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O acolchoado era macio, cheio de penas.

— Seja meigo comigo, meu querido — murmurou ela, roucamente. — Ah, como eu o amo!

Da popa do Sea Witch Casey acenou um adeus para Dunstan Barre, Plumm e Pugmire, que estavam no cais, do lado de Hong Kong, onde haviam acabado de ser desembarcados, o final da tarde agradável, mas ainda nublado. O barco cruzava a baía de novo — Peter Marlowe e as garotas já tinham sido deixados em Kowloon —, pois Gornt a persuadira a ficar a bordo para a viagem extra.

— Tenho que voltar de novo para Kowloon — dissera ele. — Tenho um compromisso no Nove Dragões. Quer me fazer companhia, por favor?

— E por que não? — ela concordara feliz, sem pressa, ainda com tempo de sobra para mudar de roupa para o coquetel para o qual Plumm a convidara à tarde. Resolvera adiar o seu jantar com Lando Mata para um dia qualquer da semana seguinte.

No caminho de volta de Sha Tin, à tarde, ela cochilara parte do tempo, enrolada num cobertor por causa da brisa fria, enroscada nas poltronas amplas e confortáveis que rodeavam a popa, os outros convidados dispersos, às vezes Gornt ali ao leme, alto, forte e senhor do seu barco, Peter Marlowe cochilando sozinho numa espreguiçadeira da proa. Mais tarde tomaram chá com bolinhos, ele, Casey e Barre. Durante o chá, Pugmire e Plumm haviam aparecido, descabelados e satisfeitos, com as garotas a tiracolo.

— Dormiram bem? — perguntara Gornt, com um sorriso.

— Muito — respondera Plumm.

"Acredito", pensara ela, observando-o, e à sua garota, gostando dela... olhos grandes e escuros, esguia, uma pessoa feliz chamada Wei-wei, que se grudava a ele como uma sombra.

Pouco antes, quando ela e Gornt tinham ficado sozinhos no tombadilho, ele lhe contara que nenhuma daquelas garotas era uma amiguinha casual, eram todas especiais.

— Todo mundo aqui tem uma amante?

— Santo Deus, não. Mas, bem, desculpe, os homens e as mulheres envelhecem de modo diferente, e depois de certa idade fica difícil. Para falar com franqueza, ir para a cama, amor e casamento não são a mesma coisa.

— Não existe fidelidade?

— Mas claro, sem dúvida. Para a mulher significa uma coisa, para o homem outra.

Casey soltara um suspiro.

— Que terrível! Terrível e injusto.

— É. Mas apenas se se quer que seja.

— Isso não é direito! Pense nos milhões de mulheres que trabalham e se escravizam a vida toda, cuidando do homem, esfregando e limpando, e hoje em dia até ajudando a sustentar os filhos, para serem jogadas de lado quando forem velhas.

— Não se pode culpar os homens, é assim que a sociedade é.

— E quem dirige a sociedade? Os homens! Pombas, Quillan, você tem que admitir que os homens são os responsáveis!

— Já concordei que é injusto, mas também é injusto para os homens. E quanto aos milhões de homens que se matam de trabalhar para prover... que palavrinha infeliz!... para prover o dinheiro para os outros gastarem, especialmente as mulheres? Enfrente a realidade, Ciranoush, os homens têm que continuar trabalhando até morrer, para sustentar os outros, e mais do que freqüentemente, no final das suas vidas, uma mulher irritante, uma megera... olhe só para a mulher do Pug, pelo amor de Deus! Eu poderia lhe indicar cinqüenta que são desnecessariamente gordas, feias e fedem... literalmente. E ainda há aquele outro simpático truquezinho feminino das mulheres, que usam o seu sexo para prender os homens numa armadilha, para ficarem grávidas e os agarrarem, depois se queixarem de tudo e exigirem um divórcio altamente compensador. E quanto ao Linc Bartlett, hem? Que espécie de "sua-douro" lhe deu aquela sua mulher maravilhosa, hem?

— Sabia disso?

— Claro. Vocês verificaram a minha ficha, eu verifiquei a de vocês dois. As suas leis de divórcio são justas? Cinqüenta por cento de tudo, e depois o pobre coitado do homem americano ainda tem que ir aos tribunais para decidir qual a proporção dos seus cinqüenta por cento que pode manter.

