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Mesmo que descubramos uma teoria unificada completa, tal não significaria que fôssemos capazes de prever acontecimentos em geral, por duas razões. A primeira é a limitação que o princípio da incerteza da mecânica quântica traz aos nossos poderes de previsão. E não há nada que possamos fazer para nos livrarmos dela. Na prática, no entanto, esta primeira limitação é menos restritiva que a segunda, que advém do facto de não podermos resolver exactamente as equações da teoria excepto em situações muito simples. (Nem sequer conseguimos resolver exactamente o movimento de três corpos na teoria da gravitação de Newton, e a dificuldade aumenta com 0 número de corpos e a complexidade da teoria). Já conhecemos todas as leis que governam o comportamento da matéria sob todas as condições, mesmo as mais extremas. Em particular, conhecemos as leis que estão na base de toda a química e de toda a biologia. E, no entanto, ainda não fomos :, capazes de reduzir esses temas à condição de problemas resolvidos; por enquanto, tivemos pouco êxito com a previsão do comportamento humano a partir de equações matemáticas! Portanto, mesmo que encontremos realmente um conjunto de leis básicas, continuará a existir nos anos seguintes a tarefa intelectualmente desafiadora de desenvolver métodos de aproximação melhores para que possamos elaborar com êxito previsões das consequências prováveis em situações complicadas e realistas. Uma teoria unificada coerente e completa é apenas o primeiro passo: o nosso objectivo é a *compreensão* completa dos acontecimentos à nossa volta e da nossa própria existência.

XI. Conclusão

Encontramo-nos num mundo desconcertante. Queremos que o que nos rodeia faça sentido e perguntar: Qual é a natureza do Universo? Qual é o nosso lugar nele e de onde é que ele e nós viemos? Por que é como é?

Para tentar responder a estas perguntas adoptamos uma "imagem do mundo". Nela, a teoria das supercordas é semelhante à torre infinita de tartarugas a suportar a Terra plana. Ambas são teorias do Universo, embora a primeira seja muito mais matemática e precisa do que a segunda. A ambas faltam provas observacionais: nunca ninguém viu uma tartaruga gigante com a Terra às costas, mas também nunca ninguém viu uma supercorda. Contudo, a teoria da tartaruga não consegue ser uma boa teoria científica porque prevê que as pessoas deviam cair da fronteira do mundo. Tal não concorda com a experiência, a não ser que venha a ser a explicação para os que se supõe terem desaparecido no Triângulo das Bermudas!

As primeiras tentativas teóricas para descrever e explicar o Universo envolviam a ideia de que os acontecimentos e os fenómenos naturais eram controlados por espíritos com emoções humanas, que agiam de uma maneira muito humana e imprevisível. Estes espíritos habitavam objectos naturais, como rios e montanhas, incluindo corpos :, celestes, como o Sol e a Lua. Tinham de ser apaziguados e os seus favores tinham de ser procurados, para se garantir a fertilidade do solo e o ciclo das estações do ano. Gradualmente, contudo, deve ter-se começado a reparar que havia certas regularidades: o Sol erguia-se sempre a leste e punha-se a oeste, quer se tivesse ou não oferecido um sacrifício ao deus Sol. Além disso, o Sol, a Lua e os planetas seguiam trajectórias precisas no céu, que podiam ser antecipadas com considerável precisão. O Sol e a Lua podiam ser deuses, mas eram deuses que obedeciam a leis estritas, aparentemente sem excepções, se ignorarmos histórias como a do Sol ter parado para Josué.

Inicialmente, estas regularidades e leis surgiam apenas na astronomia e em algumas outras situações. Contudo, à medida que a civilização se desenvolveu, particularmente nos últimos trezentos anos, foram descobertas cada vez mais regularidades e leis. O êxito dessas leis levou Laplace, no princípio do século XIX, a postular o determinismo científico, ou seja, sugeriu que devia haver um conjunto de leis que determinariam com precisão a evolução do Universo, dada a sua configuração em determinado momento.

O determinismo de Laplace estava duplamente incompleto. Não dizia como deviam ser escolhidas as leis e não especificava qual teria sido a configuração inicial do Universo. Tudo isso era deixado a Deus. Deus teria escolhido como o Universo começou e a que leis obedeceria, mas não interveio mais (1). Com efeito, Deus foi confinado às áreas que a ciência do século XIX não compreendia. :,

(1) A ideia de um Deus relojoeiro: deu corda ao mundo por ele recém-criado e afastou-se para não mais intervir! No princípio do século XIX o universo newtoniano está um pouco às avessas: o espaço substancial cartesiano, substituído depois pelo espaço newtoniano através do qual Deus *sentia* o mundo e actuava nele continuamente, foi cedendo lugar ao espaço dos atomistas, vazio de substancia e da presença de Deus (*N. do R.*).

Sabemos agora que as esperanças do determinismo de Laplace não podem realizar-se, pelo menos nos termos que ele tinha em mente. O princípio da incerteza da mecânica quântica implica que certos pares de quantidades, como a posição e a velocidade de uma partícula, não podem ambos ser preditos com toda a precisão.

A mecânica quântica trata esta situação por intermédio de uma classe de teorias quânticas em que as partículas não têm posições e velocidades bem definidas, mas são representadas por uma onda. Estas teorias quânticas são deterministas no sentido em que proporcionam leis para a evolução da onda com o tempo. Assim, se conhecermos a onda num dado momento, podemos calculá-la em qualquer outro. O elemento imprevisível e de acaso só entra quando tentamos interpretar a onda em termos de posições e velocidades das partículas. Mas talvez seja esse o nosso erro: talvez não haja posições e velocidades de partículas, mas apenas ondas. Nós é que tentamos encaixar as ondas nas nossas ideias preconcebidas de posições e velocidades. A má combinação resultante é a causa da aparente imprevisibilidade.

Com efeito, redefinimos a tarefa da ciência como sendo

a descoberta de leis que nos permitam prever acontecimentos até aos limites impostos pelo princípio da incerteza. Mantém-se, no entanto, a pergunta: como e por que foram escolhidas as leis e o estado inicial do Universo?

Neste livro dei lugar de destaque às leis que regem a gravidade, porque é a gravidade que dá forma à estrutura do Universo em macro-escala, embora seja a mais fraca das quatro categorias de forças. As leis da gravidade eram incompatveis com a opinião mantida até há pouco de que o Universo era imutável no tempo: o facto de a gravidade ser sempre atractiva implica que o Universo deve estar a expandir-se ou a contrair-se. Segundo a teoria da relatividade geral, deve ter havido um estado de densidade infinita :, no passado, o *big bang*, que teria sido um começo efectivo do tempo. Do mesmo modo, se todo o Universo voltasse a entrar em colapso, devia haver outro estado de densidade infinita no futuro, o *grande esmagamento*, que seria um fim do tempo. Mesmo que todo o Universo não entrasse de novo em colapso, haveria singularidades em todas as regiões localizadas que entrassem em colapso para formar buracos negros. Estas singularidades seriam um fim do tempo para quem caísse no buraco negro. No *big bang* e nas outras singularidades, todas as leis perdiam a validade, de maneira que Deus teria tido liberdade completa para decidir o que acontece e como o Universo começou.