretendo, atividade vulcânica e terremotos. Uma atmosfera congelada despertava para a vida paulatinamente, e ventos devastadores uivavam como monstros infantis. Tudo isso os povos dos mundos exteriores encararam e combateram.

Os terraformadores vieram de Tober-no-Véu, os guardiões do clima de Escuralba, e havia equipes de Tocadolobo, de Kimdiss, de di-Emerel e do Mundo do Oceano Vinhonegro. Os homens de Alto Kavalaan supervisionavam tudo, uma vez que o mundo reivindicara para si o planeta errante. A luta durou mais de um século, e aqueles que morreram ainda são mito para as crianças da Orla. Mas finalmente Worlorn foi amansado. E então cidades cresceram, estranhas florestas floresceram sob a luz da Roda e animais foram soltos para dar vida ao planeta.

Em di-589, o Festival da Orla foi inaugurado, com o Satã Gordo enchendo um quarto do céu e seus filhos brilhando ao seu redor. Naquele primeiro dia, os toberianos fizeram brilhar seu estratoescudo, então as nuvens e a luz do sol se contorceram em padrões caleidoscópicos. Outros dias se seguiram, e as naves vieram; oriundas de todos os mundos exteriores e dos mundos além, de Tara e Daronne, do outro lado do Véu, de Ávalon e do Mundo de Jamison, de lugares tão distantes quanto Nova Holme e Antiga Posseidon, e até mesmo da Antiga Terra. Por cinco anos-padrão, Worlorn moveu-se na direção do periélio, por cinco anos se afastou. Em di-599 o Festival foi encerrado. Worlorn entrou no crepúsculo e se deslocou em direção à noite.

Capítulo 1

Do outro lado da janela, a água batia contra as estacas do caminho de madeira ao longo do canal. Dirk t'Larien olhou para fora e viu uma barcaça baixa negra passando lentamente sob a luz da lua. Uma figura solitária estava parada na popa, recostada em um fino poste escuro. Tudo se destacava com nitidez, pois a lua de Braque estava sobre suas cabeças, do tamanho de um punho, muito brilhante.