— Sim, senhor.
— Naturalmente — disse o Comandante do Campo para Larkin, incluindo Peter Marlowe e Mac na ordem — vocês ainda operarão o rádio.
— Se não se importa, senhor — disse Mac — deixe que outros o façam. Eu o consertarei, se houver algum problema, mas, bem, suponho que o queira deixar funcionando as vinte e quatro horas do dia. Não poderíamos fazer isso sozinhos, e... bem, falando por mim, agora que tudo foi descoberto, gostaria que outros partilhassem da escuta.
— Cuide disso, Coronel! — falou o Comandante do Campo.
— Sim, senhor — disse Smedly-Taylor.
— Agora, vamos discutir as operações.
Do lado de fora do alojamento do Comandante do Campo, um grupo de curiosos, incluindo Max, se reunia, impaciente para saber o que se dizia, e o que acontecera, e por que os guardas japoneses haviam saído de junto do rádio.
Quando já não podia mais agüentar a tensão, Max voltou correndo para a choça americana.
— Ei, pessoal! — berrou.
— Os japoneses vêm vindo? — perguntou o Rei, pronto para pular pela janela e correr para a cerca.
— Não! Meu Jesus — disse Max, sem fôlego, incapaz de coiitinuar.
— Mas que diabo aconteceu? — quis saber o Rei.
— Tiraram a guarda japonesa de junto do Pete e do rádio! — falou Max, recobrando o fôlego. — Depois, o Comandante do Campo levou Pete, Larkin e o escocês... e o rádio... para o alojamento dele. Estão todos reunidos lá, agora, todos os coronéis mais antigos... até o Brough está lá!
— Tem certeza? — perguntou o Rei.
— Estou-lhe dizendo que vi com esses olhos que a terra há de comer, mas também não estou acreditando.
No silêncio violento, o Rei puxou de um cigarro, e então Tex verbalizou aquilo de que ele já se havia dado conta.
— Quer dizer que acabou. Acabou de verdade. Tem que ser... se tiraram a guarda de junto do rádio! — Tex olhou à sua volta. — Não é?
Max largou-se pesadamente no beliche e enxugou o suor do rosto.
— É o que também acho. Se tiraram os guardas, quer dizer que vão desistir, aqui... vão parar de lutar. — Olhou para Tex, com ar indefeso. — Não é?
Mas Tex estava perdido na sua confusão particular. Finalmente, falou, com cara impassíveclass="underline"
— Acabou.
O Rei dava baforadas no cigarro, com ar sério.
— Só acredito quando vir com meus olhos. — E então, de repente, no silêncio sinistro, teve medo.
Dino, automaticamente, aleijava as moscas. Byron Jones III distraidamen-te moveu um bispo. Miller pegou-o e deixou sua rainha desprotegida. Max fitava os pés. Tex se cocava.
— Bem, não me sinto nada diferente — falou Dino, e se pôs de pé. — Tenho que ir dar uma mijada. — E saiu.
— Não sei se rio ou choro — falou Max. — Está-me dando é vontade de vomitar.
— Não faz sentido — disse Tex, em voz alta, mas falava consigo mesmo, e nem percebera que tinha falado. — Simplesmente não faz sentido.
— Ei, Max — falou o Rei. — Quer fazer um pouco de café? Automaticamente, Max saiu e foi colocar água na panela. Quando voltou, ligou o fogareiro elétrico e botou a panela em cima dele. Começou a retornar ao seu beliche, mas se deteve de chofre, virou-se e ficou olhando fixo para o Rei.
— O que foi, Max? — perguntou o Rei, pouco à vontade.
Max apenas o fitava, com os lábios se movendo espasmodicamente, sem emitir som algum.
— O que é, nunca me viu?
Subitamente, Max agarrou a panela e arremessou-a pela janela.
— Enlouqueceu, cara? — explodiu o Rei. — Molhou-me todo!
— Não diga! — berrou Max, os olhos saltados.
— Deveria enchê-lo de porrada! Está maluco?
— A guerra acabou. Faça você mesmo a bosta do seu café — gritou Max, espumando de leve no canto da boca.
