Pensativamente, o chefe da MI-6 soprou a ponta do seu cigarro.
— Duvido que haja uma troca, sr. Dunross.
— E por que não? O dinheiro é mais impor...
— É uma questão de opinião, sr. Dunross, se esse Brian Kwok está realmente preso. De qualquer maneira, o governo de Sua Majestade não se submeteria à chantagem. De muito mau gosto.
— Concordo. Mas Sir Geoffrey vai concordar prontamente.
— Duvido. Ele me deu a impressão de ser esperto demais para isso. Por falar em troca, sr. Dunross, pensei que o senhor ia nos dar as pastas de Alan M. Grant.
Dunross sentiu uma pontada fria na boca do estômago.
— E dei, hoje à noite.
— Puta que o pariu, não brinque comigo, isso é sério! Acha que sou algum idiota? — disse Sinders no tom exato que Dunross usara. Abruptamente, deu uma risada seca e continuou na mesma calma gélida: — O senhor sem dúvida nos deu uma versão delas, mas infelizmente não se comparam em qualidade à que foi interceptada. — Os olhos do homem desmazelado ficaram ainda mais duros e curiosamente ameaçadores, embora sua fisionomia não se tivesse alterado. — Sr. Dunross, o seu subterfúgio foi habilidoso, elogiavel, mas desnecessário. Nós realmente queremos aquelas pastas, as originais.
— Se essas não o satisfazem, por que não dá uma busca nos papéis de Alan?
— Já dei. — Sinders sorriu sem humor. — Bem, é como aquele velho ditado do ladrão: "A bolsa ou a vida". A posse dessas pastas pode ser letal para o senhor. Concorda, Robert?
— Sim, senhor.
Sinders tirava baforadas do seu cigarro.
— Com que então, sr. Dunross, o seu sr. Tiptop quer fazer uma troca, hem? Todo mundo em Hong Kong parece gostar de trocas, de comércio. Está no ar, não é? Mas para isso é preciso dar um valor por outro igual. Imagino que se quer concessões para obter concessões do inimigo... bem, no amor e na guerra vale tudo, ao que dizem. Não é?
Dunross manteve a fisionomia impassível.
— É o que dizem. Amanhã cedinho vou falar com o governador. Vamos manter isso estritamente confidencial até que eu tenha conversado com ele. Boa noite.
Ficaram olhando enquanto ele cruzava as portas giratórias e desaparecia.
— O que você acha, Robert? Dunross trocou mesmo as pastas?
Armstrong soltou um suspiro.
— Não sei. O rosto dele nada revelou. Eu o observei atentamente. Nada. Mas ele é vivíssimo.
— É. — Sinders ficou pensando um momento. — Quer dizer que o inimigo quer fazer uma troca, hem? Eu diria que teremos nas mãos o referido cliente por vinte e quatro horas, no máximo. Quando vai fazer o próximo interrogatório?
— Às seis e meia.
— Ah! Bem, se você vai começar tão cedo, é melhor irmos andando. — Sinders pediu a conta. — Vou consultar o sr. Crosse, mas já sei o que ele vai dizer... na realidade o que Londres ordenou.
— O quê, senhor?
— Eles estão preocupadíssimos porque o cliente teve conhecimento de segredos em demasia, no curso feito no estado-maior, na Real Polícia Montada Canadense. — Sinders hesitou de novo. — Pensando melhor, Robert, independentemente do que o sr. Dunross faça, nossa única solução é apreciar o processo interrogatório. É. Vamos cancelar a sessão das seis e meia, continuar com a programação de hora em hora, desde que ele esteja medicamente apto, e jogá-lo no Quarto Vermelho. Armstrong empalideceu.
— Mas senhor...
— Lamento — disse Sinders, a voz gentil —, sei que ele é seu amigo, era amigo, mas agora o sr. Tiptop e o sr. Dunross roubaram o nosso tempo.
Sábado
62
9h32m
O jato da Jal vindo de Tóquio voou baixo sobre o mar e pousou perfeitamente em Kai Tak, com uma rajada de fumaça junto às rodas. Imediatamente, os motores engrenaram em ré, e ele foi uivando em direção ao complexo do aeroporto, desacelerando.
