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Podíamos sentir-nos mais felizes quanto ao princípio antrópico, pelo menos na sua versão fraca, se pudéssemos mostrar que um vasto número de diferentes configurações iniciais para o Universo podiam ter evoluído para produzir um universo como o que observamos. Se for esse o caso, um universo que se desenvolveu ao acaso a partir de quaisquer condições iniciais devia conter um número de regiões regulares, uniformes e adequadas à evolução da vida inteligente. Por outro lado, se o estado inicial do Universo teve de ser escolhido com todo o cuidado para conduzir a qualquer :, coisa como o que vemos à nossa volta, seria improvável que o Universo contivesse *qualquer* região onde tivesse aparecido vida. No modelo quente (10) do *big bang* já descrito, não houve tempo suficiente no estado inicial do Universo para o calor ir de uma região para outra.

(10) Também designado por modelo padrão (*n. do r.*).

Isto significa que o estado inicial do Universo devia ter tido exactamente a mesma temperatura por toda a parte, para explicar o facto de a radiação de micro-ondas de fundo ter a mesma temperatura, para onde quer que olhemos. A taxa inicial de expansão também devia ter sido escolhida com grande precisão para que se mantivesse tão próxima da razão crítica necessária para evitar o colapso. Isto significa que, se o modelo quente do *big bang* está certo até ao começo do tempo, o estado inicial do Universo deve ter sido realmente escolhido com grande cuidado. Seria muito difícil explicar o motivo pelo qual o Universo deve ter começado exactamente assim, excepto como acto de um deus que tencionava criar seres como nós.

Numa tentativa de descobrir um modelo do Universo em que muitas configurações iniciais diferentes podiam ter evoluído até qualquer coisa como o Universo actual, um cientista do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, Alan Guth, sugeriu que o Universo, ao princípio, podia ter passado por um período de expansão muito rápida. Esta expansão diz-se "inflacionária", significando que o Universo, a certa altura, se expandiu com velocidade crescente e não com velocidade decrescente, como acontece hoje. Segundo Guth, o raio do Universo aumentou um milhão de milhões de milhões de milhões de milhões de vezes (1 seguido de trinta zeros) em apenas uma minúscula fracção de segundo.

Guth sugeriu que o Universo começou com o *big bang* num estado muito quente mas bastante caótico. Essas temperaturas :, elevadas teriam significado que as partículas do Universo se moviam muito depressa e tinham energias elevadas. Como já discutimos, esperar-se-ia que a temperaturas tão elevadas as forças nucleares fraca e forte e a força electromagnética estariam unificadas numa força única. O Universo em expansão arrefeceria e as energias das partículas baixariam. Eventualmente, chegar-se-ia ao que se chama uma transição de fase e a simetria entre as forças seria quebrada: as forças forte, fraca e electromagnética tornar-se-iam distintas. Um exemplo vulgar de uma transição de fase é o congelamento da água, quando arrefece. A água líquida é simétrica, igual em todos os pontos e todas as direcções. Contudo, quando se formam cristais de gelo, estes têm posições definidas e ficam alinhados numa direcção, o que quebra a simetria da água.

No caso da água, se tivermos cuidado, podemos "sobre-arrefecê-la", ou seja, podemos reduzir a temperatura abaixo do ponto de congelamento (0° C) sem se formar gelo. Guth sugeriu que o Universo podia comportar-se de modo semelhante: a temperatura podia descer abaixo do valor crítico sem que a simetria entre forças fosse quebrada. Se isto acontecesse, o Universo estaria num estado instável, com mais energia do que se a simetria tivesse sido destruída. Esta energia extra especial tem um efeito antigravitacionaclass="underline" teria agido tal como a constante cosmológica que Einstein introduziu na relatividade geral quando tentava construir um modelo estático do Universo. Uma vez que o Universo já estaria a expandir-se como no modelo quente do *big bang*, o efeito repulsivo desta constante cosmológica teria provocado a expansão do Universo a uma razão sempre crescente. Mesmo as regiões onde havia mais partículas de matéria do que na média, a atracção gravitacional da matéria teria sido anulada pelo efeito repulsivo da constante cosmológica. Assim, estas regiões expandir-se-iam também de uma maneira inflacionária acelerada. :, Quando se expandissem e as partículas de matéria se afastassem, teríamos um universo em expansão que conteria apenas algumas partículas e que estaria ainda no estado super-arrefecido. Quaisquer irregularidades no Universo teriam simplesmente sido suavizadas pela expansão, como as pregas num balão são alisadas quando o enchemos. Assim, o actual estado regular e uniforme do Universo pode ter evoluído de muitos estados iniciais não uniformes e diferentes.

Num universo assim, em que a expansão foi acelerada por uma constante cosmológica em vez de ser retardada pela atracção gravitacional, haveria tempo suficiente para a luz viajar de uma região para outra no universo inicial. Isto poderia fornecer a solução do problema já levantado, do porquê de as diferentes regiões no princípio do Universo terem as mesmas propriedades. Além disso, a taxa de expansão do Universo tornar-se-ia automaticamente muito próxima da taxa crítica determinada pela densidade de energia do Universo. Isto podia explicar por que a taxa de expansão é ainda tão próxima da taxa crítica, sem ser necessário admitir que a taxa inicial tenha sido cuidadosamente escolhida.

A ideia de inflação podia também explicar por que motivo existe tanta matéria no Universo. Há cerca de cem milhões de milhões de milhões de milhões de milhões de milhões de milhões de milhões de milhões de milhões de milhões de milhões de milhões (1 seguido de oitenta zeros) de partículas na região do Universo que podemos observar. De onde vieram? A resposta é que, na teoria quântica, as partículas podem ser criadas a partir da energia em forma de pares de partícula/antipartícula. Mas isto suscitou a questão de se saber de onde vem a energia. A resposta é que a energia total do Universo é exactamente zero. A matéria do Universo é constituída por energia positiva. Contudo, a matéria atrai-se a si própria devido à gravidade. :, Dois pedaços de matéria que estejam perto um do outro têm menos energia do que se estiverem muito afastados, porque é preciso gastar energia para os separar contra a força da gravidade que os atrai um para o outro. Portanto, em certo sentido, o campo gravitacional tem energia negativa. No caso de um universo que é aproximadamente uniforme no espaço, pode mostrar-se que esta energia gravitacional negativa anula exactamente a energia positiva representada pela matéria. Portanto, a energia total do Universo é zero.

Ora, duas vezes zero é zero. Assim, o Universo pode duplicar a quantidade de energia positiva da matéria e também duplicar a energia gravitacional negativa sem violar a conservação da energia. Isto não acontece na expansão normal do Universo, em que a densidade de energia da matéria diminui à medida que 0 Universo se torna maior. Acontece sim na expansão inflacionária, porque a densidade de energia do estado super-arrefecido permanece constante enquanto o Universo se expande: quando o Universo duplica o tamanho, a energia positiva da matéria e a energia gravitacional negativa também duplicam, de modo que a energia total continua a ser zero. Durante a fase inflacionária, o Universo aumenta muito o seu tamanho, o que faz com que a quantidade total de energia disponível para produzir partículas se torne muito grande. Como Guth afirmou, "Diz-se que não há nada como um almoço de graça. Mas o Universo é o derradeiro almoço de graça".