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Sorrindo, cruzou os braços no peito e dardejou Steel com uma expressão de perverso triunfo.

— Cavaleiro Guerreiro, qual é a tua resposta? — perguntou Ariakan a Steel. — Que tem a dizer em sua defesa?

— Nada, meu senhor — respondeu Steel.

Ouviu-se um murmúrio, vindo dos cavaleiros que se haviam juntado para assistir ao julgamento e cujo número, entretanto, se tornara significativo, pois a notícia espalhara-se rapidamente pelo campo.

— Nada, Cavaleiro Guerreiro? — repetiu Ariakan, parecendo atônito e perturbado. Lançou um olhar de esguelha à Dama da Noite e, muito de leve, abanou a cabeça. O gesto, mais do que as palavras, elucidou Steel quanto ao fato de Ariakan se encontrar do seu lado. — Vamos ouvir a sua versão.

Steel podia tê-lo feito, e conquistado a admiração dos presentes ao relatar que atravessara, incólume, a fatídica Clareira de Shoikan — um feito heróico que raras pessoas de Krynn se atreveriam a tentar e do qual muito menos sairiam vivas para contá-lo. Poderia também desculpar-se dizendo que Palin Majere sem sombra de dúvida fora ajudado na fuga pelo seu tio, Raistlin Majere, de infame memória. Conhecidos os fatos, Steel tinha certeza de que Ariakan julgaria a seu favor.

Mas, limitou-se a dizer:

— Não tenho desculpas a apresentar, meu senhor. Aceitei a missão e falhei. Dei a minha palavra de honra. Perdi o prisioneiro e responderei pela sua segurança. Meu senhor, aceito o teu julgamento.

— A minha sentença equivalerá à morte — respondeu Ariakan, carregando mais o cenho.

— Meu senhor, estou ciente disso — replicou Steel com voz calma.

— Pois então muito bem. Cavaleiro Guerreiro, não me deixa outra opção.

Ariakan pousou a mão no punho da espada. Uma expressão de dor contorceu-lhe o rosto — a espada constituía um artefato dedicado a Paladino e deste modo Paladino castigava os que seguiam os trilhos da escuridão. Ariakan não largou a espada. Em gestos lentos, rangendo os dentes, virou a ponta da espada na direção de Steel. Só depois a soltou.

— Steel Montante Luzente, por este meio é condenado a morrer por via desta espada que desgraçou e desonrou. A sentença de morte será executada...

Será executada já, pensou Steel, que antes assistira a julgamentos idênticos. Para ser mantida, a disciplina tem de ser rápida. Tentou preparar-se para o encontro com a sua Rainha. O que diria a ela, que conseguia ver-lhe os recessos do coração? Quem conheceria a verdade?

O seu corpo manteve-se firme, a alma estremeceu-lhe e, de início, não escutou as palavras de Ariakan. O murmúrio de aprovação por parte dos cavaleiros reunidos, ao qual se misturaram alguns vivas, fizeram Steel voltar ao mundo dos vivos.

Incrédulo, gaguejou:

— Que... que foi que disse, meu senhor?

— A sentença será cumprida dentro de um mês — repetiu Lorde Ariakan.

— Meu senhor! — apressou-se a Dama da Noite a protestar. — Será sensato? Este homem admitiu a sua traição! Sabe-se lá que outros danos poderá causar!

— Este cavaleiro admitiu que perdeu o prisioneiro — replicou Ariakan. — Submeteu-se, de bom grado, ao justo castigo. Dama da Noite, lhe recordo que o comandante dele, invocando a Visão, pediu que o seu subordinado fosse poupado e pudesse participar na batalha iminente. Eu consultei consultei a Visão. A minha sentença se mantém.

A voz de Ariakan era fria e suave, mas todos os presentes detectaram a sua cólera. A Dama da Noite inclinou a cabeça e retirou-se, mas não sem antes lançar a Steel Montante Luzente um olhar mortífero, de quem o executaria naquele exato momento.

Aturdido, sem acreditar ainda muito bem que viveria, Steel permaneceu imóvel. Ariakan viu-se forçado a acenar-lhe duas vezes com a mão antes que o cavaleiro se aproximasse para recuperar a espada.

Lorde Ariakan apontou para ela, mas sem tocá-la. Tinha a palma da mão direita coberta de bolhas e inflamada, como se tivesse tocado em metal ardente.

