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Já é muito tarde, estou cansada, e somente duas portas nos separam. Mas preciso ter coragem. Você poderia salvar minha vida, mas depois eu não agüentaria o seu olhar, que tanto adoro.

Meu amor, meu amor. V."

Bond jogou a carta no chão. Automaticamente esfregou os dedos uns contra os outros. De repente bateu nas têmporas com os pulsos e levantou-se. Olhou o mar calmo pela janela, depois praguejou em voz alta, um enorme palavrão.

Estava com os olhos molhados e enxugou-os.

Enfiou uma camisa e uma calça, com o rosto frio e composto desceu as escadas e trancou-se na cabine telefônica.

Enquanto esperava a ligação para Londres, passou calmamente em revista os fatos relatados na carta de Vésper. Tudo se encaixava perfeitamente. As pequenas sombras, os sinais de interrogação que haviam aparecido nas últimas quatro semanas, que seu instinto notara, mas que sua cabeça rejeitara, tudo estava claro agora como um letreiro luminoso.

No momento, só conseguia ver Vésper como uma espiã. Relegara o amor e a dor para um canto escuro de sua memória. Mais tarde, talvez esses sentimentos voltassem à tona, se examinados friamente, e então tornaria a escondê-los com amargura, junto com outros assuntos sentimentais que desejava esquecer. Mas naquele momento, só conseguia pensar que ela traíra o Serviço e a pátria, e em todo o mal que causara. Profissionalmente, analisava as conseqüências do caso — os disfarces descobertos naqueles anos todos, os códigos que o inimigo decifrara, os segredos que devem ter escapado daquela seção que se dedicava especialmente a obter informações sobre a União Soviética.

Era horrível. Só Deus sabia como aquela encrenca toda poderia ser consertada.

Bond sorriu amargamente para si mesmo. Enquanto ficava brincando de mocinho e bandido (sim, a imagem de Le Chiffre era perfeita), o verdadeiro inimigo estivera trabalhando bem a seu lado, calma e friamente, sem heroísmo algum.

Teve então uma visão: Vésper andando por um corredor, carregando uns documentos na mão. Numa bandeja. Eles recebiam as informações numa bandeja enquanto Ele, o frio agente secreto, um duplo-zero, andava namorando pelo mundo afora, brincando de mocinho e bandido.

Bond cravou as unhas nas palmas das mãos; sentiu tanta vergonha que seu corpo se cobriu de suor.

Bem, mas não era tarde demais. Ele tinha um alvo bem à mão. Passaria a ocupar-se com a Smersh. Sem a Smersh, essa fria arma de morte e vingança, a MWD seria somente outro grupo de espiões do serviço público, nem melhor nem pior que os serviços ocidentais.

Smersh era a recompensa. Ele agora sabia como se agia dentro dela: seja leal, faça um bom trabalho de espionagem ou você morrerá. Sem a menor dúvida, inevitavelmente, você será perseguido e morto.

Toda a máquina russa funcionava daquela maneira. É o medo que impulsiona as pessoas. Para eles, era sempre mais seguro avançar do que recuar. Avance contra o inimigo, porque há uma chance de que a bala não o acerte. Mas se você recuar, fugir, trair, a bala não errará o alvo.

Mas Ele agora atacaria a arma que tem o chicote e o revólver na mão. Esta estória de espionagem poderia ser deixada para os rapazes de colarinho e gravata. Eles podiam espionar e pegar espiões. Ele, Bond, perseguida a ameaça que fica atrás dos espiões, a ameaça que os fazia espiões.

O telefone tocou, Bond pegou o fone.

Estava falando com "O Elo", um oficial de ligação que era o único homem em Londres para quem Ele poderia telefonar de fora do país. E só em último caso.

Bond falava baixinho, dentro do fone.

"Quem está falando é o 007. Estou num telefone público. É uma emergência. Você está me ouvindo?. . . Transmita isto imediatamente: 3030 era um agente duplo a serviço dos vermelhos..."

"Sim, que diabo!, eu disse era. Aquela vaca morreu".