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— Que quer dizer com advertências quanto ao tempo? Advertências contra o quê?

— Um perigo iminente. A destruição final. A morte certa — disse Raistlin com frieza.

A Dama da Noite olhou-o sobressaltada, e depois riu.

— Atreve-se a nos ameaçar? Os governantes de toda a Ansalon? Que engraçado! Conte isso a Dalamar, quando encontrá-lo.

— Não se trata de ameaça — respondeu Raistlin. — É uma certeza. E não foi Dalamar quem me enviou. Caramon, para que está aí feito bobo? Veio aqui por causa da água. Vá buscá-la.

— Caramon! — repetiu a Dama da Noite, virando-se para olhá-lo. — Caramon Majere?

— Sou eu — confirmou Caramon com ar sombrio, depois de olhar, hesitante, para o irmão.

Via-se que sentia relutância em se afastar, mas obedeceu, embora tomando a precaução de não virar as costas aos Cavaleiros Cinzentos. Caminhando de lado, desceu a colina e dirigiu-se para o ancoradouro, que pouco mais era do que um fio de água salobra. Tirando o odre, inclinou-se para enchê-lo.

Sem o arrimo do irmão, Raistlin aproximou-se do salgueiro gigante e encostou as costas na árvore.

— Caramon Majere, conhecido como o Herói da Lança — disse a Dama da Noite, voltando a fixar Raistlin. — Viajando na companhia de um feiticeiro de veste negra. Que estranho.

Retirando as mãos das mangas, Raistlin puxou o capuz para trás.

— Não é assim tão estranho... atendendo que são irmãos que viajam juntos.

Olhando para o irmão gêmeo, Caramon deixou tombar o odre.

O rosto de Raistlin já não exibia a compleição dourada. Era branco-marfim, como a pele das mãos. Os lábios estavam violáceos. Os olhos em forma de ampulheta lembravam dois poços fundos, escuros, esverdeados.

Arquejante, a Dama da Noite recuou um passo.

— Por Chemosh! Raistlin Majere! — gritou. — Você morreu!

— Assim foi — respondeu Raistlin com brandura. — E contudo, eis-me perante ti. Vamos, toque-me! — acrescentou, estendendo a mão esguia e pálida para a Veste Cinzenta.

— Afaste-se! — ordenou ela, brandindo um pingente de prata em forma de caveira, preso à corrente de prata que usava ao pescoço. Os outros Cavaleiros Cinzentos atarantavam-se às voltas de ingredientes e pergaminhos de encantamento.

— Deixe sua magia prá lá! — ordenou Raistlin em tom sinistro. — Não quero lhe fazer mal. Já te disse que vim comunicar uma advertência. A nossa Rainha em pessoa enviou-me.

— Takhisis enviou-o? — perguntou a Dama da Noite, com ar de dúvida.

— Quem mais haveria de ser? — retrucou Raistlin. — Quem mais tem o poder de revestir o meu espírito inquieto de carne e osso? Se for sensata, abandonará este lugar imediatamente e comunicará o meu aviso ao teu amo... a Ariakan.

— E o que vamos dizer a Lorde Ariakan? — Depois do choque inicial, a Dama da Noite, que recuperava a compostura, olhou intensamente para Raistlin.

Caramon pegara o odre e, com uma mão o enchia, mantendo a outra junto ao punho da espada.

— Diga a Ariakan o seguinte — respondeu Raistlin. — A vitória dele é em vão. Agora, que vive o seu momento de triunfo, corre mais perigo do que nunca. Avise-o para não afrouxar a vigilância, para redobrá-la dez vezes. Para manter os olhos na direção norte, que dali virá a catástrofe.

— De onde? Dos Cavaleiros da Solamnia? — escarneceu Lillith. — Os que sobreviveram, renderam-se a nós e encontram-se agora encerrados nos seus próprios calabouços! Acho que não...

— Atreve-se a zombar das palavras da tua Rainha? — ciciou Raistlin. Estendeu ambas as mãos, que mantinha fechadas e que de repente abriu. — Cuidado com o seu poder!

Um clarão ofuscante de luz, acompanhado por uma explosão, foi desabar no meio dos Cavaleiros Cinzentos, que levantaram os braços para proteger os olhos. O seu chefe, a Dama da Noite, perdeu o equilíbrio e foi rolando até o meio da colina. Uma nuvem de fumaça negra esverdeada e com um cheiro horrível, elevou-se no ar quente e parado. Quando se dissipou, Raistlin desaparecera. Tudo o que restava era uma mancha calcinada na erva.

