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— Não gostaria de pagar essa aposta. A matança será pavorosa.

— É. Mas, ainda assim, vai acontecer. Mao está certo, outra vez. Será realmente pavorosa... mas não catastrófica. — Brian Kwok apertou de novo o botão do elevador, com irritação. Ergueu os olhos, subitamente. — Será que finalmente foi iniciada a invasão, vinda de Formosa?

— Qual é, Brian! Fantasia? Deixe disso! Chang Kai-chek jamais sairá de Formosa.

— Se não sair, o mundo todo ficará atolado na pilha de estrume. Se Mao tiver trinta anos para consolidar... Meu Deus, você nem imagina! Um bilhão de autômatos? Chang é que estava certo em perseguir os comunas sacanas... são eles os verdadeiros inimigos da China. São a praga da China. Santo Deus, se tiverem tempo para condicionar todos os garotos!

— Você fala exatamente como um nacionalista militante — disse Armstrong suavemente. — Esfrie a cuca, rapaz, tudo está uma bosta no mundo, que não é nem nunca será normal... mas você, cão capitalista, pode correr no sábado, fazer alpinismo no domingo, e há sempre muitas gatinhas para comer. Certo?

— Desculpe. — Entraram no elevador. — Aquele sacana do Meng me tirou do sério — disse Brian, apertando o botão do último andar.

Armstrong passou a falar em cantonense.

— Dane-se a sua mãe com o seu desculpe, Irmão.

— E a sua foi enfiada por um macaco vagabundo com um só testículo num balde de excrementos de um porco.

Armstrong riu de orelha a orelha.

— Nada mau, Brian — falou, em inglês. — Nada mau mesmo.

O elevador parou. Seguiram pelo corredor pardacento. Diante da porta, prepararam-se, Brian bateu suavemente.

— Entre.

Roger Crosse estava na casa dos cinqüenta anos, um homem alto e magro de olhos azuis muito claros e cabelos louros, que começavam a ficar ralos, e mãos pequenas, de dedos longos. Sua mesa era meticulosamente arrumada, como suas roupas civis — um gabinete espartano. Indicou as cadeiras. Sentaram-se. Continuou lendo uma pasta. Quando acabou, fechou-a com cuidado e colocou-a diante de si. A capa era pardacenta, comum, de uso dos gabinetes.

— Um milionário americano chega com armas contrabandeadas, um milionário xangaiense muito suspeito, ex-traficante de drogas, foge para Formosa, e agora um seqüestro com, Deus nos ajude, Lobisomens e uma orelha mutilada. Tudo isso em dezenove horas e uns quebrados. Onde está a ligação? Armstrong rompeu o silêncio.

— E deveria haver alguma, senhor?

— Não deveria?

— Desculpe, senhor, não sei. Ainda.

— Isso é muito chato, Robert, muito chato mesmo.

— Sim, senhor.

— Tedioso, para falar a verdade, especialmente porque os poderes lá de cima já começaram a respirar pesadamente no meu pescoço. E quando isso acontece... — Sorriu para eles, e ambos reprimiram um arrepio. — Claro, Robert, eu lhe avisei ontem que nomes importantes poderiam estar envolvidos.

— Sim, senhor.

— Bem, Brian, estamos preparando você para um alto posto. Não acha que podia desviar sua atenção de corridas de carro, corridas de cavalo e rabos-de-saia, e aplicar alguns dos seus talentos incontestes na solução deste modesto enigma?

— Sim, senhor.

— Por favor, faça-o. E bem depressa. Está designado para o caso juntamente com o Robert, porque pode requerer a sua perícia... durante os próximos dias. Quero essa história solucionada muito, mas muito depressa mesmo, pois temos um ligeiro problema. Um dos nossos amigos americanos no consulado ligou para mim ontem à noite. Particularmente. — Fez um gesto na direção da pasta. — Este é o resultado. Com a dica dele interceptamos o original nas horas mortas... é claro que esta é uma cópia, o original foi devolvido, naturalmente, e o... — ele hesitou, escolhendo a palavra correta — mensageiro, um amador, diga-se de passagem, saiu sem ser incomodado. É um relatório, uma espécie de análise confidencial de notícias com diferentes cabeçalhos. São todos muito interessantes. É, são. Um deles diz "KGB na Ásia". Alega que têm uma rede de espionagem ultra-secreta, da qual nunca ouvi falar, de codinome "Sevrin", com gente hostil de alto nível em posições-chaves no governo, na polícia, no empresariado, ao nível dos tai-pans, espalhada por todo o sudeste asiático, especialmente aqui em Hong Kong.

