— Não ouviram falar de nenhum filho rico que tenha sido seqüestrado, ouviram?
Todos fizeram que não com a cabeça.
— Não estou surpreso — disse Smyth. — É uma burrice da parte das famílias das vítimas negociarem com os seqüestradores e ficarem caladas. Infelizmente, os cadáveres foram descobertos por gente local, portanto haverá manchetes até hoje à noite, daqui até Pequim.
— Quer levar os corpos de volta de helicóptero?
— Ah, não, tai-pan. Tenho pressa de trazer para cá alguns peritos do DIC para revistarem a área antes que as chuvas voltem. Precisamos tentar identificar os coitados. O senhor pode partir imediatamente?
— Sim, sem dúvida.
— Obrigado. Desculpe o incômodo. Uma pena o que houve com Noble Star. Mas apostarei a minha bolada no senhor no sábado.
Smyth fez um gesto cortês de cabeça e se afastou. George T'Chung estava francamente nervoso.
— Somos todos alvos para aqueles filhos da mãe, os Lobisomens. Você, eu, o meu velho, qualquer um. Pombas, como poderemos proteger-nos contra eles?
Ninguém lhe respondeu. A seguir, Dunross disse, com uma risada:
— Não há motivo para se preocupar, meu velho. Somos todos invioláveis.
73
10h01m
O telefone tocou na penumbra do quarto. Bartlett acordou, estremunhado.
— Alô?
— Bom dia, sr. Bartlett, aqui fala Claudia Chen. O tai-pan mandou perguntar se o senhor vai precisar do carro para alguma coisa.
— Não, não, obrigado. — Bartlett olhou para o relógio.
— Meu Deus! — resmungou em voz alta, espantado por ter dormido tanto. — Obrigado, obrigado, Claudia.
— A viagem para Taipé foi marcada para a outra sexta-feira, a partida na sexta e a volta na segunda ao meio-dia. É conveniente para o senhor?
— É, é, claro.
— Obrigada.
Bartlett desligou e recostou-se por um momento, despertando de vez. Espreguiçou-se gostosamente, feliz por não ter que fazer nada às pressas, curtindo o raro prazer de ser apenas um pouquinho preguiçoso.
Às quatro horas da madrugada pendurara o cartaz de "Não perturbe" na porta, desligara os telefones até as dez horas e fora dormir. Na noite anterior, Orlanda o levara até Aberdeen, onde alugara um Barco do Prazer. Tinham vagado pelos canais, a chuva tornando mais aconchegante a cabine coberta, o braseiro aquecendo, a comida quente e condimentada.
— Em Xangai cozinhamos com alho, pimenta-malagueta, pimentões e todo tipo de condimentos — ela lhe dissera, servindo-o, os pauzinhos uma extensão delicada de seus dedos.
— Quanto mais para o norte se vai, mais picante a comida, menos arroz se come, e mais pão e talharim. No norte come-se trigo, só na parte sul da China é que se come arroz, Linc. Mais?
Ele comera bem e tomara a cerveja que ela trouxera consigo. A noite fora feliz para ele, o tempo passando sem que percebessem, enquanto ela o regalava com histórias da Ásia e de Xangai, a mente hábil e alerta. Depois, mais tarde, a chuva batendo no toldo, os pratos retirados, os dois deitados lado a lado nas almofadas, dedos entrelaçados, ela dissera:
— Linc, desculpe, mas eu o amo. Ele fora pego de surpresa.
— Não precisa pedir desculpas — dissera, não estando ainda pronto para responder adequadamente.
— Ah, mas preciso, sim. Isso complica as coisas, complica muito as coisas.
"É", pensou ele. "É tão fácil para uma mulher dizer 'Eu o amo', e tão difícil para um homem, tão insensato para um homem, pois você fica amarrado. Esta é a palavra certa?" Novamente, não encontrou resposta.
Agora, deitado na cama, a cabeça apoiada nos braços, ficou rememorando a noite. Tocando e largando, depois as mãos se buscando, as dele e as dela, mas sem nada concluir. Não que ela o impedisse ou detivesse. Ele simplesmente se con-tivera. Definitivamente.
— Você nunca agiu assim antes — murmurou em voz alta. — Quando deixava uma garota excitada, ia até o fim. — Desejou ter ido, lembrando do quanto se haviam desejado. Mas as palavras "Não sou transa para uma noite, nem uma vagabunda eurasiana" ecoaram em seus ouvidos.
