Quando passamos pela recepção, Christian faz um discreto sinal para o amável senhor de meia-idade atrás do balcão. Ele aquiesce e pega o telefone. Fito Christian com ar inquisidor e ele me responde com um sorriso cheio de segredos. Franzo a testa, e, por um instante, ele aparenta nervosismo.
— Cadê o Taylor? — pergunto.
— Ele deve chegar daqui a pouco.
É óbvio, provavelmente está pegando o carro.
— E o Sawyer?
— Resolvendo uns assuntos.
Que assuntos?
Christian evita a porta giratória, e sei que é para não ter que soltar minha mão. Isso aquece meu coração. Lá fora está uma agradável manhã de final de verão, mas o aroma do outono vindouro paira na brisa do ar. Olho em volta, procurando o Audi SUV e Taylor. Nenhum sinal dos dois. Christian aperta minha mão ainda mais, e eu olho para ele. Parece ansioso.
— O que foi?
Ele dá de ombros. O barulho do motor de um automóvel que se aproxima me distrai. É um ronco… e familiar. Quando me volto para procurar de onde vem o barulho, ele cessa repentinamente. Taylor está saindo de um carro esportivo branco e lustroso estacionado na nossa frente.
Ah, merda! É um R8. Viro bruscamente a cabeça para Christian, que me examina com um olhar cauteloso. “Você pode me dar um de aniversário… branco, acho.”
— Feliz aniversário — diz ele, e sei que está avaliando minha reação. Fico boquiaberta, pois é o máximo que consigo fazer. Ele estende uma chave para mim.
— Agora você passou totalmente dos limites — murmuro.
Ele me deu um Audi R8! Puta merda. Exatamente como eu pedi! Meu rosto se abre num sorriso enorme, e dou pulinhos sem sair do lugar, sem conseguir esconder ou refrear minha superempolgação. A expressão de Christian reflete a minha, e eu avanço dançando até cair em seus braços. Ele me gira no ar.
— Você tem mais dinheiro do que bom senso! — grito de alegria. — Adorei! Obrigada mesmo!
Ele para e subitamente me inclina para baixo, o que me assusta e me obriga a agarrar seus braços.
— Tudo para você, Sra. Grey. — Ele abre um grande sorriso. Minha nossa. Que grande demonstração pública de amor. E me beija. — Venha. Vamos ver seu pai.
— Claro. Posso dirigir?
Ele ri.
— Pode. É seu.
Ele me levanta e me solta. Corro para o lado do motorista.
Taylor abre a porta para mim, com um grande sorriso.
— Feliz aniversário, Sra. Grey.
— Obrigada, Taylor.
Eu o surpreendo ao lhe dar um rápido abraço, que ele retribui meio sem graça. Ainda há rubor em seu rosto quando entro no carro e ele fecha a porta assim que me instalo no banco.
— Dirija com cuidado, Sra. Grey — diz, todo bronco. Olho radiante para ele, mal conseguindo conter minha empolgação.
— Pode deixar — prometo, enfiando a chave na ignição depois que Christian se acomoda ao meu lado.
— Vá com calma. Não tem ninguém nos perseguindo agora — avisa ele.
Quando viro a chave, o motor ganha vida com um ronco. Verifico o espelho retrovisor e os laterais e, percebendo um raro momento de tráfego livre, executo uma perfeita curva em U e saio rugindo em direção ao hospital universitário.
— Uau! — exclama Christian, tenso.
— O que foi?
— Não quero ver você internada na UTI junto com o seu pai. Vá devagar — ordena ele, sem chance de discussão.
Piso mais leve no acelerador e sorrio para ele.
— Melhor assim?
— Bem melhor — balbucia, tentando parecer austero… mas falhando totalmente.
* * *
A CONDIÇÃO DE RAY permanece inalterada. Vê-lo faz meus pés fincarem novamente no chão, após a emocionante viagem de carro até aqui. Eu realmente deveria dirigir com mais cuidado. Não dá para controlar todo motorista embriagado que existe no mundo. Preciso perguntar a Christian o que aconteceu com o babaca que provocou o acidente com Ray — tenho certeza de que ele sabe. Apesar dos tubos, meu pai parece confortável, e acho que vejo um pouco mais de cor nas suas faces. Enquanto converso com ele, contando como foi minha manhã, Christian vai até a sala de espera para dar uns telefonemas.
