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Normalmente, o "Cordon Jaune" revelar-se-ia um excelente investimento; e é possível que Le Chiffre tenha sido levado mais pelo desejo de aumentar seus fundos sindicais do que pela esperança de aumentar sua própria fortuna especulando com o dinheiro dos patrões. De qualquer maneira, está claro que Ele poderia ter encontrado outros investimentos mais aceitáveis do que a prostituição, se não tivesse sido tentado pelos lucros de ilimitado número de mulheres para seu próprio uso.

O destino castigou-o com uma presteza terrível.

Nem três meses depois, no dia 13 de abril, foi promulgada uma lei na França, de n.° 46.685, intitulada "Lei visando ao fechamento das casas de tolerância e ao reforço da luta contra o proxenetismo".

(Quando M leu esta frase, resmungou e apertou o botão do aparelho de comunicação interna-"Chefe da S?" "Sim, senhor".

"Que diabo quer dizer esta palavra?" Soletrou-a. "Exploração de mulheres, senhor".

"Isto aqui não é uma Escola de Línguas, chefe da S. Se você quer mostrar seus conhecimentos sobre como enrolar a língua para dizer palavras estrangeiras, faça a gentileza de providenciar um abridor de latas. Ou, melhor, escreva em inglês", "Desculpe, senhor".

M soltou o botão e voltou a ler o memorando.) Esta lei (prosseguiu Ele na leitura), conhecida popular-mente como a "lei Marthe Richard", fechando todas as casas de má fama e proibindo a venda de filmes e livros pornográficos, virou de pernas para o ar o investimento de Le Chiffre quase da noite para o dia, e de uma hora para outra Ele teve de enfrentar um sério déficit em seus fundos sindicais. Em desespero de causa, transformou as casas de tolerância em maisons de passe, onde encontros clandestinos podiam ser realizados à margem da lei, e continuou a operar um ou dois cinemas bleus clandestinos; mas essas modificações não serviram de maneira alguma para cobrir suas perdas e todas as tentativas para vender os investimentos, mesmo com pesados prejuízos, falharam da mais desanimadora maneira possível. Enquanto isso, a Polícia de Costumes estava em seu encalço e em pouco tempo vinte ou mais de seus estabelecimentos foram fechados.

É claro que a Polícia só estava interessada nesse homem por ser um importante dono de bordéis, e foi preciso que demonstrássemos certo interesse em suas finanças para que o "Deuxième Bureau" desenterrasse o relatório que estava em mãos de seus colegas da polícia.

O significado de toda esta situação tornou-se claro para nós e para nossos amigos franceses e, nestes últimos meses, uma verdadeira caçada foi feita pela polícia aos estabelecimentos do "Cordon Jaune"; como resultado, hoje nada resta do investimento original de Le Chiffre e qualquer investigação de rotina acusaria um déficit de cerca de 50 milhões de francos nos fundos do sindicato em que Ele era tesoureiro e pagador-chefe.

Aparentemente, Leningrado ainda não suspeitou de nada; mas, infelizmente para Le Chiffre, é possível que Smersh já esteja no seu encalço. Na semana passada, uma alta fonte da Seção P informou que um oficial do eficiente órgão de vingança soviético deixara Varsóvia com destino a Estrasburgo, via setor oriental de Berlim. O "Deuxième Bureau" não confirmou esta informação, nem as autoridades em Estrasburgo (que são dignas de confiança e eficientes), e também não temos informações do quartel-general de Le Chiffre, que está sendo bem vigiado por um agente duplo, empregado deles que trabalha também para nos (e que ajuda a 1860) .

Se Le Chiffre soubesse que Smersh está no seu encalço ou que eles têm a mais leve suspeita dele, não haveria outra alternativa; tentaria suicidar-se ou fugir; mas seus planos atuais indicam que, se bem que não haja dúvida alguma sobre o fato de que está desesperado, ainda não desconfiou que sua vida pode estar em perigo. São esses planos um tanto espetaculares que nos sugeriram a contra-operação que, apesar de arriscada e inusitada, confiantemente apresentamos no fim deste memorando.