O Rei se pusera de pé, o rosto vermelho de raiva, quase agredindo Max.
— Saia já daqui antes que eu lhe dê um pontapé na cara!
— Vamos, faça isso, ande, mas não se esqueça que sou Primeiro-Sargento, e o levo à corte marcial!
Max começou a rir histericamente, depois, abruptamente, o riso se transformou em lágrimas, lágrimas desesperadas, e Max fugiu da choça, deixando atrás de si um silêncio horrorizado.
— Que filho da puta maluco — resmungou o Rei. — Quer ferver um pouco d’água, sim, Tex — disse, sentando-se no seu canto.
Tex estava à porta, olhando para a figura de Max que fugia. Voltou o olhar para ele, devagar.
— Estou ocupado — disse, depois de uma agonia de indecisão.
O estômago do Rei deu uma reviravolta. Ele controlou a náusea que sentia e os músculos da face.
— É — falou o Rei, com um sorriso sombrio. — Estou vendo. — Podia sentir a profundidade do silêncio. Apanhou a carteira e escolheu uma nota. — Tome uma nota tie dez dólares. Desocupe-se e vá buscar água, sim? — Disfarçou a dor nas entranhas e ficou olhando para Tex.
Mas este não disse nada, apenas estremeceu nervosamente e olhou para o outro lado.
— Vocês ainda têm que comer... até que acabe de verdade — disse o Rei desdenhosamente, correndo os olhos pela choça. — Quem quer um pouco de café?
— Eu quero café — falou Dino, sem ar de quem pedisse desculpas. Foi buscar a panela, encheu-a e botou a água para ferver.
O Rei largou a nota de 10 dólares na mesa. Dino a fitou.
— Não, obrigado — falou, com voz rouca, sacudindo a cabeça — quero só o café. — Atravessou com passos incertos toda a extensão da choça.
Constrangidos, os homens deram as costas ao desprezo latente do Rei.
— Espero, para o seu bem, seus filhos da puta, que a guerra tenha mesmo acabado — disse o Rei.
Peter Marlowe saiu do alojamento do Comandante do Campo e caminhou, apressado, para a choça americana. Respondeu automaticamente aos cumprimentos dos homens que conhecia, e pôde sentir os olhares constantes e incrédulos que o seguiam. É, pensou, eu também mal acredito. Voltar para casa logo, voar de novo, ver o meu velho de novo logo, beber com ele, rir com ele. E toda a família. Deus, como vai ser esquisito. Estou vivo. Estou vivo. Consegui!
— Alô, gente boa! — Abriu um largo sorriso, ao entrar na choça.
— Oi, Peter — disse Tex, pondo-se de pé num salto e apertando a mão dele calorosamente. — Puxa, amigão, mas como ficamos contentes em saber da guarda!
— Mas que obra-prima de eufemismo — falou Peter Marlowe, e riu. Enquanto o cercavam, ele curtia o calor da recepção.
— O que houve com as Autoridades? — perguntou Dino.
Peter Marlowe contou-lhes, e ficaram ainda mais apreensivos. Todos, menos Tex.
— Porra, não há motivo para se preparar para o pior. Acabou! — disse, confiante.
— Acabou, sem dúvida — disse Max, rispidamente, entrando na choça.
— Alô, Max, eu... — Peter Marlowe não continuou. Estava chocado com o olhar assustador de Max. — Está bem? — perguntou, depois, perturbado.
— Claro que estou bem! — explodiu Max. Abriu caminho aos empurrões e largou-se no beliche. — Porra, o que estão olhando? Será que um cara não pode estourar-se de vez em quando, sem que um bando de filhos da mãe fique olhando para ele?
— Calma — falou Tex.
— Graças aos céus vou-me mandar dessa joça logo. — O rosto de Max estava castanho-acinzentado, e a boca não parava de se mexer. — E vou para longe de vocês, seus sacanas nojentos!
— Cale a boca, Max!
— Vá â merda! — Max enxugou a saliva que lhe escorria pelo queixo; enfiou a mão no bolso, tirou de lá um maço de notas de 10 dólares, depois rasgou-as selvagemente, espalhando-as como se fossem confete.