A enfermeira Kellie se aproxima, verificando o estado de Ray e fazendo anotações no prontuário dele.
— Todos os sinais estão bons, Sra. Grey. — Ela sorri amavelmente.
— Isso é bem animador.
Um pouco mais tarde, o Dr. Crowe aparece com dois assistentes de enfermagem e diz cordialmente:
— Sra. Grey, está na hora de levar o seu pai para a radiologia. Vamos fazer uma tomografia computadorizada. Para ver como anda o cérebro dele.
— Vai demorar?
— No máximo uma hora.
— Vou esperar. Quero saber o resultado.
— É claro, Sra. Grey.
Vou caminhando lentamente até a sala de espera — felizmente vazia a essa hora —, onde Christian está falando ao telefone, andando de um lado para o outro. Enquanto fala, contempla pela janela a vista panorâmica de Portland. Ele se volta para mim quando fecho a porta, e parece zangado.
— Excedeu em quanto a velocidade?… Entendo… Todas as acusações, tudo. O pai da Ana está na UTI. Quero que você use tudo que puder contra esse filho da puta… Ótimo, pai. Mantenha-me informado. — Ele desliga.
— O outro motorista?
Ele faz que sim com a cabeça.
— Um babaca de um bêbado de merda que mora num trailer na parte sul de Portland — zomba ele, e fico chocada com a terminologia e com o tom depreciativo. Seu tom de voz suaviza quando ele continua, vindo na minha direção: — Já viu o Ray? Quer ir embora?
— Hmm… não.
Olho para ele, ainda incomodada com o desprezo que ele manifestou.
— O que aconteceu?
— Nada de mais. Ele está sendo levado para a radiologia. Vão fazer uma tomografia computadorizada para ver como está o edema no cérebro. Eu queria esperar o resultado.
— Tudo bem. Vamos esperar. — Ele se senta e estica os braços para mim. Como estamos sozinhos, aceito o convite e me aconchego feliz em seu colo. — Não foi assim que eu imaginei passar o dia de hoje — murmura Christian, com a boca no meu cabelo.
— Eu também não, mas estou mais otimista agora. Sua mãe me tranquilizou bastante. Foi muito gentil da parte dela ter aparecido ontem à noite.
Christian acaricia minhas costas e repousa o queixo na minha cabeça.
— Minha mãe é uma mulher extraordinária.
— É verdade. Você tem muita sorte de tê-la por perto.
Ele concorda.
— Eu deveria ligar para a minha mãe. Avisar sobre o Ray — murmuro, e Christian se enrijece. — Estou surpresa de ela não ter me ligado.
Franzo a testa ao pensar nisso. Na realidade, estou magoada. Afinal de contas, é meu aniversário, e ela estava lá no momento em que nasci. Por que ela não telefonou?
— Talvez ela tenha ligado — diz Christian.
Pego meu BlackBerry do bolso. Não há chamadas perdidas, mas algumas poucas mensagens de texto: feliz aniversário de Kate, José, Mia e Ethan. Nada da minha mãe. Balanço a cabeça, desanimada.
— Ligue logo para ela — diz ele ternamente.
Eu ligo, mas ninguém atende, só a secretária eletrônica. Não deixo recado. Como minha própria mãe pode esquecer o meu aniversário?
— Ela não está. Tento de novo mais tarde, depois que eu souber o resultado da tomografia.
Christian me aperta mais em seus braços, cheirando meu cabelo de novo, e sabiamente não tece nenhum comentário acerca da falta de interesse por parte da minha mãe. Eu sinto mais do que ouço o zumbido do BlackBerry dele. Ele não me deixa levantar, e fisga o aparelho do bolso com certo esforço.
— Andrea — atende, seco, reassumindo o tom profissional.
Faço outra tentativa de me levantar, mas ele me detém, franzindo o cenho e apertando minha cintura. Eu volto a me aninhar em seu peito e ouço a conversa parcial.
— Ótimo… Qual é o horário previsto para a chegada?… E os outros, hã… pacotes? — Ele consulta o relógio. — O Heathman tem todos os detalhes?… Ótimo… Sim. Pode esperar até segunda de manhã, mas me mande um e-mail, em todo caso: eu imprimo, assino e escaneio para enviar de volta para você… Eles podem esperar. Vá para casa, Andrea… Não, estamos bem, obrigado. — E desliga.