— Aí tem a sua espada de volta, Cavaleiro Guerreiro. Lhe é concedida a oportunidade de resgatar a honra nesta batalha, de modo a que a sua alma possa encarar com orgulho a nossa Rainha e não rastejar aos seus pés.

— Agradeço-lhe, meu senhor — respondeu Steel, com a voz embargada de emoção. Com ar reverente, ergueu a espada e voltou a embainhá-la.

— Contudo, vejo-me obrigado a pedir-lhe que retire as esporas — acrescentou Ariakan. — Fica privado de qualquer patente ou título. Vou pô-lo ao comando de uma companhia de soldados de infantaria. Terá a honra de liderar a investida contra o portão da frente.

Sorrindo, Steel levantou a cabeça. Liderar a investida, lutar a pé, o primeiro a franquear a torre, o primeiro a enfrentar o embate da defesa do inimigo, estaria entre os primeiros a morrer. Ariakan concedia-lhe um grande favor.

— Compreendo, meu senhor. Obrigado. Não o desiludirei.

— Entretanto, regresse ao seu batalhão, Montante Luzente. Pela manhã será entregue sob sentença de novo. E, a menos que pretenda dizer-me mais alguma coisa, está dispensado.

Tratava-se de mais uma oportunidade que Ariakan lhe oferecia.

Nesse momento, Steel ansiou poder libertar-se do peso que o oprimia. Mas sabia que, se o fizesse, o orgulho e afeto que votava ao procedimento do seu suserano esmoreceriam, para se converterem em raiva e amarga desilusão.

— Não, meu senhor. Nada tenho a acrescentar, a não ser para reiterar os meus agradecimentos.

Ariakan encolheu os ombros. Levantando-se, encaminhou-se para a Caixa da Batalha. Os seus oficiais apressaram-se a rodeá-lo e, debruçando-se para a mesma, puseram-se a transferir unidades para aqui e ali, procedendo de novo à discussão das estratégias e das táticas. Um sacerdote das trevas irrompeu pela tenda, a fim de lançar um encantamento de cicatrização sobre a mão ferida do lorde.

Steel, esquecido, saiu discretamente pelos fundos da tenda, a fim de evitar a multidão. Deixando atrás de si a claridade e o bulício, ultrapassou o perímetro exterior do campo, em busca de um lugar onde pudesse estar sozinho.

Na manhã seguinte morreria, com honra, e com ele o tumulto que lhe revolvia a alma, toda a verdade — que, à soleira do laboratório, hesitara, hesitara porque sentira medo. Deste modo, o seu suserano e os camaradas seriam poupados.

3

O plano de batalha de Ariakan.

A batalha pessoal de Steel

Faltavam horas para a aurora, mas o exército de Lorde Ariakan já encontrava-se em movimento, caminhando das planuras para as Colinas de Virkhus, rumo ao Desfiladeiro do Portão Ocidental e ao seu alvo, a Torre do Sumo Sacerdócio.

A estrada encontrava-se desimpedida. Os Cavaleiros da Solamnia não podiam permitir-se desperdiçar efetivos na sua defesa. Os exércitos de Ariakan moviam-se com rapidez, o clarão das tochas e o fogo da magia alumiava-lhes o caminho. Caminhando na vanguarda, Steel virou-se para olhar e sentiu-se extasiado. Das colinas às planícies, era um formigueiro de homens, equipamento e máquinas. Aglomerados na estrada, movendo-se com uma precisão que era produto de treinos intensos, o exército lembrava uma serpente a cintilar nas trevas — uma serpente gigantesca que em breve se enrolaria em torno da vítima, esmagando-a. Os efetivos do exército eram incalculáveis. Nos anais do mundo, não havia registro de alguma vez se ter concentrado em Ansalon uma força tão poderosa.

Por esta altura, os defensores da Torre do Sumo Sacerdócio já seriam capazes de avistar nitidamente o exército. Deviam estar observando a terrível serpente, no seu avanço inexorável. Steel conseguia imaginar o terror e o desânimo que sentiam. Certamente que agora morrera toda a esperança que os Cavaleiros da Solamnia possivelmente ainda acalentavam.

Enquanto afivelava a espada, ocorreram ao espírito de Steel histórias dos feitos heróicos do pai, sozinho nas ameias da torre que o filho estava prestes a atacar. Sturm Montante Luzente também previra a sua morte e fora mais longe, prognosticara a brilhante vitória que o aguardava.