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O dragão e o seu dono tinham perfeita consciência da influência crescente dos cavaleiros. Depois da guerra, o Senhor de Ariakan fora seu prisioneiro durante vários anos e não passara esse tempo na ociosidade. Aprendera não só os seus métodos — que admirava e copiava, introduzindo alterações sempre que necessário — como também as suas táticas, estratégias e a localização dos seus baluartes. Descobrira os seus pontos fortes e — fato mais importante — também os fracos.

Quando, há cerca de cinco anos, Tanis ouvira falar dos Cavaleiros de Takhisis pela primeira vez, comparecera de imediato à presença dos Cavaleiros da Solamnia e avisara-os do perigo que corriam.

— O Senhor de Ariakan sabe tudo a seu respeito... desde a cor das roupas de baixo que vestem até às ordens de batalha que habitualmente dão — avisara Tanis. — Sabe quais as torres que se encontram fortificadas e quais estão vazias. Os seus cavaleiros são homens e mulheres aptos e inteligentes, recrutados por ele, treinados por ele e a quem Sua Majestade das Trevas concede a visão. Não trairão os seus senhores por causa da sede de lucros, como vimos acontecer na Guerra da Lança. Estes indivíduos prestam lealdade à Rainha das Trevas e a uns e outros. Sacrificam tudo em prol da causa deles. Meus senhores, urge que introduzam alterações já ou creio que o Senhor de Ariakan e os seus cavaleiros das trevas as efetuarão por nós.

Os senhores cavaleiros escutaram Tanis com ar polido, concordaram com ele na sua presença, mas na sua ausência, fizeram escárnio dele.

Todos sabiam que os que se aliavam à Rainha das Trevas eram egoístas, pretensiosos, cruéis e completamente destituídos de honra. A História provara-o e voltaria a provar. Os cavaleiros eram incapazes de conceber que tais mudanças drásticas nas fileiras das trevas pudessem ter ocorrido no curto espaço de 25 anos.

De modo que, entre as fileiras da luz, poucas alterações foram registradas.

Steel apontou para o mapa.

— Atravessamos aqui, os Estreitos de Schellsea e contornamos Caergoth, pois os cavaleiros implantaram uma fortaleza lá. Continuamos para leste, viajando sobre a água com Coastlund à nossa direita. Assim, evitamos a Torre de Thelgaard. A norte desta mesma, percorreremos o litoral, interpondo as montanhas de Vingaard entre nós e a Torre do Sumo Sacerdócio. Entramos em Palanthas pelo lado norte.

Ouvindo isto, Palin atreveu-se a sugerir:

— Só conseguirá penetrar na cidade se for disfarçado. Ocorreu-me isso — acrescentou com um certo orgulho — e trouxe algumas roupas do meu pai ...

Não vou andar pelos subúrbios de Palanthas vestido de estalajadeira — respondeu Steel com voz áspera. — Envergo esta armadura pela glória da minha Rainha. Não ocultarei quem eu sou.

— Então, será melhor nos dirigirmos já para a Torre do Sumo Sacerdócio e nos trancarmos numa cela — replicou Palin. — Pois é onde vamos acabar.

Você não vai, Veste Branca — observou Steel, com um pálido sorriso.

— Ah vou sim. Me prenderão logo que descobrirem que estou contigo. Os cavaleiros sentem pouca simpatia pelos fazedores de magia.

— Mas, você combateu nas suas fileiras.

— Foi por causa dos meus irmãos — respondeu Palin em voz baixa e sem fazer mais comentários.

— Não se preocupe Majere — retorquiu Steel, agora com o sorriso a bailar nos olhos escuros. — Entraremos em Palanthas com toda segurança.

— Supõe que conseguiremos mesmo nos infiltrar em Palanthas — argumentou Palin. — Ainda falta atravessar a Clareira de Shoikan.

— O bosque amaldiçoado? Já o vi... à distância. O teu pai não te contou? Eu cresci em Palanthas. Vivemos lá até eu completar 12 anos, na época em que o Senhor de Ariakan apareceu para nos alistar como cavaleiros. Como pode imaginar, a Clareira de Shoikan era uma tentação para qualquer criança traquinas da cidade. Já me esqueci do número de vezes em que atrevemos a nos aproximar dela. Claro que mal avistávamos os ramos superiores das árvores gigantescas, fugíamos correndo. Ainda hoje recordo os sentimentos, o medo...