No táxi, indo para a casa dela, não se haviam falado, apenas ficado de mãos dadas. "Essa é a parte mais cretina", pensou, sentindo-se idiota, infantil, "apenas de mãos dadas. Se alguém tivesse me dito há um mês, há uma semana, que me contentaria com isso, teria dito que era um imbecil e apostado nisso.
"Dinheiro. Tenho mais do que o bastante para mim e Orlanda. Mas, e quanto a Casey? E à Par-Con? As primeiras coisas em primeiro lugar. Vejamos se Casey me fala do Murtagh e por que 'moitou' essa transação. Gornt? Gornt ou Dunross? Dunross tem classe, e se Banastasio está contra ele, isso já é um grande voto de confiança."
Depois que contara a Armstrong a teoria deles sobre o Banastasio, Armstrong dissera:
— Vamos ver o que conseguimos descobrir, embora as credenciais do sr. Gornt sejam absolutamente impecáveis na colônia. Pode ficar descansado que Vincenzo Banastasio vai figurar no topo da nossa lista negra. Mas não é nos Estados Unidos que ele constitui uma verdadeira ameaça?
— Ah, é, sim. Mas já falei com Rosemont e...
— Ótimo. Fez muito bem. Ele é um bom homem. Esteve com Ed Langan?
— Não. Ele também é da CIA?
— Nem sei se, oficialmente, o sr. Rosemont o é, sr. Bartlett. Deixe comigo. Ele teve alguma sugestão a fazer sobre as armas?
— Não.
— Bem, não se preocupe. Passarei sua informação adiante e entrarei em contato com ele... é realmente muito bom.
Um pequeno tremor percorreu Bartlett. "Terá que ser mesmo muito bom para acertar a Máfia, se é que o Banastasio é realmente da Máfia."
Estendeu a mão para o telefone e ligou para o número do quarto de Casey. Não atenderam. Então ele ligou para a recepção, pedindo os seus recados. O encarregado disse que tudo já havia sido colocado sob sua porta.
— Quer que mandemos subir seus telegramas e telex?
— Claro, obrigado. Algum recado da parte de Casey Tcholock?
— Não, senhor. —• Obrigado.
Saltou da cama e foi até a porta. Entre os recados telefônicos, havia um envelope. Reconheceu a letra dela. Todos os recados eram comerciais, exceto um deles: "O sr. Banastasio ligou. Por favor, responda ao telefonema". Bartlett deixou o recado de lado. Abriu o envelope de Casey. O bilhete fora escrito às nove e quarenta e cinco e dizia: "Oi, Linc... não quis atrapalhar seu sono gostoso... volto Iá pelas seis. Divirta-se!"
"Para onde será que ela foi?", perguntou-se distraidamente.
Pegou o telefone para ligar para Rosemont, mas mudou de idéia e ligou para Orlanda. Ninguém atendeu. Discou de novo. O telefone tocava e tocava, sem parar.
— Merda! — exclamou, afastando o seu desapontamento. "Vocês combinaram almoçar juntos, então por que está tão chateado? Vão tomar um misto de café e almoço aqui no alto do Vic, com tempo de sobra para ficarem juntos, a refeição de domingo no lugar onde 'a nata vem almoçar, Linc. Ah, é formidável, o bufê quente e frio é o sucesso da Ásia. O melhor possível!' "
— Meu Deus, com tanta comida, na semana que vem estarei pesando uma tonelada!
— Não você, nunca, nunca, nunca. Se quiser, podemos fazer uma longa caminhada, ou, quando a chuva parar, jogaremos tênis. Faremos o que você quiser! Ah, Linc, eu o amo tanto...
Casey estava apoiada na amurada do cais de Kowloon, no meio do povo. Usava calças caqui e uma blusa de seda amarela, que revelavam o seu corpo sem exibi-lo, um suéter de caxemira combinando amarrado descuidadamente em torno do pescoço, tênis, e na bolsa grande levava um maio... "Não que vá precisar dele hoje", pensou, o Pico envolto em nuvens até Mid Leveis, o céu quase negro a leste, e uma linha pesada de ventania e chuva quase tocando a ilha. Um pequeno helicóptero passou sobrevoando para cruzar o porto na direção da zona central. Viu quando ele pousou num dos prédios. "Não é o Edifício Struan? Claro que sim. Será que o Ian está Iá?