— É verdade que a mulher de Linc e o advogado quase o deixaram na rua da amargura. Mas nem toda mulher é assim. Mas, meu Deus, não somos bens móveis, e a maioria das mulheres precisa de proteção. As mulheres em todo o mundo ainda acabam sempre ficando na pior.

— Nunca conheci uma mulher de verdade que acabasse ficando na pior — dissera ele. — Estou me referindo a mulheres como você e Orlanda, que entendem o que é a feminilidade. — De repente, ele abrira um amplo sorriso. — Claro que, pelo caminho, ela tem que nos dar a nós, filhos da mãe fracos, o que queremos para nos manter saudáveis.

Ela rira junto com ele, também querendo deixar de lado aquele assunto... difícil demais de ser solucionado naquele momento.

— Ah, Quillan, você é mesmo um dos que não prestam!

— Sou?

— É.

Ele se virará para perscrutar o céu à frente. Ela o observava, e ele lhe parecera tão alinhado, ali de pé, oscilando de leve, o vento eriçando os pêlos dos seus antebraços fortes, o quepe de capitão num ângulo atrevido. "Que bom que ele confia em mim e me considera uma mulher", pensara, embalada pelo vinho, pela comida e pelo desejo dele. Desde que subira a bordo ela o sentira fortemente, e se perguntava de novo como lidaria com ele quando se manifestasse, o que inevitavelmente aconteceria. Seria sim ou não? Ou talvez? Ou talvez na semana que vem?

Haveria uma semana que vem?

— O que vai acontecer amanhã, Quillan? Na Bolsa de Valores?

— O amanhã pode cuidar do amanhã — dissera ele, o vento a fustigá-lo.

— Fala a sério?

— Ganharei ou não ganharei. — Gornt dera de ombros. — De qualquer maneira, estou coberto. Amanhã eu compro. Com sorte, eu o deixo na pior.

— E depois?

Ele dera uma risada.

— Tem alguma dúvida? Arranco o couro dele, e a tribuna no hipódromo.

— Ah, você realmente deseja isso, não é?

— Ah, sim! Ah, sim! Isso representa a vitória. Ele e os antepassados dele excluíram a mim e aos meus. Claro que quero isso.

"Será que eu poderia fazer um acordo com o Ian?", pensou distraidamente. "Será que conseguiria que o tai-pan permitisse que Quillan tivesse a sua própria tribuna, e o ajudasse a se tornar um administrador? É uma loucura esses dois viverem às turras... há lugar de sobra para ambos. O Ian me deve um favor, se o Murtagh conseguir o acordo."

O coração dela se agitara, e ela ficara imaginando o que teria acontecido com Murtagh e o banco e, se a resposta fosse sim, o que Quillan faria.

"E onde anda o Linc? Estará com a Orlanda, nos braços dela, passando a tarde?"

Enroscara-se de novo na popa e fechara os olhos. O ar salgado, o ronco dos motores e o balanço do mar a tinham feito dormir. O sono dela foi sem sonhos, como se estivesse no útero, e dali a alguns minutos acordou, recuperada. Gornt agora estava sentado diante dela, observando-a. Estavam sozinhos de novo, o capitão cantonense ao leme.

— Tem um belo rosto quando dorme — disse ele.

— Obrigada. — Ela se mexeu e se apoiou num dos cotovelos. — Você é um homem estranho. Parte demônio, parte príncipe, compassivo num minuto, implacável no seguinte. Foi uma coisa maravilhosa o que fez pelo Peter. — Ele apenas sorriu e esperou, os olhos estranha e agradavelmente desafiadores. — O Linc... acho que o Linc está gamado pela Orlanda — disse ela sem pensar, e viu uma sombra passar pelo seu rosto.

— É?

— É. — Ela esperou, mas ele ficou calado, apenas observando-a. Espicaçada pelo silêncio, ela acrescentou, involuntariamente: — Acho que ela está gamada por ele. — Novo e longo silêncio. — Quillan, isso faz parte de um plano?

Ele riu baixinho, e ela sentiu o domínio dele.

— Ah, Ciranoush, você é que é estranha. Eu não...

— Não quer me chamar de Casey? Por favor? Ciranoush não soa bem.

— Mas eu não gosto de Casey. Posso usar o Kamalian?