Parou, franziu o cenho e afugentou as reminiscências, como o cão que sacode a água do pêlo. Depois, prosseguiu em tom mais ríspido:

— Dizem que aquela clareira é fatal para qualquer mortal que tente atravessá-la... Se é leal a alguém, não interessa. Mas, Mestre Magno, decerto que você consegue atravessá-la em segurança.

— Não me chame assim! — exclamou Palin, irritado. — Não é adequado. Na minha arte, pertenço a uma baixa hierarquia. Em termos militares, sou o equivalente a um soldado de infantaria.

Não conseguiu dominar a amargura que a sua voz deixou transparecer.

— Majere, todos nós começamos por baixo — disse Steel com modos graves. — Não deve se envergonhar. Perseverei dez anos para chegar ao meu posto e encontro-me longe do topo.

— Parece mesmo o meu irmão Tanin. Todo esse metal que vocês, cavaleiros, usam, deve subir à cabeça. Era o que eu costumava lhe dizer. E não. Não consigo atravessar a Clareira de Shoikan em segurança. Acho que podia solicitá-lo. Dalamar me tem em bom conceito...

À menção do nome, a expressão de Steel alterou-se. O rosto assumiu uma tonalidade carregada, o sorriso dos olhos desapareceu, consumido num clarão repentino e intenso.

Palin não percebeu a mudança. Estava absorto, sentia-se tentado a contatar Dalamar e solicitar uma forma de atravessar a clareira em segurança.

— Não — decidiu por fim. — Não posso pedir a Dalamar. Isso implicaria ter que explicar por que motivo pretendo entrar na torre. E se soubesse antecipadamente iria...

Palin viu de relance o rosto de Steel e olhou apressadamente ao redor, achando que estavam sendo atacados. Não vendo nada perguntou:

— O que se passa?

— O homem que mencionou, será Dalamar, o Sinistro?

— Sim — respondeu Palin —, o senhor da torre. O... — De repente ocorreu-lhe a história dele e lamentou-se de si para si.

— É o homem que matou a minha mãe — disse Steel, fazendo deslizar a mão para o punho da espada. — Estou ansioso para encontrar esse tal Dalamar.

Se o elfo das trevas matara a amante anterior, fizera-o em defesa própria. Kitiara atacara-o primeiro. Mas, para o filho, o argumento possivelmente carecia de sentido.

— Suponho que será inútil lembrá-lo que Dalamar é o feiticeiro mais poderoso de Ansalon — observou Palin com irritação. — Com um simples aceno de mão, te vira todo do avesso.

— Que interessa? — replicou Steel, furioso. — Acha que só ataco os que são mais fracos do que eu? Sou um homem de palavra e jurei vingar a morte de minha mãe.

Abençoado seja Paladino, por que não pensei nisso antes?, interrogou-se Palin, desesperado. Steel ainda vai acabar morto. Dalamar vai pensar que eu tentei contra sua vida. No meio da confusão é bem capaz de me destruir...

Confie em mim jovem — chegou-lhe a voz. — Deixe Dalamar comigo.

Palin estremeceu, sentindo-se empolgado, exultante. Sabia agora que a voz era real e não fruto da sua imaginação. Falava-lhe, guiava-o, orientava-o, aguardava-o!

Apaziguados os temores, descontraiu-se.

— Ainda não chagamos à torre. Ainda temos que atravessar Palanthas e a Clareira de Shoikan com segurança. Vamos tratar das coisas com Dalamar e com aquilo que encontrarmos na torre, quando — se conseguirmos chegar lá.

— Chegaremos lá — previu Steel em tom soturno. — Você me deu um novo incentivo.

Os dois montaram o dragão e, banhados pela luz ensangüentada de Lunitari, voaram para norte, rumo a Palanthas.

Viajaram a noite inteira sem depararem com vivalma. Mas, ao nascer do Sol, o dragão mostrou-se inquieto.