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— Como?

— Qual é, Robert? Você sabe como os chineses são unidos. Talvez haja uma pasta, tal...

— Está querendo dizer que estão todos organizados numa irmandade? Uma tong, uma sociedade secreta? Uma tríade dentro da polícia?

— Eu disse "talvez". Tudo isso são suposições, Robert. Eu disse "talvez" e "pode ser".

— Quem é o Grande Dragão? Você?

— Nunca disse que havia tal agrupamento. Disse "talvez". — Existem outras pastas? Sobre mim, por exemplo?

— Talvez.

— E?

— E, se houvesse, Robert — disse Brian Kwok, suavemente —, ela diria que você é um excelente policial, incorrupto, que jogou muito na Bolsa, e jogou mal, e precisava de vinte e tantos mil dólares para pagar umas dívidas urgentes... e mais algumas coisinhas.

— Que coisinhas?

— Estamos na China, amigão. Sabemos de quase tudo o que se passa com os quai loh. Temos que sobreviver, não?

Armstrong olhou para ele, de modo estranho.

— Por que não me contou antes?

— Não lhe contei nada, agora. Nada. Disse "talvez" e repito: "talvez". Mas se tudo isso for verdade... — entregou a pasta e enxugou o suor do lábio superior. — Leia você mesmo. Se for verdade, estamos no mato sem cachorro e teremos que agir muito rapidamente. O que eu falei foram apenas suposições. Mas não quanto a Crosse. Escute, Robert, aposto mil... mil contra um que o toupeira é ele.

10

19h43m

Dunross acabou de ler a pasta de capa azul pela terceira vez. Leu-a logo que chegou, como sempre, depois mais uma vez, enquanto se dirigia para o palácio do governador. Fechou a capa azul e pousou-a por um momento no colo, a mente tumultuada. Agora, estava no seu escritório no segundo andar da Casa Grande, que se situava num cômodo na parte superior do Pico, os janelões envidraçados dando para jardins iluminados por holofotes, e depois, bem lá embaixo, a cidade e a imensidão do porto.

O relógio de pé, antigo, bateu um quarto para as oito.

"Faltam quinze minutos", pensou. "Depois, nossos convidados chegam, a festa começa e todos tomamos parte numa nova charada. Ou quem sabe apenas continuamos com a mesma."

A sala tinha teto alto e lambris de carvalho velho, cortinas de veludo verde-escuro e tapetes de seda chineses. Era um aposento masculino, confortável, antigo, um pouco gasto e decorado com carinho. Ouviu as vozes abafadas dos criados, lá embaixo. Um carro subiu o morro e passou adiante.

O telefone tocou.

— Sim? Ah, alô, Claudia.

— Ainda não consegui falar com Tsu-yan, tai-pan. Não estava no escritório. Já ligou para o senhor?

— Não, ainda não. Continue tentando.

— Certo. Até daqui a pouco. Tchau.

Estava sentado numa poltrona funda, de braços e espaldar alto, e usava um dinner jacket com o nó na gravata ainda por dar. Ficou olhando distraído pela janela, a vista sempre agradável. Mas naquele dia estava cheio de maus pressentimentos, pensando em Sevrin, no traidor, e em todas as outras coisas más que o relatório previra.

O que fazer?

— Rir — falou em voz alta. — E lutar.

Levantou-se e caminhou com passos suaves até o retrato a óleo de Dirk Struan que estava na parede, acima da cornija da lareira. A moldura era pesada, dourada e velha, o dourado estava lascado aqui e ali, e havia dobradiças secretas num dos lados. Afastou-a da parede e abriu o cofre que a tela escondia. No cofre havia muitos papéis, alguns amarrados com capricho com fitas escarlates, alguns antigos, outros novos, umas poucas caixinhas, uma Mauser carregada e bem lubrifiçada presa a um dos lados do cofre, uma caixa de munição, uma imensa Bíblia antiga com as armas da Struan gravadas no belo couro velho, e sete pastas de capa azul, semelhantes à que trazia nas mãos.

Pensativo, colocou a pasta ao lado das outras, em seqüência. Fitou-as por um momento, e começou a fechar o cofre, mas mudou de idéia quando seus olhos depararam com a Bíblia antiga. Acariciou-a de leve, depois tirou-a de lá e abriu-a. Presas à grossa folha de rosto com lacre velho, havia as metades de duas velhas moedas de bronze chinesas, partidas grosseiramente. Era óbvio que, antigamente, tinha havido quatro daquelas meias moedas, pois ainda havia a impressão das duas que faltavam, e os restos do mesmo lacre vermelho presos ao papel antigo. A caligrafia que encabeçava a página era linda e nítida: "Juro pelo Senhor Deus, que, quem quer que seja que apresente a outra parte de qualquer dessas moedas, eu lhe concederei qualquer coisa que pedir". Estava assinado: "Dirk Struan, 10 de junho de 1841", e abaixo da assinatura dele havia a de Culum Struan e as de todos os outros tai-pans, e o último nome era Ian Dunross.

