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O Tenente Manto-branco abanou a poeira do rosto com uma das mãos enluvadas, depois acenou para que o outro se afastasse do carroção. Seus olhos não desgrudaram de Nynaeve.

— Estão vindo de Tanchico?

Nynaeve assentiu, parecendo a cooperação e honestidade em pessoa.

— Sim, Capitão. De Tanchico.

— E o que me diz sobre a cidade? Tenho ouvido muitos boatos.

— Boatos, Capitão? Quando partimos, restava pouquíssima ordem. A cidade estava repleta de refugiados, o campo tomado de rebeldes e bandidos. Quase não há comércio. — Tudo aquilo era a verdade pura e simples. — Por isso é que estas tinturas vão sair por um ótimo preço. Acho que não vai mais ter tinturas tarabonianas disponíveis por um bom tempo.

— Refugiados, tinturas ou comércio não me importam, mercadora — respondeu o oficial, em um tom indiferente. — Andric ainda estava no trono?

— Sim, Capitão.

Obviamente, os boatos diziam que alguém tomara Tanchico e depusera o Rei, e talvez fosse o caso. Mas quem? Um dos lordes rebeldes que lutavam tanto entre si quanto contra Andric, ou os Declarados do Dragão, que haviam se comprometido com o Dragão Renascido mesmo sem jamais tê-lo visto?

— Quando saímos, Andric ainda era o Rei, e Amathera, a Panarca.

Os olhos do homem diziam que ele achava que ela poderia estar mentindo.

— Há quem diga que as bruxas de Tar Valon estavam envolvidas. Vocês viram alguma Aes Sedai ou ouviram falar delas?

— Não, Capitão — respondeu, mais do que depressa.

O anel da Grande Serpente parecia quente em sua pele. Cinquenta Mantos-brancos ao alcance das mãos. Uma tempestade de poeira não ajudaria nada desta vez, e, de qualquer forma, embora tentasse negar, Nynaeve estava mais com medo do que com raiva.

— Reles mercadores não se misturam a essa gente — explicou. O homem assentiu, e ela se arriscou a fazer uma pergunta. Qualquer coisa que mudasse o assunto. — Se me permite, Capitão, já entramos em Amadícia?

— A fronteira fica cinco milhas a leste — informou ele. — Por enquanto. A primeira aldeia que vão encontrar é Mardecin. Obedeçam a lei, e ficarão bem. Há uma guarnição dos Filhos lá. — O homem soava como se a guarnição fosse dedicar todo o seu tempo para garantir que eles obedeceriam a lei.

— Vocês vieram até aqui para ajustar a fronteira? — perguntou Elayne de repente, fria. Nynaeve poderia tê-la estrangulado.

Aquele profundo olhar de suspeita se voltou para Elayne, e Nynaeve apressou-se a dizer:

— Perdoe a garota, Senhor Capitão. É filha da minha irmã mais velha. Pensa que deveria ter nascido lady e, além disso, não consegue ficar longe dos rapazes. Foi por isso que a mãe dela a mandou para ficar comigo. — O arquejo indignado de Elayne foi perfeito. Provavelmente foi real. Nynaeve supôs que não precisava ter acrescentado a questão com os rapazes, mas pareceu cair bem.

O Manto-branco encarou-as por mais um momento, depois se pronunciou.

— O Senhor Capitão Comandante envia comida para Tarabon. Do contrário, teríamos parasitas tarabonianos cruzando a fronteira e roubando tudo o que pudessem mastigar. Vão com a Luz — acrescentou, antes de girar o cavalo e fazê-lo galopar de volta para a frente da coluna. Não era nem uma sugestão nem uma bênção.

Thom tocou o carroção em frente assim que o oficial partiu, mas todos ficaram sentados em silêncio, exceto quando tossiam, até estarem bem longe do último soldado e fora da poeira dos outros carroções.

Engolindo um pouco de água para molhar a garganta, Nynaeve empurrou o cantil na direção de Elayne.

— O que você queria com aquela pergunta? Nós não estamos na sala do trono da sua mãe e, em todo caso, a Rainha não aceitaria aquele comportamento!

Elayne esvaziou o cantil antes de se dignar a responder.

— Você estava rastejando, Nynaeve. — Ela fez uma voz em falsete, imitando um tom submisso. — Eu sou muito boa e obediente, Capitão. Posso lamber suas botas, Capitão?

