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— Ou até à nossa — acrescentou Gileano em tom soturno. Exibindo o livro, no qual continuava a escrever, acrescentou: — Querido irmão, querida irmã, é bem possível que eu esteja escrevendo o capítulo final.

— Então — respondeu Takhisis —, é melhor que o façamos bem. Meus irmãos, despeço-me. Tenho uma batalha para ganhar.

Dito isto, desapareceu. Paladino partiu logo a seguir. Só ficou Gileano. Sentando-se, continuou a escrever no grande livro.

8

Desapontamento.

A vitória é nossa.

A rendição.

Steel Montante Luzente encontrava-se vivo.

Não queria estar. Não devia estar. Devia ter morrido durante a investida contra a Torre do Sumo Sacerdócio, em combate, com nobreza e bravura, ver a vida sacrificada pela sua Rainha e a honra resgatada.

E a sua morte fora inevitável — provava-o a armadura trespassada pela lança que um nobre inimigo lhe arremessara. Ao salvar Steel dela, Tanis Meio Elfo iludira o destino, morrera a morte de Steel.

Steel encontrava-se no pátio central da Torre do Sacerdócio Supremo, segurando na mão a espada, viscosa de sangue, algum dele, grande parte de outros. Não conseguia compreender o que se passava, dentro dele ainda fervilhava a luxúria do combate. A recordação mais vívida, era a do pai, afastando-se com o corpo de Tanis. E, não fosse o sangue deste tingir as pedras aos seus pés, se interrogaria se não teria imaginado tudo aquilo.

Depois disso, apenas lhe ocorria o estranho silêncio da batalha — o silêncio que paira sobre o entrechocar das armas, os estertores dos moribundos, os gritos de ordens, o ruído de passos. Contudo, todos esses sons foram absorvidos pelo silêncio, o silêncio do guerreiro que tem de concentrar a sua existência no objetivo, que não pode permitir que nada o distraia, nada interfira.

Para Steel, o silêncio quebrou-se quando, olhando ao redor à procura de um adversário com quem lutar, percebeu que não havia ninguém.

— Vitória! A vitória é nossa! — O subcomandante Trevalin, com a armadura amassada e ensangüentada, o — rosto coberto de sangue e fuligem, irrompeu pelo pátio central, gritando as notícias.

Detendo um escudeiro e empurrando-o para a entrada, Trevalin ordenou:

— Vá transmitir as novas ao meu Senhor de Ariakan! Diga-lhe — se é que já não lhe chegou aos ouvidos — que os Solâmnicos pretendem discutir as condições de rendição.

Olhando em redor, avistou Steel, que se encontrava no meio do pátio, com ar aturdido e desconcertado. Precipitou-se para ele e cingiu o amigo nos braços.

— Montante Luzente! Embainhe a espada! Ganhamos!

— Ganhamos... — repetiu Steel. A batalha terminara e ele encontrava-se vivo.

Exultante, Trevalin prosseguiu:

— Uma campanha gloriosa! Que perdurará para sempre! Pela primeira vez nos anais da História, a Torre do Sumo Sacerdócio cai! Uma vitória retumbante! Em breve, Palanthas será nossa. Mal ouvirem que os seus protetores foram derrotados e que os dragões bons fugiram, os cidadãos nos cairão nas mãos como frutos apodrecidos. E você, meu amigo! Já correm por aí histórias do teu valor! Afirmam que matou Tanis Meio Elfo.

— Não — murmurou Steel. O fogo da batalha que lhe revolvera as veias começava a extinguir-se lentamente, nada deixando atrás de si senão cinzas e fumaça. Estava vivo. — Não, não matei o meio elfo. Ele salvou...

Mas Trevalin não lhe prestou atenção. Pelo pátio irrompeu um mensageiro do Senhor de Ariakan a cavalo. A montaria, que fora treinada para as velocidades e não para as batalhas, à vista dos corpos e sentindo o fedor do sangue, amedrontou-se. Procurando aquietar o cavalo, solicitou permissão para se dirigir à autoridade em comando.

— Sua Eminência avistou uma bandeira branca desfraldada no alto da torre. Chegaram mensageiros informando que os defensores da torre pretendem discutir as condições de rendição. O meu amo também ouviu dizer que os dragões prateados e os dragões dourados abandonaram o campo e a batalha. Subcomandante, há alguma verdade nisto?