Ao lado do primeiro espaço, onde antes houvera uma moeda, fora escrito: "Wu Fang Choi, pago parcialmente, 16 de agosto, Ano do Nosso Senhor de 1841", e havia novamente a assinatura de Dirk Struan, com a co-assinatura de Culum Struan logo abaixo, e, datado de 18 de junho de 1845, "pago integralmente". Ao lado do segundo: "Sun Chen-yat, pago integralmente, 10 de outubro de 1911", assinado, ousadamente, pela Bruxa Struan.

"Ah", disse Dunross para si mesmo, perturbado, "que bela arrogância! Ser segura ao ponto de assinar o livro daquele jeito, e não como Tess Struan, para que as futuras gerações vissem.

"Quantas gerações mais?", perguntou-se. "Quantos tai-pans mais terão que assinar cegamente, e fazer o juramento sagrado de cumprir os desejos de um homem morto há quase um século e meio?"

Pensativo, correu os dedos pelas beiradas irregulares das duas meias moedas que restavam. Depois de um momento, fechou a Bíblia com firmeza, colocou-a de novo no lugar, tocou-a uma vez para dar sorte e trancou o cofre. Girou a tela de volta para o lugar, e fitou o quadro, agora de pé, com as mãos enfiadas nos bolsos, diante da cornija da lareira, o carvalho velho e pesado entalhado com as armas da Struan, lascado e quebrado aqui e ali, um velho pára-fogo chinês em frente da imensa lareira.

Aquele retrato a óleo de Dirk Struan era o seu preferido. Quando se tornara tai-pan, ele o havia tirado da Galeria Longa e o pendurara ali no lugar de honra, em substituição ao retrato da Bruxa Struan que encimara a lareira do escritório do tai-pan desde que existira uma Casa Grande. Ambos tinham sido pintados por Aristotle Quance. No retrato, Dirk Struan estava de pé diante de uma cortina carmesim, ombros largos, arrogante, seu casaco preto bem-talhado, o colete, a gravata e a camisa de babados brancos e bem-talhados. Sobrancelhas cerradas, nariz forte, cara raspada, cabelos avermelhados e suíças, lábios encrespados, e podia-se sentir os seus olhos penetrantes, o verde deles realçado pelo preto, o branco e o escarlate.

Dunross deu um meio sorriso, sem medo, sem inveja, mais acalmado do que qualquer outra coisa pelo olhar do seu ancestral... sabendo que era possuído, parcialmente possuído por ele. Ergueu a taça de champanha para a tela numa brincadeira meio zombeteira, como havia feito tantas vezes antes.

— Saúde!

Os olhos o fitavam, também.

"O que faria você, Dirk... fantástico Dirk?", pensou.

— Provavelmente diria: "Encontre os traidores e mate-os" — refletiu em voz alta —, e provavelmente teria razão.

O problema do traidor na polícia não o abalava tanto quanto a informação sobre a rede de espionagem Sevrin, suas ligações nos Estados Unidos e os lucros secretos e espantosos obtidos pelos comunistas na Grã-Bretanha. "Mas que diabo, onde Grant consegue todas essas informações?", perguntou a si mesmo, pela centésima vez.

Lembrou-se do primeiro encontro que tiveram. Alan Medford Grant era um homem baixo, com jeito de gnomo, quase calvo, e tinha olhos e dentes grandes. Usava um terno riscadinho e chapéu-coco, e Dunross gostou dele imediatamente.

— Não se preocupe, Sr. Dunross — dissera Grant quando Dunross o contratara em 1960, logo que se tornara tai-pan. — Asseguro-lhe que não haverá interesses conflitantes com o governo de Sua Majestade, se eu presidir o seu comitê de pesquisas, sem exclusividade, como combinamos. Para falar a verdade, já obtive a aprovação deles. Dar-lhe-ei apenas, confidencialmente, é claro, para o senhor pessoalmente, é claro, e com a publicação absolutamente vedada, dar-lhe-ei apenas as informações sigilosas que, na minha opinião, não põem em risco o interesse nacional. Afinal de contas, nossos interesses são os mesmos, não são?