— Uma corrida maravilhosa, pena que... Tem a decisão? É o Bluey, não é? Todos vimos o chicote...
— Posso usar o microfone?
— Ah, sim, claro.
O homem se afastou apressadamente, e Dunross sentou-se no lugar dele. Ligou o botão.
— Aqui fala Ian Dunross, os administradores me pediram para fazer dois comunicados...
O silêncio foi enorme enquanto as palavras dele ecoavam e reecoavam no hipódromo. As cinqüenta mil pessoas prenderam a respiração, indiferentes à chuva, nas tribunas baixas e em todos os níveis mais altos.
— Primeiro, o resultado do quinto páreo. — Silêncio mortal, exceto pelo barulho da chuva. Dunross inspirou fundo.
— Pilot Fish por um focinho de Noble Star, e Noble Star por um fio de cabelo de Butterscotch Lass... — A última palavra foi abafada pelos vivas e vaias, pela felicidade e desgosto, e todo mundo no estádio berrava, discutia, dava vivas, xingava. Lá no paddock Gornt estava atônito, tendo se convencido de que o seu jóquei, visto como ele próprio vira, fora apanhado e eliminado, e o resultado seria posto de lado. Em meio ao pandemônio os números vencedores apareceram no paineclass="underline" 1, 7, 8.
Dunross esperou um momento, depois repetiu animadamente os resultados em cantonense, com a multidão mais dócil, acalmadas as ansiedades reprimidas, pois a decisão dos administradores era definitiva:
— Segundo, os administradores e organizadores decidiram, devido ao tempo e às más condições, cancelar o resto do programa... — Um gemido enorme percorreu a multidão. — na verdade adiá-lo até o sábado que vem, para outro programa especial. — Um alarido de entusiasmo ecoou. — Faremos um programa de oito páreos, e o quinto será igual ao de hoje, com os mesmos concorrentes, Pilot Fish, Butterscotch Lass, Winning Billy, Street Vendor, Golden Lady, Lochinvar e Noble Star. Uma prova especial de desafio, com apostas duplas, trinta mil a mais...
Vivas e mais vivas, aplausos, gritos e alguém na cabina exclamou:
— Puxa, tai-pan, que grande idéia! Noble Star vai vencer aquele filho da mãe negro!
— Ah, não vai mesmo! Butterscotch...
— Grande idéia, tai-pan. Dunross falou ao microfone:
— Os administradores agradecem o seu contínuo apoio.
— Repetiu a frase em cantonense, acrescentando: — Haverá um outro comunicado especial daqui a alguns minutos. Obrigado! — nos dois idiomas.
Outro viva ruidoso, e aqueles que estavam na chuva correram para buscar abrigo ou para os guichês dos vencedores, todos tagarelando, gemendo, amaldiçoando ou abençoando os deuses, entupindo as saídas, longas filas de homens, mulheres e crianças dirigindo-se para casa, cheios de uma nova e maravilhosa felicidade. Apenas os que possuíam os números vencedores da loteria dupla, 8 e 5 no segundo, 1 e 7 no quinto, continuavam paralisados, fitando o painel, esperando para ver quanto pagaria a loteria.
— Mais um comunicado, tai-pan? — perguntou ansiosamente o locutor.
— Sim — replicou Dunross. — Lá pelas cinco horas. Havergill lhe dissera que o negócio com Richard Kwang fora concluído, e pedira-lhe para ir à tribuna do Victoria o mais breve possível. Ele chegou à porta da saída e desceu os degraus de três em três, para o andar inferior, muito satisfeito consigo mesmo. "Ter dado a vitória do páreo a Pilot Fish deve ter abalado Gornt", pensou. "Gornt sabia, como eu, que foi a maior marmelada, e que Aleksei iria perder, não importa o que fizesse... foi o motivo principal pelo qual eu não montei. Se eles tivessem tentado fazer aquilo comigo, eu teria matado alguém. Mas no sábado que vem... ah, sábado que vem eu vou montar, e Bluey White não vai ousar, nem os demais treinadores; no sábado que vem, o jogo vai ser limpo, e eles estarão avisados. " O entusiasmo dele aumentou um pouco mais. Então, no corredor lotado, viu Murtagh à sua espera.
— Escute, tai-pan, posso falar...
— Claro — disse Dunross, conduzindo-o pela cozinha até a sua sala particular.
