Levanto-me e saio da sala a passos largos e rápidos.
— Que porra de brincadeira é essa? — grita ele, colérico.
— Não grite comigo.
— Como assim não gritar com você? — berra ele, ainda mais alto do que antes. — Eu dei instruções específicas, que você desacatou completamente; de novo. Que merda, Ana, estou furioso.
— Quando você estiver mais calmo, a gente conversa.
— Não ouse desligar na minha cara — fala ele, entre os dentes.
— Tchau, Christian.
Encerro a chamada e desligo o telefone de Prescott.
Puta merda. Não tenho muito tempo com Leila. Tomando fôlego, entro de novo na sala de reuniões. Sou recebida por olhares de expectativa, tanto de Leila quanto de Prescott, a quem devolvo o telefone.
— Onde estávamos? — pergunto a Leila ao me sentar em frente a ela na mesa. Seus olhos se arregalam de leve.
Sim. Aparentemente, eu controlo ele, quero dizer a ela. Mas não acho que Leila queira ouvir isso.
Ela mexe nervosamente nas pontas do cabelo.
— Primeiro, eu queria me desculpar — começa ela, com suavidade.
Puxa…
Ela ergue o olhar para mim e registra minha surpresa.
— É verdade — apressa-se a dizer. — E obrigada por não dar queixa. Você sabe… pelo que eu fiz com seu carro e pelo que aconteceu no seu apartamento.
— Eu sei que você não estava… hmm, bem — murmuro, vacilante. Eu não esperava um pedido de desculpas.
— Não, eu não estava bem.
— Está melhor agora? — pergunto gentilmente.
— Muito melhor. Obrigada.
— Seu médico sabe que você está aqui?
Ela balança a cabeça em negativa.
Ah.
Ela parece culpada, e com razão.
— Sei que vou ter que arcar com as consequências disso depois. Mas eu tinha que pegar algumas coisas, e queria ver a Susi, e você, e… o Sr. Grey.
— Você quer ver o Christian?
Meu estômago cai em queda livre até o chão. É por isso que ela está aqui.
— Quero. Eu queria perguntar a você se teria algum problema.
Puta merda. Olho pasma para ela, e quero responder que sim, teria problema. Não quero ver esta mulher chegar nem perto do meu marido. Por que ela está aqui? Para avaliar a concorrência? Para me desestabilizar? Ou será que precisa disso para alguma espécie de conclusão em sua vida?
— Leila — balbucio, irritada. — Isso não depende de mim, depende do Christian. Você vai ter que perguntar a ele. Ele não precisa da minha permissão. É um homem adulto… na maior parte do tempo.
Ela me encara por uma fração de segundo, como se estivesse surpresa com a minha reação, e depois ri suavemente, sem largar o tique nervoso de enrolar as pontas do cabelo.
— Ele vem recusando repetidamente todos os meus pedidos para vê-lo — diz ela, baixinho.
Ah, merda. Fiz uma besteira maior do que eu pensava.
— Por que é tão importante para você se encontrar com ele? — pergunto com gentileza.
— Para agradecer. Eu estaria apodrecendo num manicômio judiciário fedorento se não fosse por ele. Sei disso. — Ela olha para baixo e passa o dedo pela borda da mesa. — Sofri uma crise psicótica grave e, sem o Sr. Grey e o John… o Dr. Flynn… — Ela dá de ombros e me olha mais uma vez, o rosto cheio de gratidão.
Novamente, fico sem palavras. O que ela espera que eu diga? Ela deveria dizer essas coisas para Christian, não para mim, com certeza.
— E pelas aulas de artes. Não tenho como agradecer o suficiente por isso a ele.
Eu sabia! Christian está financiando as aulas dela. Permaneço sem expressão, tentando avaliar meus sentimentos a respeito desta mulher agora que ela confirmou minha desconfiança em relação à generosidade de Christian. Para minha surpresa, não sinto raiva dela. É uma revelação, e fico contente por ver que está melhor. Agora, espero que ela possa seguir em frente com sua vida e sair da nossa.
— Você está faltando às aulas para estar aqui? — pergunto, porque estou interessada.
