Выбрать главу

Foi na conferência no Vaticano, que já mencionei, que apresentei pela primeira vez a sugestão de que talvez o tempo e o espaço juntos formassem uma superfície finita em tamanho, mas sem qualquer fronteira ou limite. O meu trabalho era bastante matemático, pelo que as suas implicações quanto ao papel de Deus na Criação do Universo não foram geralmente reconhecidas na altura (felizmente para mim). Nessa altura ainda não sabia como utilizar a ideia "sem fronteira" para elaborar prognósticos sobre o Universo. No entanto, passei o Verão seguinte na Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara. Aí, um colega e amigo, Jim Hartle, trabalhou comigo, tentando descobrir que condições o Universo devia satisfazer se o espaço-tempo não tivesse fronteira. Quando regressei a Cambridge, continuei o trabalho com dois dos meus alunos de investigação, Julian Luttrel e Jonathan Halliwell.

Gostaria de frisar que esta ideia de que o tempo e o espaço devem ser finitos sem qualquer fronteira não passa de uma proposta: não pode ser deduzida de qualquer outro princípio. Tal como qualquer outra teoria científica, pode ser inicialmente proposta por razões estéticas ou metafísicas, mas a prova real reside em saber se faz previsões que concordem com a observação. Isto, porém, é difícil de :, determinar no caso da gravidade quântica por duas razões: primeiro, como será explicado no próximo capítulo, ainda não temos a certeza exacta de qual é a teoria que combina com êxito a relatividade geral e a mecânica quântica, embora saibamos bastante sobre a forma que tal teoria deve ter; segundo, qualquer modelo que descreva o Universo no seu todo, em pormenor, seria demasiado complicado matematicamente para sermos capazes de calcular previsões exactas. Portanto, temos de fazer suposições e aproximações simplificativas e, mesmo assim, o problema de extrair previsões mantém-se.

Cada história na soma das histórias descreverá não apenas o espaço-tempo mas tudo o que existe nele também, incluindo quaisquer organismos complicados como os seres humanos que são capazes de observar a história do Universo. Isto pode fornecer outra justificação para o princípio antrópico, porque, se todas as histórias são possíveis, então desde que existamos numa delas, podemos utilizar o princípio antrópico para explicar o motivo pelo qual o Universo parece ser tal como é. Que significado exacto pode ser dado às outras histórias em que não existimos, não sabemos. Esta ideia de uma teoria quântica da gravidade seria muito mais satisfatória, no entanto, se pudéssemos mostrar que, usando a soma das histórias, o nosso Universo não é apenas uma das histórias possíveis mas sim uma das mais prováveis. Para conseguir isto, temos de operar a soma das histórias para todos os espaços-tempo euclidianos possíveis que não têm fronteira.

Sob proposta de não haver fronteira, ficamos a saber que a hipótese de o Universo estar a seguir a maior parte das histórias possíveis é insignificante, mas existe um grupo especial de histórias que são muito mais prováveis do que as outras. Estas histórias podem ser imaginadas como a Superfície da Terra, em que a distância ao Pólo Norte representa o tempo imaginário e o perímetro de um círculo :, a essa distância constante do Pólo Norte representa o tamanho espacial do Universo. O Universo começa no Pólo Norte com um simples ponto. À medida que nos dirigimos para sul, os círculos de latitude a uma distância constante do Pólo Norte tornam-se maiores, correspondendo à expansão do Universo no tempo imaginário (Fig. 8.1). O Universo chegaria ao seu tamanho máximo no equador e contrair-se-ia no decurso do tempo imaginário num ponto único, no Pólo Sul. Embora o Universo tivesse o tamanho zero nos Pólos Norte e Sul, estes pontos não seriam singularidades, tal como os Pólos Norte e Sul na Terra não são singularidades. As leis da ciência manter-se-iam [válidas], tal como acontece nos Pólos Norte e Sul da Terra.

fig. 8.1

A história do Universo no tempo real, contudo, teria um aspecto muito diferente. Há cerca de dez ou vinte mil milhões de anos, teria um tamanho mínimo, que era igual ao raio máximo da história no tempo imaginário. Mais tarde, em tempos reais, o Universo expandir-se-ia como o modelo inflacionário caótico proposto por Linde (mas agora já não teríamos de admitir que o Universo tinha sido criado de qualquer maneira no estado certo). O Universo expandir-se-ia até um tamanho muito grande e eventualmente :, entraria de novo em colapso para aquilo que parece uma singularidade no tempo real. Assim, em certo sentido, continuamos a estar condenados, mesmo que nos mantenhamos afastados de buracos negros. Só se conseguíssemos conceber o Universo em termos de tempo imaginário e que não haveria singularidades.

Se o Universo está realmente em tal estado quântico, não haveria singularidades na história do Universo no tempo imaginário. Podia parecer, pois, que o meu trabalho mais recente tinha desfeito os resultados do meu trabalho anterior sobre as singularidades. Mas, conforme acabei de indicar, a verdadeira importância dos teoremas de singularidade era mostrar que o campo gravitacional tem de tornar-se tão forte que os efeitos gravitacionais quânticos não podem ser ignorados. Isto, por sua vez, levou à ideia de que o Universo podia ser finito no tempo imaginário, mas sem limites ou singularidades. Contudo, quando se volta ao tempo real em que vivemos, continua a parecer que existem singularidades. O pobre astronauta que cai num buraco negro continua a ter um fim infeliz; só se vivesse em tempo imaginário é que não encontrava singularidades.

Isto podia sugerir que o chamado tempo imaginário é realmente o tempo verdadeiro e que aquilo a que chamamos tempo real é produto da nossa imaginação. No tempo real, o Universo tem um princípio e um fim, em singularidades que formam uma fronteira para o espaço-tempo e perante as quais as leis da ciência deixam de ser válidas. Mas, no tempo imaginário, não há singularidades nem fronteiras. Assim, pode ser que aquilo que chamamos tempo imaginário seja realmente mais básico e o que chamamos tempo real seja apenas uma ideia que inventamos para nos ajudar a descrever como pensamos que o Universo é. Mas, de acordo com a aproximação que descrevi no capítulo primeiro, uma teoria científica não passa de :, um modelo matemático que elaboramos para descrever as nossas observações: só existe nas nossas mentes. Portanto, não tem significado perguntar: que é real, o tempo "real" ou o "imaginário"? Trata-se apenas de saber qual é a descrição mais útil.

Podemos também utilizar a soma das histórias, juntamente com a proposta de não haver fronteira, para descobrir quais as propriedades do Universo mais prováveis de ocorrer em conjunto. Por exemplo, podemos calcular a probabilidade de o Universo estar a expandir-se quase à mesma razão em diferentes direcções numa altura em que a densidade do Universo tem o seu valor actual. Nos modelos simplificados que têm sido examinados até agora, esta probabilidade parece ser grande, ou seja, a condição de não haver fronteira leva ao prognóstico de ser extremamente provável que a actual taxa de expansão do Universo seja quase a mesma em todas as direcções. Isto é coerente com as observações da radiação do fundo de micro-ondas, que mostra que ela tem quase exactamente a mesma intensidade em qualquer direcção. Se o Universo estivesse a expandir-se mais depressa numa direcção do que noutras, a intensidade da radiação nessas direcções seria reduzida por um desvio adicional para o vermelho.