— É tudo verdade. Eu mesmo vi os ditos dragões “bons” partirem — respondeu Trevalin, rindo. — Quem sabe se Paladino lhes enviou uma mensagem, ordenando-lhes que batessem em retirada.

O mensageiro não pareceu achar graça. O cavalo escavava o chão e relinchava, andando de um lado para o outro com nervosismo, com os cascos escorregando nas pedras cobertas de sangue. Enquanto falava com Trevalin, o mensageiro deslocava-se para lá e para cá, guiando o desassossegado animal.

— Sua Eminência suspeita se tratar de um ardil.

Mais comedido, Trevalin aquiesceu.

— Não me surpreenderia se os dragões se retirassem apenas para se agruparem em algum lugar e reforçarem os efetivos. Mais uma razão para aceitar a rendição dos cavaleiros e assumir depressa o comando desta fortaleza.

— Os respectivos oficiais são aqueles? — inquiriu o mensageiro em voz baixa, inclinando-se para o pescoço do cavalo. — Aqueles homens que avançam para nós?

Três Cavaleiros da Solamnia entraram no pátio. Um, o comandante, um Lorde Cavaleiro da Rosa, caminhava à frente e os outros dois ladeavam-no, com ar solene. Tinham retirado os elmos — ou estes haviam-se perdido na batalha. Exibiam marcas da contenda, as armaduras encontravam-se amassadas, cobertas de poeira e de sangue. O comandante vinha coxeando e o seu rosto contorcia-se de dor sempre que dava um passo lento e se detinha. Outro, com um dos braços hirto, tinha a cara coberta de sangue, que lhe escorria de um golpe fundo da cabeça. Um dos olhos do terceiro encontrava-se envolto numa ligadura tosca, empapada de sangue, que lhe escorria pela bochecha.

Traziam consigo um pedaço de pano branco.

— São eles os oficiais — confirmou Trevalin.

O mensageiro cavalgou ao seu encontro. Detendo a montaria, esboçou uma saudação.

O comandante solâmnico derrotado, ergueu o olhar esgazeado. Era um homem de meia-idade, mas parecia muito, muito mais idoso.

— Vem da parte de Lorde Ariakan? — inquiriu. — Pode transmitir-lhe uma mensagem?

— Assim farei, Senhor Cavaleiro — respondeu o mensageiro em tom polido. — Que notícias pretende que comunique a Sua Senhoria?

O cavaleiro solâmnico esfregou o rosto com as mãos, possivelmente para limpar o sangue, ou lágrimas, quem sabe, e com um suspiro, disse:

— Diga a Sua Senhoria que lhe solicitamos permissão para retirar os nossos mortos do campo.

— Meu senhor, significa então que esta torre se rende?

O cavaleiro aquiesceu lentamente com a cabeça.

— Sob condição de não haver mais derramamento de sangue — disse. — Perderam-se muitas vidas hoje.

— É possível que Sua Senhoria exija rendição incondicional — replicou o mensageiro.

A expressão do cavaleiro endureceu.

— Se assim for — disse —, continuaremos a lutar até não restar um único sobrevivente. Seria um desperdício lamentável.

Nesta altura, um dos cavaleiros que acompanhavam o comandante falou-lhe em tom premente, como que a insistir num argumento.

Com um movimento de mão, o comandante silenciou-o.

— Já discutimos isso — respondeu. — Não mandarei mais garotos para a morte quando isso representará um esforço inútil. Conheço Ariakan. Agirá com honra. Se não o fizer... — Agitou a cabeça e fitou o mensageiro com uma expressão severa. — São estas as nossas condições. Diga ao seu senhor que é pegar ou largar.

— Assim o farei, Senhor Cavaleiro.

O mensageiro afastou-se a galope. Assumindo uma postura contida, os três cavaleiros derrotados mergulharam em reflexão. Nada diziam uns aos outros e mantinham os olhos colados em frente, recusando-se a dar pela presença do inimigo.

— Ele aceitará — previu Trevalin. — A batalha está resolvida. O que viesse por acréscimo seria matança inútil. Conforme eu disse, acho que quererá assumir o controle imediato da torre, antes que os dragões dourados regressem. E eu tenho que me apresentar ao meu comandante. Montante Luzente, por certo te agradará saber que a Fulgor sobreviveu ilesa à batalha. Lutou bem, embora me parecesse bem desanimada. Acho que sentiu a falta do verdadeiro dono. Eu... Montante Luzente, que se passa?