Passageiros, tripulantes e visitantes lotavam o terminal movimentado, as áreas da alfândega, a Imigração e as salas de espera. Partir era fácil. Chegar era razoavelmente fácil. Exceto para os japoneses. Os chineses têm boa memória. Os anos da ocupação japonesa da China e Hong Kong durante a guerra estavam próximos demais, fortes demais, violentos demais para serem esquecidos. Ou perdoados. Assim, os cidadãos japoneses eram examinados mais atentamente. Até mesmo os membros da tripulação da jal que chegava, até as aeromoças graciosas, bonitas, educadas, algumas das quais mal haviam nascido quando a ocupação terminou, também recebiam de volta os seus documentos de viagem com um olhar gélido.
Atrás deles, na fila, estava um americano.
— Bom dia — disse, entregando o passaporte para o funcionário.
— Bom dia.
O jovem chinês abriu o passaporte e olhou para a foto e o homem, depois folheou o caderno para encontrar o visto. Sem ser notado, seu pé tocou um interruptor oculto, que alertou Crosse e Sinders, que estavam numa sala de observação próxima. Foram até o espelho unilateral e olharam para o homem que esperava na Imigração, à frente de uma das seis grandes filas de passageiros.
O passaporte, tirado há um ano, dizia "Vincenzo Banastasio, sexo masculino, nascido na cidade de Nova York, em 16 de agosto de 1910. Cabelos grisalhos, olhos castanhos". Com naturalidade, o funcionário examinou os outros vistos e carimbos: Inglaterra, Espanha, Itália, Holanda, México, Venezuela, Japão. O funcionário carimbou o caderno cinzento e devolveu-o com indiferença.
Banastasio passou pela alfândega, com uma cara pasta de crocodilo debaixo do braço, carregando bebida livre de impostos numa vistosa sacola de plástico, a máquina fotográfica balançando ao ombro.
— Sujeito bonitão — comentou Sinders. — Ele se cuida. Viram enquanto ele desaparecia no meio da multidão.
Crosse ligou o rádio portátil.
— Ele já está na mira de vocês? — perguntou.
— Sim, senhor — veio a resposta instantânea pelo rádio.
— Vou continuar o controle nessa freqüência. Avisem-me de qualquer novidade.
— Sim, senhor.
— Não vamos ter problemas para segui-lo — disse Crosse a Sinders.
— Não. Ainda bem que o vi. Sempre gosto de ver um inimigo em carne e osso.
— E ele é? Inimigo?
— O sr. Rosemont acha que sim. E você?
— Estou me referindo a ser nosso inimigo. Estou certo de que é um vigarista... o que não sei é se tem algo a ver com os Serviços de Informação.
Sinders soltou um suspiro.
— Já verificou as escutas? — Já.
No fim da noite anterior, uma equipe de peritos do sei colocara secretamente escutas no quarto que Banastasio reservara no Hilton, assim como no escritório e na suíte particular de Ng Fotógrafo, Vee Cee Ng.
Esperaram pacientemente. Sobre a mesa, o rádio sibilava e estalava ligeiramente.
Depois de uma pausa, Sinders perguntou distraidamente:
— E quanto ao nosso outro cliente?
— Quem? Kwok?
— É. Quanto tempo acha que vai demorar?
— Não muito — respondeu Crosse, sorrindo consigo mesmo.
— Quando vão colocá-lo no Quarto Vermelho?
— Pensei que por volta do meio-dia. Antes, se ele estiver pronto.
— Armstrong vai conduzir o interrogatório?
— Vai.
— Armstrong é um bom homem. Portou-se muito bem no Ivánov.
— Da próxima vez, incomoda-se de me deixar a par? Afinal de contas, aqui é a minha área.
— Claro, Roger. Foi uma súbita decisão de Londres.
— Que história é essa? Sobre a convocação de domingo.
— O ministro está mandando instruções especiais. — Sinders franziu o cenho. — A folha de Brian diz que ele é forte. Não temos muito tempo. Ele deve ter sido muito bem doutrinado, para ficar enterrado tão fundo, tanto tempo.