— Que grande páreo! Ganhei uma bolada — disse o rapaz, animadíssimo —, e que boa notícia sobre o sábado!
— Ótimo. — Foi então que Dunross notou o suor na testa do homem. "Ah, Deus", pensou. — Fecharemos negócio, sr. Murtagh?
— Por favor, chame-me de Dave, os chefões disseram que... bem... talvez... Marcaram uma reunião de diretoria para amanhã, nove da manhã, hora deles. Aqui serão...
— Dez da noite de hoje. É. Excelente, sr. Murtagh, então ligue para mim neste número. — Dunross anotou-o. — Por favor, não o perca, nem o dê para mais ninguém.
— Ah, naturalmente, tai-pan, ligarei para o senhor tão logo... até que horas posso ligar?
— No momento em que desligar o telefone, depois de falar com eles. Continue a ligar até me encontrar. — Dunross se pôs de pé. — Desculpe, mas há um bocado de coisas a serem feitas.
— Ah, sim, claro! — Murtagh acrescentou, constrangido: — Escute, tai-pan, acabei de saber do seu sinal de dois milhões na proposta da General Stores. Dois milhões da nossa parte até nove e meia de segunda vai ser um pouco difícil.
— Foi o que imaginei... para o seu grupo. Felizmente, sr. Murtagh, nunca contei com essa quantia modesta vinda de vocês. Sei que o First Central tende a ser como os moinhos de Deus... moem devagarinho... a não ser que desejem retirar-se da arena — acrescentou, lembrando-se de muitos amigos seus que haviam sido prejudicados com a retirada repentina do apoio deles, há anos. — Não se preocupe, a minha nova fonte externa de crédito é mais...
— Como? — exclamou Murtagh, empalidecendo.
— Minha nova fonte externa de finanças reage prontamente a quaisquer oportunidades comerciais repentinas, sr. Murtagh. Essa levou apenas oito minutos. Parecem ter mais confiança que seus diretores.
— Pombas, tai-pan, por favor, chame-me de Dave, não é questão de confiança, mas... bem... não sabem direito o que é a Ásia. Tive que convencê-los de que a compra de controle da General Stores vai dobrar o seu bruto em três anos.
— Em um — interrompeu Dunross firmemente, divertindo-se, — Lamento que seu grupo não vá compartilhar nossos imensos lucros advindos daquele pequeno setor dos nossos grandes planos de expansão. Tome um pouco de chá na nossa tribuna. Desculpe, mas tenho que dar um telefonema.
Pegou Murtagh firmemente pelo cotovelo e levou-o porta afora, fechando-a às suas costas.
Na cozinha, Murtagh olhava para a porta fechada, atordoado pela barulheira alegre dos pratos e das obscenidades proferidas em cantonense pelos vinte cozinheiros e ajudantes.
— Puxa — murmurou, quase em pânico —, oito minutos? Porra, será que os malditos suíços estão tentando nos roubar o cliente?
Afastou-se, com passos incertos.
Dentro da sala, Dunross estava no seu telefone particular, escutando o aparelho soar.
— Weyyyyy?
— O sr. Tip, por favor — disse com cuidado, em cantonense. — Aqui fala o sr. Dunross.
Ouviu o telefone ser largado ruidosamente e a amah gritar estridentemente:
— Telefone! Para o senhor, Pai.
— Quem é?
— Um demônio estrangeiro. Dunross sorriu.
— Alô?
— Ian Dunross, sr. Tip. Estava preocupado que sua doença tivesse piorado.
— Ah, ah, é, desculpe por tão ter podido ir. É, eu, eu tive uns problemas muito urgentes, compreende? É. Muito urgentes. Ah, a propósito, que azar o que houve com Noble Star. Acabo de ouvir no rádio que Pilot Fish ganhou por um focinho, após uma objeção. Qual foi a objeção?
Pacientemente Dunross explicou, e respondeu à pergunta sobre a sua proposta de compra de controle da General Stores, radiante porque as notícias já tinham chegado até ele. Se haviam chegado ao Tiptop, então chegariam a todos os jornais. "Ótimo", pensou, esperando para poder entrar no seu assunto, mas Tiptop passou-lhe a perna.
— Bem, obrigado pelo telefonema, tai-pan. Prontamente, Dunross falou:
— Foi um prazer. Ah, a propósito, confidencialmente, parece-me possível que a polícia tenha descoberto que um dos seus subalternos cometeu um erro.