— Só duas. Volto para casa amanhã.
Ah, que bom.
— Quais são os seus planos enquanto estiver aqui?
— Pegar meus pertences com a Susi e voltar a Hamden. Continuar pintando e aprendendo. O Sr. Grey já tem uns dois quadros meus.
Que porra é essa? Meu estômago mergulha em queda livre mais uma vez. Estão pendurados na minha sala? Eu me arrepio só de pensar.
— Que tipo de quadros você pinta?
— Na maioria abstratos.
— Entendo.
Minha mente rememora os quadros, agora familiares, em nossa sala de estar. Dois deles são obras da ex-submissa de Christian… talvez.
— Sra. Grey, posso ser franca? — pergunta ela, completamente alheia às minhas emoções beligerantes.
— Por favor — murmuro, olhando para Prescott, que parece ter relaxado um pouco.
Leila se inclina para a frente como se fosse revelar um segredo antigo.
— Eu amei o Geoff, o meu namorado que morreu este ano. — Sua voz se transforma num mísero sussurro triste.
Merda, essa conversa está ficando muito pessoal.
— Sinto muito — digo automaticamente, mas ela continua como se não tivesse me ouvido:
— Eu amei o meu marido… e mais um outro homem — balbucia ela.
— Meu marido. — As palavras saem da minha boca antes que eu possa impedi-las.
— Isso. — Ela mal emite o som da palavra.
Isso não é novidade para mim. Quando ela ergue os olhos castanhos e fita os meus, vejo que estão bem abertos, deixando transparecer emoções conflitantes, das quais a que parece sobressair é o receio… da minha reação, talvez? Mas o meu principal sentimento com relação a essa pobre jovem é o de compaixão. Mentalmente, percorro toda a literatura clássica que conheço que aborde o tema do amor não correspondido. Engolindo em seco com força, mantenho o níveclass="underline"
— Eu sei. É muito fácil amá-lo — sussurro.
Seus olhos já grandes se abrem ainda mais, expressando surpresa, e ela sorri.
— É verdade. Ele é… era.
Ela se corrige rapidamente e fica vermelha. Então, ri de maneira tão doce que não consigo evitar: rio também. Sim, Christian Grey nos faz rir. Meu inconsciente revira os olhos para mim, incrédulo, e volta a ler seu exemplar bastante manuseado de Jane Eyre. Olho para o relógio. Bem no fundo, sei que Christian logo estará aqui.
— Você vai ter a oportunidade de ver o Christian.
— Imaginei. Sei como ele pode ser protetor. — Ela sorri.
Então esse era o plano. Ela é muito sagaz. Ou manipuladora, sussurra meu inconsciente.
— Então foi por isso que você veio me ver?
— Foi.
— Entendo.
E Christian está fazendo exatamente o jogo dela. Tenho que admitir, embora com relutância, que ela o conhece bem.
— Ele parecia muito feliz. Com você — diz ela.
O quê?
— Como é que você sabe?
— Das vezes em que eu estive no apartamento — acrescenta ela, cautelosamente.
Ah, droga… Como eu pude esquecer aquilo?
— Você ia muito lá?
— Não. Mas ele era bem diferente com você.
Será que eu quero ouvir isso? Um arrepio me percorre. Meu couro cabeludo começa a formigar quando me recordo do medo que senti quando ela era uma sombra invisível no nosso apartamento.
— Você sabe que isso é crime. Invadir uma residência.
Ela concorda, baixando o olhar para a mesa, e passa a ponta do dedo pela borda.
— Foram só algumas vezes, e eu tive sorte de não ter sido pega. Mais uma vez, eu gostaria de agradecer ao Sr. Grey por isso. Ele podia ter me colocado na cadeia.
— Acho que ele não faria isso — murmuro.
De repente há um alvoroço fora da sala, e instintivamente sei que Christian chegou. Um instante depois ele irrompe pela porta, e, antes de fechá-la, capto o olhar de Taylor, que espera pacientemente do lado de fora. A boca de Taylor está contraída, e ele não retribui meu sorriso contido. Ah, droga, até ele está bravo comigo.