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 B Later I discovered that it was all right to call you flower! (Because of your similar circumstances? Your soft substances? Your gentle hues? Because of the virtuous gardens of images you evoke? Because a verse, like a flower, is modest, so delicately modest with its flowerish modesty that it only opens when forgotten by the gardener’s sleep?) Later I discovered that it was all right to call you flower! (flower, image of two points, like a chord). Later I discovered the flower’s two points, the two mouths of the image of the flower: the mouth that eats the deceased and the mouth that adorns the deceased with another deceased, with flowers — crystals of vomit.
 C How not invoke the vice of poetry — the body that numbs in the air of verses? (In the air of dead waters, injecting into the day’s flesh the night’s infection.) Thirst for life? Thirst for death, attending death as one attends a movie. The day? Arid. So let the night come with sleep. So let the flower come. Let the poem come, easier and more portable in memory, flower in the vest of remembrance. How not invoke, above all, the practice of the poem, its method, its languid horti — culture? There are seasons for the poem as for the flower, as for love between dogs; and a thousand tedious grafts, a thousand ways to arouse black ecstasies; and the tepid waiting for these to rot into a poem, precocious emanation of the deceased soul.
 D Poetry, this is not the sense in which I still write you flower! (I write
flower! Not a flower, nor that flower of virtue — in dissembled urinals.) Flower is the word flower, verse inscribed in verse, like mornings in time. Flower is the leap of a bird into flight, the leap out of slumber when its tissue is broken — an explosion made to work like a machine, a vase of flowers.
 E Poetry, now I write you feces, the living feces you are. I know you are other words, words impossible in poems. That’s why I write feces, a light word, counting on its brevity. I write you spit, plain spit, just as much spit as the third (how use it in a poem?) the third theological virtue.
O cão sem plumas /
The Dog without Feathers 1950
O cão sem plumas
 1 ( Paisagem do Capibaribe ) §A cidade é passada pelo rio como uma rua é passada por um cachorro; uma fruta por uma espada. §O rio ora lembrava a língua mansa de um cão, ora o ventre triste de um cão, ora o outro rio de aquoso pano sujo dos olhos de um cão. §Aquele rio era como um cão sem plumas. Nada sabia da chuva azul, da fonte cor-de-rosa, da água do copo de água, da água de cântaro, dos peixes de água, da brisa na água. §Sabia dos caranguejos de lodo e ferrugem. Sabia da lama como de uma mucosa. Devia saber dos polvos. Sabia seguramente da mulher febril que habita as ostras. §Aquele rio jamais se abre aos peixes, ao brilho, à inquietação de faca que há nos peixes. Jamais se abre em peixes. §Abre-se em flores pobres e negras como negros. Abre-se numa flora suja e mais mendiga como são os mendigos negros. Abre-se em mangues de folhas duras e crespos como um negro. §Liso como o ventre de uma cadela fecunda, o rio cresce sem nunca explodir. Tem, o rio, um parto fluente e invertebrado como o de uma cadela. §E jamais o vi ferver (como ferve o pão que fermenta). Em silêncio, o rio carrega sua fecundidade pobre, grávido de terra negra. §Em silêncio se dá: em capas de terra negra, em botinas ou luvas de terra negra para o pé ou a mão que mergulha. §Como às vezes passa com os cães, parecia o rio estagnar-se. Suas águas fluíam então mais densas e mornas; fluíam com as ondas densas e mornas de uma cobra. §Ele tinha algo, então, da estagnação de um louco. Algo da estagnação do hospital, da penitenciária, dos asilos, da vida suja e abafada (de roupa suja e abafada) por onde se veio arrastando. §Algo da estagnação dos palácios cariados, comidos de mofo e erva-de-passarinho. Algo da estagnação das árvores obesas pingando os mil açúcares das salas de jantar pernambucanas, por onde se veio arrastando. §(É nelas, mas de costas para o rio, que “as grandes famílias espirituais” da cidade chocam os ovos gordos de sua prosa. Na paz redonda das cozinhas, ei-las a revolver viciosamente seus caldeirões de preguiça viscosa.) §Seria a água daquele rio fruta de alguma árvore? Por que parecia aquela uma água madura? Por que sobre ela, sempre, como que iam pousar moscas? §Aquele rio saltou alegre em alguma parte? Foi canção ou fonte em alguma parte? Por que então seus olhos vinham pintados de azul nos mapas?