Um assobio mudo escapou dos lábios de Brian Kwok.

— Isso mesmo — disse Crosse, amavelmente. — Se for verdade.

— E acha que é, senhor? — perguntou Armstrong.

— Francamente, Robert, talvez você esteja precisando de uma aposentadoria precoce por motivos de saúde: está de miolo mole. Se eu não estivesse preocupado, acha que me submeteria ao prazer infeliz de solicitar a assistência do DIC de Kowloon?

— Não, senhor. Desculpe, senhor.

Crosse virou a pasta para eles, e abriu-a na página inicial. Os dois homens soltaram uma exclamação abafada. Dizia: "Confidencial, somente para Ian Dunross. Entregue em mãos, relatório 3/1963. Uma única cópia".

— É — continuou Crosse. — É. Esta é a primeira vez que temos provas concretas de que a Struan tem seu próprio sistema de informações. — Sorriu para eles, que ficaram arrepiados. — Certamente me agradaria saber como os negociantes conseguem estar a par de todo tipo de informações muito íntimas que devíamos saber séculos antes deles.

— Sim, senhor.

— É óbvio que o relatório faz parte de uma série. Ah, sim, e este aqui está assinado pelo Comitê de Pesquisas da Struan 16, por um certo A. M. Grant... datado em Londres, há três dias.

Brian Kwok soltou nova exclamação.

— Grant? Seria o Alan Medford Grant, associado do Instituto de Planejamento Estratégico de Londres?

— Nota 10, Brian, não errou uma. É. O Sr. A. M. Grant em pessoa. O Sr. VIP, o conselheiro do governo de Sua Majestade para negócios sigilosos, que sabe distinguir alhos de bugalhos. Conhece-o, Brian?

Brian Kwok respondeu:

— Encontrei-o umas duas vezes na Inglaterra o ano passado, senhor, quando fiz o curso para oficiais superiores da Escola do Estado-Maior. Apresentou um trabalho sobre as considerações estratégicas avançadas no Extremo Oriente. Brilhante. Absolutamente brilhante.

— Felizmente ele é britânico e está do nosso lado. Mesmo assim... — Crosse soltou outro suspiro. — Espero sinceramente que ele esteja enganado desta vez, ou estamos mais atolados do que até eu imaginava. Parece que poucos dos nossos segredos ainda são segredos. Cansativo. Muito. E quanto a isso — tocou de novo na pasta —, estou realmente muito chocado.

— O original foi entregue, senhor? — quis saber Armstrong.

— Foi. A Dunross, pessoalmente, às quatro horas e dezoito minutos desta tarde. — A voz dele ficou ainda mais sedosa. — Felizmente, graças a Deus, minhas relações com nossos primos de além-mar são de primeira classe. Como as suas, Robert... e ao contrário das suas, Brian. Nunca realmente gostou dos Estados Unidos, não é, Brian?

— Não, senhor.

— Por quê, posso perguntar?

— Falam demais, senhor, e não dá para a gente lhes confiar nenhum segredo... são escandalosos, e acho que são burros.

Crosse sorriu apenas com os lábios.

— Não é motivo para não se dar bem com eles, Brian. Quem sabe o burro não é você?

— Sim, senhor.

— Não são todos burros, de jeito nenhum.

O diretor fechou a pasta, mas deixou-a virada para eles, que a fitavam, fascinados.

— Os americanos contaram como descobriram sobre a pasta, senhor? — perguntou Armstrong, sem pensar.

— Robert, creio realmente que sua sinecura em Kowloon deixou você de miolo mole. Devo recomendá-lo para uma aposentadoria por razões de saúde?

O grandalhão se crispou todo.

— Não, senhor. Obrigado, senhor.

— Nós lhes revelaríamos as nossas fontes?

— Não, senhor.

— Eles me diriam, se eu fosse grosso a ponto de lhes perguntar?

— Não, senhor.

— Essa história toda é muito tediosa, e cheia de desprestígio. Para mim. Não concorda, Robert?