— Estamos nos passando por mercadoras, não rainhas disfarçadas!

— Mercadoras não precisam ser puxa-sacos! Agindo de modo tão servil, você tem sorte de ele não ter pensado que estávamos tentando esconder alguma coisa!

— Também não ficam de nariz empinado para Mantos-brancos com cinquenta lanças! Ou você acha que poderíamos derrotar todos eles usando o Poder, caso fosse preciso?

— Por que você disse que eu não conseguia ficar longe dos rapazes? Não havia necessidade daquilo, Nynaeve!

— Eu diria qualquer coisa que fizesse o homem ir embora e nos deixar em paz! E você…!

— Calem-se as duas — rosnou Thom, de repente —, antes que eles voltem para ver qual de vocês está tentando matar a outra!

Nynaeve chegou a se virar no assento de madeira para olhar para trás, antes de se dar conta de que os Mantos-brancos estavam longe demais para terem ouvido, mesmo se as duas estivessem gritando. Bem, talvez estivessem. Não ajudou em nada o fato de Elayne ter feito o mesmo.

Nynaeve agarrou a trança com firmeza e olhou feio para Thom, mas Elayne se aconchegou ao braço do homem e praticamente arrulhou:

— Você tem razão, Thom. Me desculpe por ter levantado a voz.

Juilin assistia a tudo de soslaio, fingindo não ver, mas foi esperto o bastante para não trazer o cavalo para perto e acabar se tornando parte daquilo.

Antes que arrancasse os cabelos pela raiz, Nynaeve soltou a trança, arrumou o chapéu e se sentou olhando para a frente, por sobre os cavalos. Qualquer que fosse a questão com Elayne, já passava da hora de resolver.

Apenas um pilar alto de pedra em cada lado da estrada marcava a fronteira entre Tarabon e Amadícia. Afora o grupo, não havia qualquer tráfego na estrada. As colinas ficaram gradativamente mais altas, mas, exceto por isso, o terreno permaneceu mais ou menos o mesmo: grama marrom e matagais com poucas folhas verdes, a não ser em pinheiros, folhas-de-couro ou outras árvores perenes. Plantações com cercas de pedra e casas de fazenda com telhados de palha pontilhavam as encostas e os vales, mas tinham um aspecto abandonado. Nada de fumaça subindo pelas chaminés, nada de homens trabalhando na colheita, nada de ovelhas ou gado. Às vezes viam umas poucas galinhas ciscando no pátio de alguma fazenda à beira da estrada, mas elas corriam, assustadas, com a aproximação do carroção. Com ou sem guarnições de Mantos-brancos, parecia que ninguém estava disposto a correr o risco de encarar salteadores tarabonianos, assim tão perto da fronteira.

Quando Mardecin surgiu, do topo de uma elevação, o sol ainda tinha um longo caminho a percorrer até atingir o auge. Com quase uma milha de extensão, a cidade à frente parecia grande demais para ser chamada de aldeia, estendendo-se entre duas colinas ligadas por um pequeno regato atravessado por uma ponte. Tinha tantos telhados de ardósia quanto de palha, e um burburinho considerável percorria as ruas largas.

— Precisamos comprar mantimentos — avisou Nynaeve —, mas é melhor fazermos isso rápido. Ainda podemos percorrer uma boa distância antes do cair da noite.

— Estamos ficando esgotados, Nynaeve — respondeu Thom. — Do primeiro ao último raio de luz, todos os dias há quase um mês. Um dia de descanso não vai fazer tanta diferença para chegarmos a Tar Valon. — Ele não soava cansado. Era mais provável que estivesse ansioso para tocar a harpa ou a flauta em uma das tavernas e fazer os homens lhe pagarem vinho.

Juilin finalmente cavalgara para perto do carroção, e acrescentou:

— Estou louco para passar um dia a pé. Não sei o que é pior, esta sela ou o assento do carroção.

— Acho que deveríamos encontrar uma estalagem — opinou Elayne, olhando para Thom. — Já dormi noites demais debaixo deste carroção e gostaria de ouvir você contar histórias em algum salão.

— Mercadores com um único carroção são pouco mais que mascates — retrucou Nynaeve, com firmeza. — Não têm como bancar as estalagens de uma cidade como esta.