Caramon voltou a largar o odre.

Lillith levantou-se. Parecia abalada, embora tentasse ocultar o nervosismo. Os outros reuniram-se à sua volta, evitando aproximar-se da área calcinada.

— Dama da Noite, o que faremos? — perguntou um dos feiticeiros.

— Era uma mensagem da nossa Rainha! Devemos comunicá-la imediatamente a Lorde Ariakan! — disse outro.

— Estou ciente disso — retorquiu a Dama da Noite. — Deixem-me pensar. — Olhou, desconfiada, para a mancha chamuscada e depois para Caramon, que se mantinha no ancoradouro, andando de um lado para o outro e olhando ao redor, com ar perplexo. Pairava no ar o cheiro de enxofre.

A Dama da Noite franziu o cenho.

— Onde está o seu irmão? — inquiriu. Caramon coçou a barba.

— Senhora, diabos me levem se eu souber — respondeu.

Lillith perscrutou-o demoradamente e semicerrou os olhos.

— Tenho a sensação de que se trata de algum truque. Mas... — levantou a mão, para calar o clamor indignado dos subordinados — truque ou não, Lorde Ariakan precisa ser avisado de que Raistlin Majere caminha agora neste plano mortal. Talvez a nossa Rainha o enviasse. Talvez se encontre aqui por motivos pessoais, como aconteceu antes. Seja como for, pode tornar-se um incômodo.

A Dama da Noite relanceou o olhar pelo campo estéril, na direção do que pressupostamente seria a Torre de Wayreth.

— E se Raistlin Majere se libertou do Abismo, podem estar certos de que Palin Majere, o sobrinho, regressou com ele. Já perdemos tempo demais aqui. Vamos embora! — disse. Com gestos graciosos, brandiu três vezes o braço em volta da cabeça e desapareceu.

Os outros Cavaleiros do Abrolho apressaram-se a segui-la. Lançando um derradeiro e sinistro olhar à mancha calcinada, murmuraram os seus encantamentos e, um a um, evolaram-se no ar.

Caramon chapinhou para fora do ancoradouro. Estendendo as mãos, pôs-se a tatear o ar.

— Raist? — sussurrou, confundido e apavorado. — Raist? Onde está? Você... você não ia me deixar aqui... não é? Raist?

— Meu irmão, estou aqui — ouviu-se uma voz, que procurava disfarçar uma gargalhada. — Mas tem que me ajudar.

Caramon levantou a cabeça, abalado até o âmago. Quem falara fora o salgueiro.

— Hum, Raist... — disse, engasgando-se e engolindo em seco

Dentro da árvore, seu palerma! Dê a volta nesta direção!

— Dentro... — Caramon contornou apressadamente o lado da árvore que ficava próximo da mancha calcinada no chão. Hesitante, receoso, separou os ramos compridos e ondulantes do salgueiro.

Do tronco maciço do salgueiro, emergiu uma mão — branca e engelhada — que lhe dirigia sinais imperiosos. Caramon deu um suspiro de alívio.

— Raist! Está vivo! Mas... — parecia desorientado — ...como conseguiu se meter dentro da árvore?

Raistlin resfolegou, mas quando falou parecia bem contente com a sua pessoa.

— Em nome de Hiddukel, o Embusteiro, não me diga que se deixou enganar por essa velha artimanha! Anda, me ajude. Não posso me mexer. Fiquei preso em alguma coisa.

Pegando na mão de Raistlin, Caramon sentiu um alívio imenso por descobrir que a carne se encontrava quente. Seguindo o braço, deparou com o irmão dentro do tronco do salgueiro, a olhar para ele.

Compreendendo por fim, Caramon soltou um riso abafado, que deixava transparecer o abalo que sofrera.

— Raist, me pregou um susto! E tinha que ver aqueles Cavaleiros Cinzentos! As vestes deles deixaram de ser cinzentas! Vamos, não se mexa. Estou vendo o problema. O capuz se prendeu. Incline-se só um pouquinho para frente. Não consigo chegar com a mão ao... Só mais um pouco... Pronto. Pronto!