Para resumir, acreditamos que os planos de Le Chiffre seguirão o exemplo de outros autores de desfalques desesperados, que tentam cobrir o déficit de suas contas no jogo. A Bolsa é muito lenta. O mesmo ocorre com os vários tráficos ilícitos de drogas ou de remédios difíceis de encontrar, aureomicina, strep-tomicina e cortisona. Nenhum prado de corridas poderia agüentar o tipo de apostas que Ele teria de fazer, e, caso ganhasse, teria mais probabilidades de ser morto do que de ser pago.

De qualquer maneira, sabemos que Ele retirou os últimos 25 milhões de francos do cofre do seu sindicato e que alugou uma pequena vila perto de Royale-les-Eaux, um pouco ao norte de Dieppe, durante uma semana, há uma quinzena.

Espera-se, assim, que o Cassino de Royale veja o mais alto jogo da Europa neste verão. Num esforço para desviar o dinheiro grosso de Deauville e Le Touquet, a Sociedade dos Banhos de Mar de Royale arrendou o baccarat e as duas principais mesas de chemin-de-fer ao Sindicato de Mahomet Ali, um grupo de banqueiros e homens de negócios emigrados do Egito que, ao que se diz, entraram em alguns fundos reais e que há alguns anos estão tentando entrar também nos lucros de Zographos e seus sócios gregos que têm o monopólio das mais altas bancas francesas de baccarat.

Mediante uma discreta publicidade, um número considerável dos maiores operadores da América e da Europa foi encorajado a jogar em Royale neste verão e é possível que esta antiquada estação de águas recupere um pouco do renome que tinha na era vitoriana.

Seja como for, estamos certos de que é lá que, no dia 1.5 de junho, ou nos dias que se seguirem, Le Chiffre tentará ganhar no baccarat 50 milhões de francos com um capital de 25 milhões (e, incidentalmente, salvar a própria vida).

Contra-operação proposta

Seria de grande interesse para este país e para as outras nações da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) que este poderoso agente soviético fosse ridicularizado e destruído, que seu sindicato comunista fosse à falência e desacreditado, e que esta "quinta-coluna" em potencial com efetivo de 50 mil, capaz, em tempo de guerra, de controlar um vasto setor da fronteira norte da França, perdesse a fé e a coesão. Tudo isto aconteceria se Le Chiffre fosse derrotado na mesa de jogo. (N.B. — Não teria sentido assassiná-lo. Leningrado cobriria rapidamente suas dívidas e faria dele um mártir).

Portanto, recomendamos que ao melhor jogador pertencente ao Serviço fossem dados os fundos necessários para tentar vencer este homem no jogo.

Os riscos são óbvios e as possíveis perdas para os fundos do Serviço Secreto seriam altas; mas houve outras operações em que grandes quantias foram arriscadas com menor chance de êxito, muitas vezes por objetivos menores.

Se a decisão for desfavorável, a única alternativa seria colocar todas as nossas informações e recomendações nas mãos do "Deuxième Bureau" ou de nossos colegas norte-americanos da Agência Central de Inteligência (CIA) em Washington. Ambas as organizações, sem dúvida alguma, ficariam encantadas em levar adiante este esquema.

Assinado: S.

Apêndice A. Nome: Le Chiffre.

Alcunhas- variações das palavras "cifra" ou "número" em línguas diferentes; e.g., "Herr Zipher".

Origem: desconhecida.

Encontrado pela primeira vez como deslocado, campo de Pessoas Deslocadas de Dachau no setor norte-americano da Alemanha, em junho de 1945. Aparentemente sofrendo de amnésia e paralisia das cordas vocais (fingimento?). O tratamento curou a mudez, mas o paciente continuou a queixar-se de total perda da memória, exceto algumas associações de idéias que Fez com a Alsácia-Lorena e Estrasburgo, para onde foi transferido em setembro de 1945 com um passaporte de apátrida, n.° 304 596. Adotou o nome "Le Chiffre" ("já que eu não passo de um número em um passaporte"). Não consta nenhum nome de batismo.